Vesting, stock options ou SCP? O que é melhor para empresas e startups   Migalhas
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Vesting, stock options ou SCP? O que é melhor para empresas e startups – Migalhas

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Frequentemente vejo questionamentos sobre qual é a melhor forma de se receber novos sócios nos mais diferentes negócios. 

A realidade é que não há uma resposta única que se adeque a todos os casos, devendo a análise ser realizada com base em algumas premissas.

Primeiro, é preciso definir: é um Projeto, uma Empresa Consolidada, ou uma Startup?

Essa primeira análise é essencial para direcionar a análise, pois, ao menos em teoria, cada tipo de contrato societário é mais indicado para cada um desses modelos de negócio.

A) Projeto – Sociedade em Conta de Participação

Para Projeto, em geral, o mais indicado é a Sociedade em Conta de Participação (“SCP”).

Explicando de um modo um pouco mais simples, a SCP é uma sociedade entre 2 ou mais entes, pessoas ou empresas, que visa a realização de um investimento em um determinado Projeto específico, empreitada ou empresa que tenha um início, meio e fim, ou seja, prazo determinado e/ou que seja possível se definir, de forma clara, onde ele se inicia e onde ele termina.

Diferente das outras sociedades que geralmente são por prazo indeterminado, a SCP é um veículo de investimento com o objetivo de financiar um projeto que, ao ser finalizado com sucesso, reverte o lucro para os seus componentes.

Porém, ao contrário do que muitos pensam, ela pode sim reverter prejuízos para seus componentes, caso ocorra resultado negativo, o que deve ser considerado.

Em linhas gerais, é uma sociedade entre um sócio capitalista, que investe, mas não trabalha, e um sócio de trabalho, que por sua vez trabalha, mas não investe.

O sócio capitalista é formalmente chamado de Sócio Participante (antigamente chamado de “Sócio Oculto”) e faz um investimento em dinheiro ou em ativos, mas não participa do trabalho, execução de serviços ou realização do Projeto em si. Em uma linguagem simplificada, seria o sócio que realiza o investimento e que visa ao final do Projeto receber o lucro decorrente da diferença entre aquilo que investiu e aquilo que receberá de volta.

Era chamado antigamente de Sócio Oculto pois, de fato, não aparecia perante terceiros. Contudo, com as novas regras societárias e fiscais vigentes atualmente, todos os sócios de uma determinada sociedade são passíveis de conhecimento público, de modo que não há mais sócios ocultos dentro da previsão legal em vigor no Brasil.

O sócio que realiza o trabalho ou executa os serviços, por seu turno, é formalmente chamado de Sócio Ostensivo, é o responsável por implementar e realizar todo o Projeto, ou em outras palavras, executa os trabalhos, presta os serviços, ou empreende.

Cabe ao Sócio Ostensivo a tomada de decisões, execução dos serviços ou trabalhos e assumir todos os compromissos perante terceiros.

As SCPs podem ser utilizadas nos mais diversos setores. Um dos melhores exemplos é no setor de Construção Civil, onde um Sócio Ostensivo (geralmente a Construtora ou Incorporadora) empreende e realiza os serviços, mas para isso capta dinheiro dos Sócios Participantes (os Investidores) que pretendem apenas receber lucros ao final com a venda ou locação dos imóveis. Esses investidores, Sócios Participantes, não participam em nenhuma medida das construções.

Outro exemplo ocorre em obras cinematográficas ou jogos eletrônicos, onde um estúdio ou diretor quer realizar um filme ou produzir um jogo e precisa captar dinheiro, mas não tem possibilidades de conseguir com instituições financeiras tradicionais por se tratar de ativo intangível e não ter garantias sólidas para conseguir um empréstimo. Geralmente pessoas que acreditam naquele filme ou jogo realizam os investimentos por meio de SCP, na condição de Sócias Participantes. Essas pessoas, por sua vez, não terão nenhuma participação na execução do jogo ou filme, apenas receberão os lucros, se houver.

B) Empresa Consolidada – Stock Options (Opções de Aquisição de Ações ou Quotas)

Já para negócios em fase mais consolidada, tais como empresas de grande porte, multinacionais ou bancos, há uma tendência maior a que o instrumento mais indicado seja o de Stock Options, especialmente para seus principais executivos, diretores e/ou conselheiros.

