Efeito interruptivo nos embargos de declaração e algumas variáveis   Migalhas
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Efeito interruptivo nos embargos de declaração e algumas variáveis – Migalhas

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Um dos problemas mais enfrentados pelos tribunais nacionais em matéria de recurso, especialmente pelo STF, está ligado às variáveis envolvendo a oposição de embargos de declaração e a interrupção do prazo para manejo de outros recursos, nos termos do art. 1026, do CPC.

Em que pese o disposto no art. 1.026, do CPC (“os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso”), a Corte da Cidadania vem enfrentando algumas situações importantíssimas na prática forense, com limitações à essa interrupção de prazo, senão vejamos:

De passagem, é importante destacar que existem variáveis ligadas à não ocorrência de efeito interruptivo nos casos de incabimento e de intempestividade dos aclaratórios. Recentemente decidiu a 3ª Turma do STF (AgInt no AREsp 2.161.927 -Rel. Min. Nancy Andrighi – J. em 22/05/2023 – DJe 24/05/2023), que:

“Os embargos de declaração somente não interrompem o prazo para outros recursos quando intempestivos, manifestamente incabíveis ou nos casos em que oferecidos, com pedido de aplicação de efeitos infringentes, sem a indicação, na peça de interposição, de vício próprio de embargabilidade (omissão, contradição, obscuridade ou erro material)”.

Superada a questão ligada à admissão dos EDs, vale interpretar a disposto no próprio art. 1.026, do CPC, tentando responder às seguintes indagações: a interrupção do prazo refere-se apenas a outro recurso ou a qualquer medida judicial a ser apresentada no caso concreto? Sendo admitidos os embargos declaratórios, está interrompido o prazo para adoção de outra medida distinta de recurso, como por exemplo, a apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença ou de contestação?

O STF tem precedente consignando que o rol dos recursos, previsto no art. 994, do CPC, é taxativo (AgInt no AgRg no AREsp 826164 / SP – 2ª turma – rel. min. Mauro Campbell Marques – 2ª T – J. em 24/5/16 – DJe 31/5/16).

Em julgado de junho de 2023, a 4ª turma da Corte, ao dar provimento à REsp, novamente deixou claro que o rol do art. 994, do CPC é taxativo, pelo que a interrupção do prazo decorrente da oposição de embargos de declaração refere-se apenas a outro recurso, não alcançando outras medidas judiciais como, no caso concreto, a impugnação ao cumprimento de sentença. Esta é a Ementa do Acórdão em comento:

“RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTEMPESTIVIDADE. OPOSIÇÃO DE embargos de declaração. EFEITO INTERRUPTIVO. DEFESA DO DEVEDOR. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Os embargos de declaração interrompem o prazo apenas para a interposição de recurso, não sendo possível conferir interpretação extensiva ao art. 1.026 do CPC/2015 a fim de estender o significado de recurso às defesas ajuizadas pelo executado. 2. Recurso especial a que se dá provimento para julgar intempestiva a impugnação ao cumprimento de sentença” (REsp 1822287 / PR – 4ª Turma – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. em 06/06/2023 – DJe 03/07/2023).

Quanto ao ponto, deve o intérprete ter muita cautela em relação a eventual não ocorrência de efeito interruptivo em relação a outras medidas judiciais alheias ao conceito de recurso.

Um exemplo comum na prática forense, além da hipótese de impugnação ao cumprimento de sentença: tutela provisória concedida inaudita altera parte, com recebimento, pelo réu, de mandado de citação e intimação, sem a designação da audiência do art. 334, do CPC.

Neste caso, a eventual oposição de embargos de declaração em relação ao capítulo decisório que apreciou a tutela provisória pode interromper o prazo para o eventual agravo de instrumento (arts. 1.015, II, c.c art. 1.026, do CPC), o que não se estende em relação à fluência do prazo para a apresentação de contestação (art. 335, III, do CPC).

Além desta situação especificamente ligada a interpretação do art. 1.206, do CPC, existem diversas outras enfrentadas especialmente na jurisprudência do STF.

