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1. Introdução
O presente artigo tem como objetivo mostrar o atual posicionamento da jurisprudência do STF e do STJ sobre a questão da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo.
O artigo também apresentará a legislação correlata ao tema.
E, ao final, buscaremos responder aos seguintes questionamentos:
- É correto o atual posicionamento do STF e do STJ sobre a questão da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo?
- É correta a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo a qualquer tempo?
Esse o objeto do artigo que ora se apresenta.
2. Legislação sobre o tema
No Direito Penal Tributário a punibilidade é excluída, nos casos de pagamento de tributo, mesmo mediante parcelamento. Apresentamos a legislação correspondente – abaixo.
Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995
Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências.
Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.
Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996
Dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências.
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. (Redação dada pela Lei nº 12.350, de 2010)
Parágrafo único. As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pela juiz.
§ 1o Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para fins penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou jurídica do parcelamento. (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011).
§ 2o É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal. (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011).
§ 3o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011).
§ 4o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento. (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011).
§ 5o O disposto nos §§ 1o a 4o não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento. (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011).
§ 6o As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pela juiz. (Renumerado do Parágrafo único pela Lei nº 12.382, de 2011).
Lei nº 10.684, de 30 de maio de 2003
Altera a legislação tributária, dispõe sobre parcelamento de débitos junto à Secretaria da Receita Federal, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e ao Instituto Nacional do Seguro Social e dá outras providências.
Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 1o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.
Lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011
Dispõe sobre o valor do salário mínimo em 2011 e a sua política de valorização de longo prazo; disciplina a representação fiscal para fins penais nos casos em que houve parcelamento do crédito tributário; altera a Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996; e revoga a Lei nº 12.255, de 15 de junho de 2010.
Art. 6º O art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1º a 5º , renumerando-se o atual parágrafo único para § 6º :
“Art. 83. …………………………………………………..
§ 1º Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para fins penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou jurídica do parcelamento.
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal.
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
§ 5º O disposto nos §§ 1º a 4º não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento.
§ 6º As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz.” (NR)
3. Jurisprudência atual do STF sobre a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo
Apresentamos abaixo jurisprudências recentes do colendo STF sobre a questão da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo.
-“(…) 2. A novel legislação penal, que de qualquer modo beneficie o réu – lex mitior -, tem incidência retroativa para alcançar os processos em curso, à vista do disposto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, devendo o juiz, em face dos termos do artigo 61, caput, do Código de Processo Penal, aplicá-la em qualquer fase do processo e, se reconhecer extinta a punibilidade, há de declará-la e de deferir, ex officio, ordem de habeas corpus. 3. In casu, a Lei Federal nº 10.684/2003, ao se referir a casos dos crimes descritos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90, dispôs expressamente em seu parágrafo segundo sobre a extinção da punibilidade dos crimes acima referidos, quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, razão pela qual o Tribunal Regional Federal, ante a comprovação do pagamento do débito tributário pela pessoa jurídica a qual vinculados os agentes, declarou a extinção da punibilidade, o que está em consonância com a jurisprudência assente no Supremo Tribunal Federal: Habeas Corpus nº 81.828-0/RJ, redator para o acórdão Ministro Cezar Peluso, publicado no DJ de 27.02.2004, e Habeas Corpus nº 85.452, relator Ministro Eros Grau, julgado em 17.05.2005, iter alia. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 575071 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-038 DIVULG 26-02-2013 PUBLIC 27-02-2013)
Ementa: AÇÃO PENAL. EX-PREFEITO E ATUAL DEPUTADO FEDERAL. DENÚNCIA DE INFRAÇÃO AO DECRETO-LEI 201/1967, ART. 1º, III E IX. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. EMENDATIO LIBELLI. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO A PARCELA DA APROPRIAÇÃO, EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO PAGAMENTO, EM RELAÇÃO AO MAIS. 1. A apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do Código Penal) prevalece sobre o tipo previsto no art. 1º, XIV, do Decreto-Lei 201/1967, quando a hipótese versa descumprimento de lei municipal atinente a recolhimento a autarquia previdenciária. 2. Ausência de descrição própria de desvio de renda pública, independente da suposta apropriação indébita, leva à absolvição, sobretudo quando a prova dos autos evidencia não ter havido o suposto fato. Improcedência da denúncia, no ponto. 3. Incide, no caso, o entendimento de que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, extingue a punibilidade do crime tributário. Precedente.