As Stock Options dão o direito, – mas não a obrigação – de comprar uma ação em um preço e data previamente acordados. Focando o presente artigo em admissão de novos sócios ou acionistas, sem entrar no mérito das grandes operações societárias ou em bolsas de valores, as Stock Options para executivos, diretores ou conselheiros em geral são obtidas por meio do atingimento de metas e objetivos pré-definidos, e muitas vezes, as condições para a aquisição das ações são muito vantajosas ou até mesmo simbólicas, ou seja, quase sem custos.

As Stock Options são consideradas um tipo de benefício ou mesmo remuneração concedida pelas empresas a alguns funcionários, diretores, conselheiros ou executivos. Elas diferem das opções de ações listadas ou ações negociadas no mercado, pois as Stock Options tratadas neste artigo são restritas para seus próprios colaboradores.

Elas são, desse modo, uma forma de compensação alternativa, fornecida por algumas empresas, como parte do pacote de benefícios aos funcionários e gestores.

Vale frisar que demonstram grande confiança da Empresa, haja vista que ela oferece parte de seu próprio capital aos destinatários, que passam a ser proprietários de parte da empresa em si, deixando de ser meros colaboradores para serem sócios de fato e de direito, ainda que, geralmente, em pequena medida.

No fim das contas, aqueles que recebem e exercem as Stock Options passam a ser sócios ou acionistas da empresa, adicionando uma nova forma de remuneração ao seu portfólio com o recebimento de dividendos iguais aos pagos aos sócios ou acionistas da empresa – inclusive, por serem, de fato, sócios ou acionistas tanto quanto os demais – ou acumulando participações para venda futura, com ganhos de capital quando realizarem a venda das quotas ou ações.

C) Vesting – Startups

As Startups são as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, normalmente caracterizadas pela inovação aplicada a modelos de negócios ou a produtos e serviços.

Em geral, são empresas que trazem consigo modelos inovadores e tecnológicos, com alta capacidade de expansão e com crescimento em elevadas taxas.

O contrato de Vesting, por sua vez, é uma modalidade recente de contrato empresarial que funciona como uma ferramenta para alinhar os interesses das empresas aos interesses de seus colaboradores chaves, que possuem cargos executivos, proporcionando a eles compensações diretamente relacionadas ao atingimento de metas e objetivos.

Assim, os colaboradores, caso cumpram as metas ou os prazos estabelecidos, são capazes de adquirir uma participação societária progressiva sobre a Startup, adquirindo ações ou quotas, se tornando sócios, aos poucos.

Nesse sentido, para adquirir essa parcela na sociedade da companhia, há um prazo que geralmente varia entre 2 e 5 anos para que se complete o chamado “Direito Adquirido”.

O colaborador só terá o direito à participação combinada, caso tenha ultrapassado esse período e, dentro dele, tenha atingidos as metas, denominado “Período de Vesting”.

Nesse contrato, normalmente temos a “Cláusula Cliff” que estabelece um tempo mínimo de colaboração, que é tido como um período de teste para que o colaborador se qualifique ao Vesting em si. Normalmente, se aplica para novos colaboradores, que ainda não são conhecidos ou testados pela Startup.

Em outras palavras, se o colaborador não se qualificar durante o período da Cláusula Cliff, ele normalmente não chegará ao Período de Vesting em si, permanecendo como um colaborador “normal” ou mesmo sendo desligado.

A ideia central do Vesting é evitar conflitos de interesses entre os sócios da Startup e seus principais colaboradores, buscando alinhamento dos objetivos em prol de ambos os lados e nos melhores interesses da Startup.

No Vesting, normalmente a aquisição da participação ocorre de modo automático, ao passo que nas Stock Options não há obrigatoriedade na aquisição das ações. Lembrando que as Stock Options, em alguns casos, podem ser vendidas a terceiros, ou seja, caso o colaborador apenas queira o valor resultante das ações, ele não precisa adquiri-las para depois vender, podendo vender as opções diretamente.

