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Nos últimos anos, a crescente digitalização das relações jurídicas e comerciais trouxe à tona importantes discussões sobre a validade das assinaturas eletrônicas no Brasil. A decisão do STJ, no REsp 2159442 – PR, destacou o reconhecimento da assinatura eletrônica realizada fora do sistema ICP-Brasil, gerando um marco regulatório sobre o tema e promovendo a flexibilização das exigências legais para o uso desse tipo de assinatura. Esse julgamento se apoia tanto na evolução legislativa quanto no avanço tecnológico, que torna cada vez mais relevante a adaptação do direito às novas realidades digitais.
A compreensão da decisão do STJ passa, necessariamente, pela diferenciação entre os tipos de assinaturas eletrônicas, conforme previsto pela lei 14.063/20 e regulamentações anteriores, como a MP 2.200-2/01. Essas legislações classificam as assinaturas eletrônicas em três tipos: simples, avançada e qualificada.
A MP 2.200-2/01 é o principal diploma legislativo que regulamenta a utilização de assinaturas digitais no Brasil. Ela instituiu a ICP-Brasil, um sistema hierarquizado de certificação digital que garante a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos eletrônicos.
O art. 10 da MP é claro ao afirmar que os documentos assinados digitalmente com certificados emitidos no âmbito da ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos seus signatários. Isso significa que, por presunção legal, as assinaturas digitais possuem validade jurídica plena.
Todavia, a mesma norma também reconhece, em seu §2º, que outros tipos de assinaturas eletrônicas também podem ser válidos, desde que preencham requisitos de autenticidade e segurança adequados.
Portanto, a decisão do STJ no REsp 2159442 – PR encontra respaldo no próprio texto da MP, que não condiciona a validade jurídica das assinaturas eletrônicas exclusivamente ao sistema ICP-Brasil, desde que as assinaturas utilizadas ofereçam as garantias necessárias de segurança.
O REsp 2159442 – PR envolveu a análise da validade de assinaturas eletrônicas realizadas fora do sistema ICP-Brasil em um contrato de natureza privada. A assinatura eletrônica em questão foi realizada com certificação estrangeira, não vinculada à ICP-Brasil, o que gerou o questionamento por parte da outra parte do contrato quanto à sua validade jurídica.
O STJ, ao julgar o recurso, considerou que o uso de assinaturas eletrônicas avançadas, mesmo fora do sistema ICP-Brasil, é válido desde que atenda aos critérios de segurança, autenticidade e integridade exigidos pela legislação brasileira. O fato de a assinatura não ter sido emitida no âmbito da ICP-Brasil não retira sua validade, desde que o método utilizado assegure a identificação do signatário e a integridade do documento. O Tribunal destacou ainda que a MP 2.200-2/01, ao regulamentar o uso de certificados digitais, não exclui a possibilidade de utilização de outros meios de assinatura eletrônica que ofereçam segurança equivalente.
Essa decisão abre um importante precedente no reconhecimento da validade de assinaturas eletrônicas qualificadas realizadas fora do Brasil, facilitando a vida de brasileiros que vivem no exterior e permitindo maior flexibilidade nas transações internacionais, desde que observados os requisitos legais de segurança.
A decisão do STJ tem reflexos importantes, especialmente no campo dos contratos internacionais e das transações comerciais envolvendo brasileiros residentes no exterior. Até a decisão, a exigência de certificação pelo ICP-Brasil criava barreiras para a utilização de assinaturas eletrônicas em transações internacionais, tornando mais oneroso e complexo o processo de assinatura de documentos por brasileiros no exterior.
Desde que comprovados os requisitos de segurança e autenticidade, a assinatura eletrônica realizada fora do sistema ICP-Brasil será válida no Brasil. Essa flexibilização reduz a burocracia e facilita as transações internacionais, alinhando o direito brasileiro às tendências globais de desburocratização e integração digital.
No entanto, essa abertura exige atenção das partes envolvidas em contratos que utilizem assinaturas eletrônicas fora da ICP-Brasil. É fundamental que se verifique se o método utilizado atende aos requisitos de segurança e autenticidade, sob pena de invalidar o ato jurídico. Ademais, é recomendável que as partes envolvidas, especialmente em transações de maior valor, considerem os riscos envolvidos e adotem práticas que reforcem a confiabilidade do processo de assinatura.
Assim, o STJ, ao flexibilizar a obrigatoriedade de uso exclusivo do ICP-Brasil, reafirma a importância de se equilibrar a segurança jurídica com a eficiência e inovação, promovendo um ambiente mais dinâmico para as transações eletrônicas no Brasil.
Otavio Ribeiro Coelho
Advogado em São Paulo/SP. Mestre em Processo Civil pela PUC/SP. Especialista em Processo Civil pela USP. Especialista em Direito Civil pela PUC/MG. Bacharel em Direito pelo Mackenzie/SP.