Denúncia anônima
Sérgio Roxo da Fonseca*
A Constituição da República proíbe que sejam iniciados processos investigatórios ou punidos calcados em denúncia anônima. O seu art. 5º, IV, trata da matéria dizendo que muito embora seja livre a manifestação do pensamento, é vedado o anonimato.
Contudo, muitos são os processos iniciados com base em notícias levadas às autoridades por pessoas não identificadas. Trata-se de prática surgida durante a última ditadura que ainda mantém o seu ranço nas nossas relações jurídicas em que pese a proibição constitucional. Trata-se de hábito flagrantemente antidemocrático.
A questão ganha relevância nos dias atuais quando uma notícia anônima ganha foros de verdade provada ainda quando sentença judicial, no futuro, venha testificar a sua falsidade.
No passado, a honra, a liberdade e a dignidade de um grande número de pessoas foram atingidas por denúncias anônimas, sendo, quase sempre, impossível identificar a fonte.
Recentemente o Superior Tribunal de Justiça, invocando julgado anterior do Supremo Tribunal Federal, julgando recurso interposto pelo Ministério Público reconheceu que o anonimato é prática avessa ao grau de civilização em que se encontra o povo brasileiro. A ementa do julgado tem a seguinte redação:
“O Ministério Público Federal interpôs agravo regimental insurgindo-se contra a determinação de arquivamento da notícia-crime por ele oferecida, insistindo na necessidade de instauração de inquérito policial para apuração de supostas infrações penais imputadas a várias pessoas, entre elas um desembargador, fundada em denúncia anônima. A Corte Especial, prosseguindo o julgamento, negou provimento ao agravo regimental porque, no caso, tratou-se de denúncia anônima. Nos termos da CF/1988, é vedado o anonimato (art. 5º, IV). Vencido, apenas quanto à fundamentação, o Ministro Relator. Precedente citado do STF: Pet. 2.805-DF, DJ 27.2.2004. Agravo regimental na NC 317-PE, rel. Min. Peçanha Martins, julgado em 16.6.2004”.
O Superior Tribunal de Justiça manifestou-se contrário ao abuso, exigindo a aplicação incisiva da norma constitucional, o que fez ecoando as exigências da melhor doutrina.
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* Advogado, professor da UNESP e Procurador de Justiça de São Paulo, aposentado
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Atualizado em: 21/7/2004 11:42
Sérgio Roxo da Fonseca
Advogado, professor da UNESP e Procurador de Justiça de São Paulo, aposentado