Extinção do terreno de marinha em debate no Senado   Migalhas
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Extinção do terreno de marinha em debate no Senado – Migalhas

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A Comissão de Constituição e Justiça realizou audiência pública em 27/5/24 sobre a proposta de Emenda à Constituição Federal 3/22, que extingue os terrenos de marinha e acrescidos. As perguntas e declarações disponíveis no site1 do Senado Federal revelam, de certa forma, como anda a opinião e percepção de parte da população que se interessou pelo tema. Constata-se a necessidade de mais informação e esclarecimentos.

Acesso à praia. A preocupação maior é com a limitação ou proibição de acesso à praia. Não existe motivo para esse temor. O acesso à praia é assegurado pela lei Federal 7.661/88. Essa lei institui o Plano de Gerenciamento Costeiro que contém diversos dispositivos sobre a gestão costeira, inclusive a definição legal de praia (art. 10) e a garantia de acesso (parágrafo primeiro).

Contradição entre conceitos legais. Terreno de marinha é conceito de domínio legal de parte da praia a partir da preamar por 33 metros como bem próprio da União (dominical). Isso é incompatível com a definição de praia como bem de uso comum do povo, assegurado na lei 7.661/88.

Preservação ambiental. A lei Federal 7.661/88 e seu Regulamento (decreto 5.300/04) são as normas que efetivamente protegem no plano ambiental a orla costeira. O terreno de marinha não tem essa finalidade. A única função hoje do terreno de marinha é assegurar renda para a União, ainda que tentem transmitir essa imagem.

Democratização do espaço. As praias são amplamente protegidas pela lei Federal 7.661/88 e seu regulamento. Os municípios poderão estabelecer limitações e gestão da orla, em consonância com a sua competência, o que certamente assegura a conservação da função pública de tais espaços

O terreno não é da Marinha do Brasil. Trata-se de bem próprio da União, gerido pelo órgão denominado na sigla SPU. A função é obter renda cobrando foro, multas e laudêmios. Trata-se de exploração patrimonial.

Os entes públicos permanecem com a competência para proteger a praia. Algumas pessoas temem a ausência de proteção e controle sobre a praia. Isso não acontecerá. A praia permanece com ampla proteção que decorre da lei Federal 7.661/88. Essa proteção não advém do terreno de marinha.

Melhoria da racionalidade do regime de domínio público e propriedade privada. Imóveis que comportam uso comum devem ser públicos e os custos são divididos pela Sociedade. Imóveis que comportam uso exclusivo são particulares e os custos são individuais. Essa é a boa racionalidade. A extinção do terreno de marinha aprimora essa racionalidade da organização do domínio e da propriedade no Brasil da seguinte forma:

  • a praia é bem de uso comum do povo, o que decorre da lei Federal 7.661/88;
  • os terrenos vizinhos á praia serão particulares ou públicos segundo a natureza do uso e o título existente;
  • o acesso público à praia e demais regras de proteção urbanística estão assegurados na lei federal que regulamenta o gerenciamento costeiro.
  • Vantagens potencial para todos. A vantagem para a Sociedade Brasileira é a simplificação das relações jurídicas e redução dos custos e da burocracia. Isso tem impacto substancial sobre o preço dos imóveis e segurança jurídica.

    Muitas pessoas temem a especulação imobiliária e o abuso da exploração. O testemunho, pelo trabalha cotidiano com esse tema, é que os advogados perderão grande fonte de renda, mas o Brasil ganhará com a racionalização dos usos: bens de uso comum (praia) devem ser mantidos e asseguradas na sua função pública e bens que comportam título de propriedade devem ser assegurados na sua função social.

    O terreno de marinha não cumpre função social. A União explora parte da praia e parte da área além da praia e nenhuma contrapartida oferece no plano da função social. Trata-se de desvio de finalidade.

    A União é a maior empresa patrimonial do Brasil. A União possui 571.473 imóveis no seu cadastro dos quais 75,67% (567.638 imóveis) são terrenos de marinha e acrescidos aplicados à exploração patrimonial. Essa disfunção precisa acabar e é o que a PEC está sinalizando.

    O debate no Senado Federal deve ser valorizado! Quem sabe prevalecerá o que é melhor para o Brasil. O tema é muito importante porque remove um entulho colonial que cumpriu sua função, hoje está em desvio e foi superado por legislação muito mais adequada e moderna. Mais uma Bastilha que deve cair em prol do futuro!

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    1 Disponível em: https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaoaudiencia?id=29280

    Luiz Walter Coelho Filho

    Luiz Walter Coelho Filho

    Sócio-fundador do escritório Menezes, Magalhães, Coelho e Zarif Sociedade de Advogados. Graduado em Direito pela UFBA, ano de 1985. Exerce a advocacia nas áreas de Direito Administrativo e Imobiliário

    Menezes, Magalhães, Coelho e Zarif Sociedade de Advogados Menezes, Magalhães, Coelho e Zarif Sociedade de Advogados

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