STF e descriminalização da posse da maconha para consumo pessoal   Migalhas
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STF e descriminalização da posse da maconha para consumo pessoal – Migalhas

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O STF , no julgamento do REX 635.659SP, firmou o entendimento, com efeitos vinculantes, no sentido da inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art 28 da lei 11343/06, no tocante ao porte da maconha para consumo pessoal. Ficaram vencidos os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques e Fux.

A Corte acolheu o argumento de que  as penalidades alternativas previstas no aludido Diploma Legal teriam natureza administrativa e não penal. Como fundamento da decisão pontuou que a inconstitucionalidade em questão residiria na ofensa ao art 5º, X, da Constituição Federal, que protege a inviolabilidade da  intimidade e a vida privada das pessoas, dentre outros aspectos. Entendeu que não há , na hipótese em apreço, lesividade da conduta do usuário da maconha, que deve assumir livremente as consequências dos seus atos. Não divisou também atentado à saúde pública, mas sim uma questão meramente de índole pessoal.

Estabeleceu também, a Suprema Corte, a quantidade da maconha para diferenciar o usuário do traficante: 40g ou 6 plantas fêmeas. Alguns ministros, no entanto, sustentaram que tal diferenciação não seria de competência do Judiciário, mas sim dos Legislativo e Executivo. Há que se dizer  que o art 28, & 2º, da lei 11343/06 não estabelece quantidade para tal desiderato. Cabe ao juiz avaliar, nesse mister, as circunstâncias do caso concreto enumeradas nesse preceito legal, inclusive, como parâmetro, a quantidade da maconha, todavia nele não especificada expressamente.

O Tribunal também arrolou uma série de providencias a serem adotada, na aplicação dessa  decisão, pelo CNJ. Nesse particular, o ministro Fux objetou afirmando que algumas dessas medidas seriam de competência dos Legislativo e Executivo.

De outro lado, não parece razoável afirmar que, nesse julgamento, o Judiciário usurpou a competência dos outros poderes, incorrendo em ativismo judicial. No que atina à declaração de inconstitucionalidade do art 28 da referida lei, não se pode divisar invasão de competência pelo Pretório Excelso, pois este  declarou a inconstitucionalidade desse preceptivo legal no controle difuso e em recurso extraordinário, institutos esses agasalhados na Constituição. Agiu a Corte no exercício do seu poder contramajoritário, que legitimamente lhe fora deferido pelo constituinte originário. O que se pode cogitar, na esteira do pensamento de alguns Ministros, é que, no tocante à fixação da quantidade, da droga e em outros alguns aspectos, o STF possa ter atuado com ativismo judicial, ao nosso ver salutar. Salutar porque, como cediço, durante anos o sistema penal, no tocante à aplicação dessa lei, notadamente do seu art 28, tem si mostrado bastante seletivo, privilegiando os mais abastados em detrimento de pretos , pardos e pobres, à mingua de critérios mais objetivos para a diferenciação entre usuário e traficante, em especial a quantidade da droga. Não é demasiado assinalar que o IPEA  apurou que existem no cárcere no Brasil 41 mil presos, num universo de 800 mil, por portarem 25g de droga.   

Ademais, não se pode olvidar que no Congresso Nacional, de maioria conservadora, tramita a PEC 45/23, que — no seu art 1º,  que acrescenta o inciso LXXX ao art 5º da CF –textualmente criminaliza a posse para consumo pessoal de qualquer tipo de droga, independentemente da quantidade, sem autorização ou em desacordo com a lei. Não se pode esquecer que o  REX em pauta tramitou há mais de 9 anos no STF, sem qualquer posicionamento do Legislativo quanto à fixação de critérios mais objetivos para diferenciação entre usuário e traficante, o que tem gerado, de há muito, esse grande flagelo para a sociedade. Só agora o Congresso, pasmem, através de uma PEC, sem resolver esse grave problema, propugna tornar crime a posse  para consumo pessoal de qualquer droga, independente da quantidade.

É induvidoso que os diálogos institucionais entre os poderes da república são muito importantes, como sói acontecer no presente caso. Só que ao STF não restou outra alternativa senão tomar a decisão sob comento, que , a princípio, seria mais propicia ao debate público no parlamento. É que muitos anos já se passaram sem que o Congresso Nacional adotasse qualquer definição para a resolução de um problema tão crucial para a nação. O STF talvez tenha imaginado que instauraria um diálogo institucional com o parlamento, instando – o a adotar uma providência definitiva. Só que só agora o Legislativo , coma edição dessa PEC, sinaliza para a promulgação de uma emenda constitucional flagrantemente inconstitucional.

Na justificativa da PEC 45, ora sob exame, de autoria do senador Rodrigo Pacheco, está consignado que o seu objetivo é ratificar o art 28 da citada lei, emprestando-lhe constitucionalidade. Também nela está dito que o Congresso Nacional estaria agindo para promover um diálogo institucional com o STF, sendo certo que, segundo dela consta, a futura emenda constitucional deveria merecer deferência da Suprema Corte, conforme já decidido na ADI 5.105/DF.

Ocorre que a PEC 45 parece, à primeira vista, padecer de inconstitucionalidade. De fato, a violação ao art 5º, X, da CF se mostra manifesta, conforme reconhecido pelo STF no julgado sob exame. De fato, ela desafia a aplicação do art 60 ,& 4º, IV, da Constituição, por se tratar  de cláusula pétrea o  seu artigo 5º, X.  

Num momento tão tumultuado na relação entre o Legislativo e o STF será preciso aguardar os próximos acontecimentos, rogando que prevaleça a harmonia entre os poderes.

Gustavo Hasselmann

Gustavo Hasselmann

Procurador do município de Salvador/BA. Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Processo Civil e Direito Administrativo. Membro do IAB e do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo.

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