De fato, outro caso comum na prática e que merece destaque, se refere ao recurso cabível em face da decisão da presidência ou vice-presidência do tribunal local no exercício do juízo de admissibilidade de REsp e/ou RE (art. 1.030, do CPC).

Quanto ao tema, duas perguntas devem ser formuladas: qual o recurso cabível para impugnar o pronunciamento que obsta a subida do RE ou o RESp? A decisão de negativa de seguimento ou de inadmissão podem ser objeto de EDs? O CPC procurou resolver estes questionamentos, com o regramento contido no art. 1.030, §§1º e 2º, a saber: Agravo em Recurso Especial (AREsp) ou Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) é cabível apenas quando a decisão de inadmissibilidade for fundada no inciso V, deste mesmo artigo, ficando as demais hipóteses sujeitas à impugnação no próprio tribunal local, por meio do Agravo Interno (AgInt – art. 1.021 c.c art. 1.030, §2º). Logo, negar seguimento e inadmitir são situações absolutamente diferentes, inclusive para fins recursais.

Contudo, é fato que em alguns casos de negativa de seguimento ou inadmissão, o pronunciamento judicial é obscuro, omisso ou contraditório, inclusive no que respeita ao enquadramento legal. Assim, seria cabível a oposição de EDs para a correta integralização deste pronunciamento judicial, com posterior interposição de AgInt ou AREsp/ARE? Particularmente entendo que sim, tendo em vista que o art. 1022, do CPC consagra a possibilidade de manejo dos aclaratórios contra qualquer decisão.

Contudo, a Corte Superior possui precedentes no sentido de que os EDs são incabíveis contra as decisões de inadmissibilidade e que, se acaso opostos, não interrompem o prazo para o recurso correto. Segue passagem de ementa de acórdão da 6ª turma:

“A jurisprudência desta Corte e do STF firmou-se no sentido de que o agravo é o único recurso cabível contra decisão que nega seguimento a recursos excepcionais, gênero que inclui os recursos especial e extraordinário. Nestes termos, os embargos de declaração opostos contra despacho de admissibilidade do tribunal de origem não interrompem o prazo para a interposição do agravo, uma vez que manifestamente incabíveis” (STJ – AgRg no AREsp 461030 / RS – Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura – 6ª T – J. em 22/4/14 – DJe 2/5/14).

Aliás, a depender do resultado do pronunciamento judicial previsto no art. 1.030, do CPC, será cabível apenas um dos Agravos (AREsp ou AgInt), a depender da fundamentação e da consequência (art. 1.030, §§1º e 2º, do CPC) inexistindo fungibilidade, pelo que o manejo do recurso equivocado, bem como de embargos declaratórios, não possui efeito interruptivo, ocasionando a preclusão e o trânsito em julgado da decisão local. Quanto ao tema, ver, dentre outros : AgInt no AREsp 1916962 / MA (Rel. Min. Francisco Falcão – 2ª turma – J. em 21/03/2022 – DJe 24/3/22); AgInt nos EDcl no AREsp 1657016 / SP (Rel. Min. Marco Buzzi – 4ª Turma – J. em 31/8/20 – DJe 4/9/20); AgInt no AREsp 1539749 / ES (Rel. Min. Nancy Andrighi – 3ª Turma – J. em 10/2/20 – DJe 12/2/20).

Um alento a esta interpretação, abrindo espaço para o diálogo quanto ao cabimento dos EDs, ocorre quando a decisão é tão genérica que impossibilita ao recorrente analisar os motivos pelos quais seu recurso de fundo teve o processamento negado, o que inviabiliza até mesmo o manejo do Agint ou o AREsp (AREsp 2039129 / SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – Corte Especial – J. em 21/6/23 – DJe 27/6/23; AgInt nos EDcl no AREsp 1950180/MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª turma, J. em 13/12/21, DJe 15/12/21 e AgInt nos EDcl no AREsp 1799956/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª turma, J. em 20/9/21, DJe 15/10/21).

Neste ponto, estamos diante de uma interpretação subjetiva (impossibilidade de análise das razões de decidir e que inviabiliza o manejo do AgInt ou AREsp) e excepcional, sendo mantida a regra, portanto, quanto ao incabimento dos EDs neste caso e a não incidência do efeito interruptivo previsto no art. 1.026, do CPC.

