Recuperação ?
Manoel Justino Bezerra Filho*
“Recuperação de empresas”, não; “recuperação do crédito bancário”, este deveria ser o nome correto do projeto de Lei de Falências aprovado pela Câmara Federal em 15.10.03, pendente de aprovação no Senado.
A pretensão inicial era possibilitar a recuperação das empresas em crise, nos moldes do que ocorre nas legislações mais avançadas do mundo, como EUA., França, Alemanha, Espanha, Portugal, apenas para lembrança dos casos mais emblemáticos. No entanto, modelado pelo World Bank, o projeto do “Banco Central” apresenta-se como garantia de privilégio dos créditos bancários, na recuperação judicial (concordata) e na falência; em tais situações, grande parte do passivo com instituições financeiras será objeto de pedido de restituição ou nem será afetado pela medida judicial, conforme previsto em vários artigos espalhados pelo texto. Enquanto isto, o crédito trabalhista terá o prazo de um ano para pagamento (arts. 10o e 49) e o crédito fiscal apenas será pago após o trabalhista.
Ora, tendo que pagar de imediato o passivo bancário ou devolver os bens garantidores do débito, como se poderá imaginar possível qualquer recuperação? O argumento de que o aumento da garantia do crédito bancário propiciará a baixa dos juros, sobre não verdadeiro é irrelevante, pois o esvaziamento da empresa em crise para pagamento do banco, redundará na absoluta inviabilidade de qualquer recuperação.
A solução, óbvia, seria colocar (no mínimo) o crédito bancário em pé de igualdade com os demais. Digo, no mínimo, pois o também mínimo bom senso determina que a prioridade sempre deve ser do crédito trabalhista, por sua natureza alimentar e, em seguida, do crédito fiscal, crédito de toda a Nação brasileira.
Alternativamente, em benefício da recuperação, imponham-se limites e sacrifícios a todos, bancos também. Ao que parece, a Câmara Federal aprovou o projeto sem saber bem o que estava votando; só resta aguardar agora o estudo sério, no Senado, para fazer com que o projeto volte ao trilho inicialmente previsto e que é o trilho das legislações de todos os países desenvolvidos, sem privilégios inexplicados e inexplicáveis.
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*Professor Universitário e Juiz de Direito em São Paulo.
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Atualizado em: 6/2/2004 10:04