Outro ponto que chama atenção é que no Vesting a participação ocorre a partir dos resultados desempenhados pelos colaboradores, ou seja, normalmente há uma contrapartida pré-definida em termos financeiros ou de participação.

Já nas Stock Options, há o recebimento de dividendos, semelhante aos pagos aos sócios ou acionistas da empresa, e que dependem diretamente dos resultados da empresa, que eventualmente podem não estar ligados apenas aos contratantes da operação. Em outras palavras, nas Stock Options, se a empresa estiver tendo prejuízos, pode não haver distribuição nenhuma de dividendos, ainda que o colaborador em si tenha atingido todas as suas metas individuais.

Para o colaborador, o Vesting dá a possibilidade de aumentar seus ganhos de acordo com sua contribuição para o resultado da empresa, de forma mais direta e objetiva, do que as Stock Options, e de modo bem diferente da SCP, que é, em realidade, um veículo de investimento.

O contrato de Vesting costuma atrair talentos, e também funcionários envolvidos com as metas, pois somente assim ele realmente irá ocorrer, estimulando o sentimento de pertencimento e de participação do colaborador.

Para a Startup, ele cria previsibilidade, pois a participação progride à medida que os resultados aparecem, de modo que a Startup não se comprometa com contrapartidas maiores do que as suas reais possibilidades.

O Vesting costuma ter, ainda, a existência de Cláusula de Aceleração, que possibilita ao colaborador receber toda sua participação societária antes do encerramento do Período de Vesting e ocorre diante de algumas situações especiais de liquidez, como, em geral, aportes realizados por investidores, ou que a Startup tenha tido resultados expressivos antes do esperado.

Também é importante pontuar algumas cláusulas de governança após o relacionamento das partes, especialmente as chamadas “Good Leaver” e “Bad Leaver”.

Basicamente quando o colaborador, ao pretender sair, age corretamente com a Startup e os demais sócios ou acionistas, ele é considerado o “Good Leaver” e pode deixar o negócio e vender suas participações “a mercado”, ou seja, diante da melhor oferta que encontrar, evidentemente desde que o adquirente seja aceitável para a Startup como novo sócio.

Já o “Bad Leaver” é aquele que não cumpriu adequadamente as regras estipuladas ou saiu antes do tempo, ou mesmo de forma abrupta e sem honrar compromissos, de modo que é penalizado, tendo de vender suas participações pelo valor contábil ou com fortes deságios, geralmente perdendo valor e não considerando o potencial de crescimento da Startup.

Em casos extremos, o “Bad Leaver” pode até mesmo ser compelido a sair da Startup com valores irrisórios ou mesmo simbólicos, caso se comprove que suas atitudes geraram danos graves ou riscos à Startup, tais como perdas de negócios, de clientes ou atos que sejam contrários aos princípios que norteiam aquele negócio específico.

Nos casos mais graves, o Bad Leaver pode chegar a ter de indenizar a Startup, caso haja com dolo, fraude ou erro grosseiro, mas isso seria tema suficiente para outro artigo.

Vale dizer que o Vesting deve sempre conter disposições sobre proteção à propriedade intelectual, não-concorrência, confidencialidade e proteção a dados pessoais e empresariais, haja vista que via de regra as Startups possuem informações sensíveis e seus diferenciais de negócio, softwares e know-how são extremamente sensíveis e sua preservação é vital para a própria sobrevivência do negócio, de modo que o colaborador em Período de Vesting tem que se comprometer a respeitar tais patrimônios da Startup e sobretudo a não praticar concorrência desleal contra ela se e quando ocorrer o final da relação entre as partes.

CONCLUSÃO

Em nossa experiência, temos visto que não há uma fórmula única que sirva para todos os negócios e profissionais.

Em todas as situações é possível realizar correções, redução ou mitigação de riscos, mas é recomendável que seja feito o quanto antes, com a devida prioridade, especialmente quando ainda há possibilidade de elaboração dos contratos detalhados para cada negócio e realidade.

Lucas Hernandez do Vale Martins

Lucas Hernandez do Vale Martins

Advogado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós Graduado pela FGV Law em Processo Civil. Especialista em Contract Law pela Harvard Law School. Relator do Tribunal de Ética da OAB/SP.

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