(AP 450, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 18/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-028 DIVULG 10-02-2015 PUBLIC 11-02-2015)
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRELIMINAR QUANTO À VALIDADE CONSTITUCIONAL DA ATRIBUIÇÃO E COMPETÊNCIA CONFERIDA AO RELATOR PARA, MONOCRATICAMENTE, NEGAR TRÂNSITO A RECURSOS, PEDIDOS OU AÇÕES, QUANDO INCABÍVEIS, INVIÁVEIS OU CONTRÁRIOS À JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. INSUBSISTÊNCIA DA ARGUIÇÃO. QUESTÕES DE MÉRITO: CRIME TRIBUTÁRIO. PAGAMENTO DO TRIBUTO E CONSEQUENTE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. APLICAÇÃO REATROATIVA DA LEI FEDERAL Nº 10.684/2003. PRECEDENTES DA CORTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O artigo 21, § 1º, do Regimento Interno, expressamente dispõe estar incluída, na esfera de atribuições do relator, a competência para negar, monocraticamente, trânsito a recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, inviáveis, intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência predominante, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarado a validade constitucional deste dispositivo legal por ocasião do julgamento do Mandado de Injunção nº 375 (AgRg), relator Ministro Carlos Velloso, e Mandado de Segurança nº 22.626 (AgRg), relator Ministro Celso de Mello, acórdãos publicados na Revista Trimestral de Jurisprudência nºs 139, p. 53, e 168, p. 174-175, respectivamente. Preliminar rejeitada. 2. A novel legislação penal, que de qualquer modo beneficie o réu – lex mitior -, tem incidência retroativa para alcançar os processos em curso, à vista do disposto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, devendo o juiz, em face dos termos do artigo 61, caput, do Código de Processo Penal, aplicá-la em qualquer fase do processo e, se reconhecer extinta a punibilidade, há de declará-la e de deferir, ex officio, ordem de habeas corpus. 3. In casu, a Lei Federal nº 10.684/2003, ao se referir a casos dos crimes descritos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90, dispôs expressamente em seu parágrafo segundo sobre a extinção da punibilidade dos crimes acima referidos, quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, razão pela qual o Tribunal Regional Federal, ante a comprovação do pagamento do débito tributário pela pessoa jurídica a qual vinculados os agentes, declarou a extinção da punibilidade, o que está em consonância com a jurisprudência assente no Supremo Tribunal Federal: Habeas Corpus nº 81.828-0/RJ, redator para o acórdão Ministro Cezar Peluso, publicado no DJ de 27.02.2004, e Habeas Corpus nº 85.452, relator Ministro Eros Grau, julgado em 17.05.2005, iter alia. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 575071 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-038 DIVULG 26-02-2013 PUBLIC 27-02-2013)
4. Jurisprudência atual do STJ sobre a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo
Apresentamos abaixo jurisprudências recentes do colendo STJ sobre a questão da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo.
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO SISTEMA RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.
1. A via eleita revela-se inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes.
2. O alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal.
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. PAGAMENTO DO TRIBUTO. CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ARTIGO 9º, § 2º, DA LEI 10.684/2003. COAÇÃO ILEGAL CARACTERIZADA. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
1. Com o advento da Lei 10.684/2003, no exercício da sua função constitucional e de acordo com a política criminal adotada, o legislador ordinário optou por retirar do ordenamento jurídico o marco temporal previsto para o adimplemento do débito tributário redundar na extinção da punibilidade do agente sonegador, nos termos do seu artigo 9º, § 2º, sendo vedado ao Poder Judiciário estabelecer tal limite.
