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No julgamento do recurso especial 1.885.119/RJ, a 3ª turma do STJ reconheceu que a flutuação no preço das cotas de fundo de investimento, ocorrida entre a data da penhora e a expropriação final, não aproveita, nem prejudica o exequente.
A discussão tem origem no Agravo de Instrumento interposto pela Fundação dos Economiários Federais (FUNCEF) com o objetivo de reverter a decisão proferida no cumprimento de sentença, a qual determinou, em 21/5/15, o levantamento da quantia existente na conta judicial, desde 29/5/09, em benefício do exequente, desconsiderando a valorização das cotas em termos monetários.
No referido cumprimento de sentença, foi reconhecido o excesso da execução em 25,48%, restando em benefício da exequente o percentual 74,52% sobre o valor da execução.
Ocorre, todavia, que pela inteligência do artigo 835 do Código de Processo Civil, o qual admite a mitigação da ordem preferencial de penhora, a depender do aceite do executado ou a aplicação da menor onerosidade ao devedor, foram penhoradas cotas de fundo de investimentos.
As cotas do fundo de investimentos são, em síntese, valores mobiliários que compõem uma fração ideal do fundo, os quais flutuam diariamente no mercado da bolsa de valores.
Assim, a penhora formalizada sobre as cotas do fundo de investimentos, que em 29/5/09 garantiu a execução no valor de R$ 282.381,96 (duzentos e oitenta e dois mil, trezentos e oitenta e um reais e noventa e seis centavos), sofreu variação monetária no mercado, de modo em que no ano de 2015, a flutuação no preço das cotas não poderia prejudicar o credor, tampouco o devedor.
Esse foi o racional utilizado pelo ministro Marco Aurélio Bellizze, quando, por unanimidade, a 3ª turma do Superior Tribunal deu provimento ao recurso especial do executado para reformar o acórdão proferido TJ/RJ, reconhecendo-se que a mera penhora das cotas de fundo de investimento não transfere ao exequente, os direitos de propriedade.
Nos termos do voto do ministro relator, a 3ª Turma do STJ entendeu que, incidente a penhora sobre cotas de fundo de investimentos, a propriedade desses bens se mantém com o devedor investidor até o resgate ou expropriação final.
Com isso, a STJ reconhece que a mera penhora de cotas de fundo de investimento não transfere os direitos e obrigações decorrentes do risco natural desse tipo de negócio jurídico ao exequente, não se podendo obrigar-se pelos ônus nem se beneficiar dos bônus, notadamente diante do princípio da relatividade dos efeitos do contrato.
O entendimento de que a penhora não transfere a qualidade de proprietário ao exequente, está em harmonia com outro posicionamento da Corte Superior.
A penhora de ações, cotas de fundo ou cotas de sociedade limitada não é surpresa no ordenamento jurídico brasileiro, sendo uma prática bastante aceitável nas execuções, em vistas de garantir a menor onerosidade ao executado.
Em posições reiteradas do STJ, ficou assente na jurisprudência da Corte ser “cabível a penhora de cotas de sociedade empresária limitada, não importando essa constrição ofensa ao princípio da affectio societatis. Precedentes. Leia-se:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENHORA. QUOTAS SOCIAIS. POSSIBILIDADE. PROVA. VALORAÇÃO. PRETENSÃO. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ. NÃO PROVIMENTO.
(AgInt no AREsp 1058599/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI,
QUARTA TURMA, julgado em 14/11/17, DJe 24/11/17)
Por mais que nos casos das cotas de fundo de investimento não seja necessária a affectio societatis, a conclusão é a mesma: não há transferência de titularidade havendo apenas a penhora.
Há tempos, portanto, a jurisprudência tem admitido a penhora de cotas sociais, afastando-se a transferência da titularidade no momento da penhora.
Tanto o é que, o STJ determinou, por meio do Tema repetitivo 913 que a “cota de fundo de investimento não se subsume à ordem de preferência legal disposta no inciso I do art. 655 do CPC/73 (ou no inciso I do art. 835 do NCPC)”, ou seja, além das cotas serem passíveis de penhora, elas não estão atreladas, necessariamente a ordem prevista na lei.
No caso em destaque, portanto, não poderia ser diferente o entendimento firmado pela 3ª turma do STJ. Havendo valorização das cotas de fundo de investimento, o valor deve ser reconhecido como excesso à execução, devendo ser levantado pelo executado, notadamente em virtude da ausência de transferência da titularidade, e assunção do risco do negócio pela parte proprietária das cotas.
Não é demais recordar, também, que a penhora se trata apenas de modalidade de garantia do crédito exequendo, não se cogitando que sua valoração ou desvalorização faça aumentar ou reduzir a execução.
Inclusive, o Ministro Relator reconheceu expressamente que fosse as cotas desvalorizadas no mercado mobiliário, o executado seria chamado para complementar a penhora e assegurar o crédito exequendo. O mesmo racional se aplica às cotas valorizadas, devendo a valorização que exceder à execução ser restituída ao seu legítimo proprietário, o executado.
Portanto, reafirmando sua jurisprudência, a 3ª turma do STJ reconheceu que a penhora sobre cotas de fundo de investimento não transfere os direitos de propriedade das cotas ao exequente.
Luis Guilherme Joia
Bacharel em Direito pela FMU, Assistente Jurídico no Contencioso Tributário de impostos indiretos.
Israel da Silva Couto
Bacharel em Direito pela FMU, Assistente Jurídico no Contencioso Tributário de impostos indiretos.