O princípio da segurança jurídica nos reajustes tarifários   Migalhas
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O princípio da segurança jurídica nos reajustes tarifários

Sérgio Guerra*imagem11-11-2021-02-11-08O Superior Tribunal de Justiça julgou, recentemente, os recursos contra a decisão judicial que impediu a aplicação do IGP-DI no reajuste das tarifas telefônicas. Esse índice está previsto nos contratos de concessão e havia sido autorizado pela ANATEL. Fundamentando sua decisão no princípio da segurança jurídica, a Corte suspendeu a liminar que determinava às operadoras a adoção do IPCA, restabelecendo, portanto, o indexador contratual.Tudo começou em 2003, quando o reajuste das tarifas de telefonia foi contestado em diversas ações judiciais por todo o país. Prevaleceu uma liminar do Juiz da 2ª Vara Federal de Brasília sustentando que o IGP-DI “não concretiza a norma que assegura modicidade (modéstia) das tarifas”.Não restam dúvidas que o IGP-DI, influenciado pela alta do dólar no final de 2002, teve maior variação, ficando em torno de 32%, o que representa maior ônus para os consumidores. Já o IPCA, que foi adotado inicialmente pelo Judiciário, ficou bem abaixo, em torno de 17%.Contudo, a decisão judicial que havia determinado a aplicação do IPCA alterou regras do contrato e, mais do que isso, não observou todo o arcabouço regulatório das telecomunicações. Com marcos pré-definidos pelos Poderes Legislativo e Executivo (standards), a regulação desse setor tem sido implementada pela ANATEL por meio de uma interpretação técnica altamente complexa, que deve ponderar interesses, custos, ônus e benefícios para todo o mercado, inclusive para os consumidores.Ao restabelecer o IGP-DI, previsto nos contratos de concessão, o Superior Tribunal de Justiça não só reafirmou a indisponibilidade do princípio da segurança jurídica nos contratos de concessão, mas, sobretudo, contribuiu para se evitar o risco regulatório do sistema de telecomunicações e, em cadeia, dos outros sistemas regulados.Não se pode esquecer que, de acordo com o modelo neoliberal vigente, o Brasil implementou um amplo processo de privatizações, transferindo para a iniciativa privada diversas atividades econômicas e a concessão de serviços públicos. Foi nesse cenário que o Estado criou a ANATEL, ANEEL e demais Agências Reguladoras.Desde meados da década de 90, até 2002, o Brasil desenvolveu um consistente esforço político e institucional para implantar o modelo constitucional de “Estado Regulador”, com participação estatal indireta. Por isso, entidades autárquicas foram criadas com relativo grau de independência e autonomia.Nesse contexto jurídico-constitucional, a Administração Pública direta, diante da premente necessidade de atrair investimentos, sobretudo estrangeiros, abriu mão da função de regular diretamente os novos mercados, conferindo-a às Agências Reguladoras.O objetivo foi – e deve continuar sendo – o de gerar salvaguardas institucionais que significassem um compromisso com a manutenção de regras e contratos de longo prazo. A bem da verdade, a decisão política de ceder controle e capacidade decisória às Agências Reguladoras conduz à confiabilidade e equilíbrio de mercado.É fato que este processo vem gerando mudanças significativas, não só na forma de intervenção econômica do Estado, como também em sua relação com a sociedade e na organização do governo. Mudanças que trazem em seu bojo expressivas transferências de “poder” para novos atores.É sempre bom recordar que, no passado próximo, as empresas estatais, notadamente as prestadoras de serviços públicos, foram utilizadas como meio político para se atingir metas sociais e econômicas, sem o compromisso com o indissociável equilíbrio das contas públicas.Somente com a criação de Agências Reguladoras, com relativo grau de independência e autonomia, além de corpo técnico com comprovada capacidade e experiência no setor regulado, se pode alcançar um ambiente de segurança e, principalmente, atratividade dos investidores nacionais e estrangeiros.Com isso, o Poder Executivo e, por que não dizer, até mesmo o Poder Judiciário, devem compreender essa nova realidade, em que se deslocou o controle e capacidade decisória do poder estatal central para um quadro técnico da administração pública indireta.Em troca, se busca credibilidade e estabilidade perante um mundo globalizado, demonstrando, não só ao empresariado brasileiro, mas à comunidade internacional, que o modelo de intervenção regulatória adotado pelo Brasil é seguro, não sendo um tema de um determinado governo de direita, centro ou esquerda, mas, sobretudo, um modelo de Estado.___________* Advogado do escritório Siqueira Castro Advogados

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Atualizado em: 26/7/2004 10:33

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