Uma situação bem específica foi tratada recentemente no EAREsp 2039129/SP (Corte Especial do STJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – J. 21/06/2023 – DJe 27/06/2023), onde o interessado opôs EDs contra a decisão de inadmissão do REsp e, ainda dentro do prazo, interpôs Agravo em REsp. Esta foi a conclusão da Corte Especial, ao afastar a tese de preclusão consumativa – passagens da Ementa do Acórdão:

“2. O propósito recursal é dirimir suposta divergência com relação à ocorrência de preclusão consumativa nas hipóteses em que são opostos embargos de declaração contra a decisão do Tribunal de origem que inadmite o recurso especial, e, em seguida, é interposto, tempestivamente, o agravo previsto no art. 1.042 do CPC/2015.

3. A Corte Especial já decidiu que “os embargos de declaração, quando opostos contra decisão de inadmissibilidade do recurso especial na origem, não interrompem, em regra, o prazo para a interposição do agravo, único recurso cabível, salvo quando essa decisão for tão genérica que impossibilite ao recorrente aferir os motivos pelos quais teve seu recurso obstado, inviabilizando-o totalmente de interpor o agravo” (AgInt nos EAREsp 166.402/PE, Corte Especial, julgado em 19/12/2016, DJe 07/02/2017).

4. Hipótese em que, seguidamente à oposição dos embargos de declaração, a recorrente interpôs o agravo em recurso especial ainda dentro do prazo legal, razão pela qual deve ser reformado o acórdão embargado para afastar a preclusão consumativa e, por conseguinte, determinar o retorno dos autos à Segunda Turma, a fim de prosseguir no julgamento do recurso”.

Outro caso interessante enfrentado neste ano de 2023, em que a Corte Especial do STJ concluiu que não está presente o efeito interruptivo previsto no art. 1.026, do CPC, envolveu a oposição de EDs em face do pronunciamento que determinou o recolhimento das custas recursais em dobro (art. 1007, §4º, do CPC). De acordo com o colegiado, “não é cabível a oposição de declaração contra o despacho que determina a intimação da parte para regularizar o preparo do recurso especial ou dos embargos de divergência, uma vez que o despacho que determina a diligência não possui natureza decisória”. AgInt nos EAREsp 1415088 – Rel. Min. Laurita Vaz – CE/STJ – J. 07/03/2023 – DJe 15/03/2023.

Ainda seguindo na apresentação de algumas variáveis ligadas ao efeito interruptivo dos EDs, outro hipótese relevante na prática forense diz respeito à análise do seguinte binômio: sucessivos EDs X preclusão do conteúdo decidido no primeiro pronunciamento judicial. Vejamos uma hipótese: o interessado opôs EDs e, após o pronunciamento que o apreciou, entendeu cabível novo recurso de integralização. A questão refere-se à análise do que pode ser objeto destes novos aclaratórios, estando correta a interpretação do STJ no sentido de que há preclusão dos eventuais vícios contidos na decisão primeiramente embargada – não há o efeito interruptivo em relação a vícios do primeiro julgado.

Dito de outra forma: nos novos EDs, o recorrente apenas pode aduzir fundamentos ligados à existência de supostos vícios do pronunciamento proferido nos primeiros aclaratórios, tendo em vista a ocorrência de preclusão consumativa em relação aos supostos vícios do pronunciamento anterior e que não foram aduzidos nos primeiros EDs – não ocorrendo a interrupção de prazo (EDcl nos EDcl nos EAg 884.487/SP,Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, J. em 19/12/2017, DJe 20/02/2018; AgInt no AgInt no AREsp 1030707/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma – J. em 21/02/2022, DJe 25/02/2022 e EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1864363/MG, Rel. Min. Regina Helena Costa, 1ª Turma, J. em 14/02/2022, DJe 17/02/2022).

José Henrique Mouta

José Henrique Mouta

Mestre e Doutor (UFPA), com estágio em pós-doutoramento pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Professor do IDP (DF) e Cesupa (PA). Procurador do Estado do Pará e advogado.

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