O empréstimo de conta corrente e a responsabilização civil   Migalhas
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O empréstimo de conta corrente e a responsabilização civil – Migalhas

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De acordo com a FOLHA, com a implementação do sistema PIX, houve aumento exponencial das fraudes bancárias, além de sequestros-relâmpagos, que tiveram um crescimento de 40% em 2021. Em números concretos, houve 42 casos no ano de 2021.

Tal crescimento decorre da utilização do sistema PIX por criminosos, que utilizam-se de contas laranjas para pulverizar o dinheiro das vítimas rapidamente, dificultando eventual bloqueio e repatriação de recursos por parte da Instituição Financeira.

As contas laranjas são contas bancárias abertas por criminosos em nome de outras pessoas, ou, por vezes, o próprio titular da conta corrente realiza o empréstimo de sua conta corrente para que seja possível receber os valores oriundos de atos ilícitos, permitindo que o valor seja repassado para outras contas ou sacado nos caixas eletrônicos, o que de fato, dificulta a rastreabilidade do dinheiro e sua respectiva recuperação.

Os titulares realizam o empréstimo de suas contas em troca do recebimento de uma “comissão”, o que por vezes, gira em torno de 10% do valor transacionado¹. Desta forma, criou-se um mercado ilegal de aluguel de contas bancárias, que impulsionam uma série de crimes.

Muitos titulares que emprestam suas respectivas contas, alegam à autoridade policial que precisavam do dinheiro e que não sabiam que a conta seria utilizada pela fins ilícitos.

O que não sabem é que o empréstimo de sua conta pode acarretar sua responsabilidade civil e criminal.

Neste artigo, versaremos tão somente sobre a responsabilidade civil dos titulares “laranjas”.

Pois bem.

O titular “laranja” que realizada a cessão de sua conta para que criminosos transacionem valores oriundos de atos ilícitos, também é responsável pela reparação civil, mesmo que tenha o feito sem receber nada em contrapartida.

É o que preconiza o Art. 932, V do Código Civil:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

V – os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

Se os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, quem dirá o laranja que recebe sua “comissão” para transacionar tais valores.

Sua responsabilidade é uma combinação decorrente dos Artigos 884, 186, 927 e 933, todos do Código Civil.

Em suma, os artigos supramencionados tipificam os atos ilícitos, o dever de reparação e a vedação do enriquecimento sem causa.

O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em recentíssimos julgados ressaltou a responsabilização do recebedor dos valores ilícitos em sua conta corrente, senão vejamos:

INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – Fraude sofrida pelo autor ao efetuar depósito em conta corrente a mando de terceiro para intermediação da venda de títulos de hotéis – Pagamento realizado para adiantamento das despesas do cartório e dos honorários de corretagem – Fraude – Depósito realizado na conta da ré, que não tinha ciência de sua origem – Ônus da prova a cargo da ré (art.333, II, CPC), que deveria demonstrar a causa do negócio jurídico que justificou o benefício dos valores depositados – Tese exposta na contestação que não convence – Enriquecimento sem causa inequívoco – Devolução dos valores devida, a teor do que prevê o art.932, V c.c. art.933 do CC – Danos morais não configurados – Sentença reformada – Recurso provido em parte.

(TJSP;  Apelação Cível 0000130-78.2009.8.26.0582; Relator (a): Fábio Podestá; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Miguel Arcanjo – Vara Única; Data do Julgamento: 22/01/2014; Data de Registro: 30/01/2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL – Pretensão da autora em ver os demandados condenados na restituição de valores indevidamente subtraídos de sua conta corrente – Fraude na emissão de cheques praticada pela corré Mônica, filha do apelante – Sentença que julgou parcialmente procedente o pedido – Insurgência do recorrente sustentando que não praticara qualquer ato ilícito – Corré que confessou ter emitidos os cheques – Laudo pericial contábil hígido e não atacado especificamente, que concluiu ter havido subtração de R$ 67.484,82, sem demonstração da devolução de quaisquer valores à autora – Obrigação que se estende ao apelante, haja vista sua participação no produto do crime (art. 932, V, do CC) – Responsabilidade solidária do recorrente limitada ao valor de R$ 12.142,61, referente aos quatro cheques depositados em sua conta bancária – Recurso parcialmente provido para esse fim. 

(TJSP;  Apelação Cível 0006390-83.2013.8.26.0566; Relator (a): Mendes Pereira; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Carlos – 5ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 10/08/2017; Data de Registro: 10/08/2017)

Desta forma, conclui-se que mesmo que não haja culpa por parte do “recebedor” dos valores, o mesmo pode ser responsabilizado até a concorrente quantia que recebeu, ou, por vezes, recebeu e repassou para outrem.

Por isso, nunca realizem o empréstimo de sua conta corrente para recebimento de valores de origem desconhecida ou até mesmo em troca de comissões sobre os valores transacionados.

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https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2021/09/pessoas-alugam-suas-contas-para-criminosos-que-recebem-nelas-pix-por-sequestros.shtml

Leonardo Pelati

Leonardo Pelati

Advogado com longa experiência em contencioso estratégico, Especialista em Contencioso de Meios de Pagamentos, Pós-graduado em Processo Civil – EPD, MBA em Gestão de Riscos e Compliance FIA-USP.

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