2. Não há como se interpretar o referido dispositivo legal de outro modo, senão considerando que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, até mesmo após o advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de extinção da punibilidade do acusado.
3. Como o édito condenatório foi alcançado pelo trânsito em julgado sem qualquer mácula, os efeitos do reconhecimento da extinção da punibilidade por causa que é superveniente ao aludido marco devem ser equiparados aos da prescrição da pretensão executória.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para declarar extinta a punibilidade do paciente, com fundamento no artigo 9º, § 2º, da Lei 10.684/2003.
(HC 362.478/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/20017)
PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PAGAMENTO INTEGRAL DO TRIBUTO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
1. É possível o reconhecimento da extinção de punibilidade, mesmo após o recebimento da denúncia, quando existe prova convergente e pré-constituída no sentido da ocorrência do pagamento integral dos tributos devidos. Precedentes.
2. No caso, as informações prestadas pelo Chefe do Núcleo Fiscal de Cobrança de Marília/SP indicam que, após a inscrição do débito em dívida ativa, foram realizados três recolhimentos, em 13/6/2016, 11/7/2016 e 22/7/2016, suficientes para liquidar integralmente o valor devido.
3. Recurso provido para trancar a ação penal na origem.
(RHC 98.508/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe 13/11/2018)
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. NULIDADE. PLEITO NÃO EXAMINADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ART.
34 DA LEI N. 9.249/1995 E ART. 9º, § 2º, DA LEI N. 10.684/2003.
HIPÓTESES DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO DO PAGAMENTO DO TRIBUTO.
CRIME DO ART. 293, § 1º, III, “B”, DO CP. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL EXPRESSA. SITUAÇÕES SEMELHANTES. ANALOGIA IN BONAM PARTEM. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
2. A discussão acerca da alegada “entrada ilegal em estabelecimento comercial sem devido mandado de busca e apreensão” e, portanto, do pleito anulatório, não foi debatida no Tribunal de origem.
3. Hipótese em que o ato alegado como coator não foi praticado pelo Tribunal a quo, motivo pelo qual não pode esta Corte Superior examinar a matéria sob pena de incorrer em indevida supressão de instância. Precedentes.
4. O delito previsto no art. 293, § 1º, III, “b”, do Código Penal – em que incorreram os pacientes, em razão da conduta de manter em depósito, no exercício de atividade comercial, garrafas de bebida alcoólica sem o selo obrigatório do IPI – está inserido no Capítulo II do Título X do Código Penal, que trata dos crimes contra a fé pública. Apesar disso, observa-se que o bem jurídico tutelado por esse crime não é a fé pública. Trata-se, na verdade, de crime praticado em detrimento apenas da ordem tributária, direcionado tão somente ao combate à sonegação.
5. Mesmo se tratando de crime exclusivamente praticado em detrimento da ordem tributária, o delito previsto no art. 293, § 1º, III, “b”, do Código Penal não está previsto nas hipóteses de extinção da punibilidade, em razão do pagamento do tributo, trazidas pelos arts.
34 da Lei n. 9.249/1995 e 9º, § 2º, da Lei n. 10.684/2003. Aliás, não poderia ser diferente, já que o crime em apreço foi incluído no Código Penal pela Lei 11.035, de 22/12/2004, ou seja, em data posterior à vigência dos dispositivos anteriormente indicados.
6. Nada obstante, não é justo tratar situações semelhantes de modo distinto sem que exista motivo plausível para tanto. É que onde existir a mesma razão haverá o mesmo direito (ubi eadem ratio ibi idem jus). Assim, faz-se necessária a aplicação, ao caso em apreço, de analogia em favor do réu (in bonam partem).
7. Por um lado, quem, por suprimir ou reduzir tributo, incorre em pena prevista no art. 1º da Lei n. 8.137/1990, mas, a qualquer tempo, paga o tributo sonegado tem sua punibilidade extinta, por aplicação do art. 34 da Lei n. 9.249/1995 ou do art. 9º, § 2º, da Lei 10.684/2003. Precedente.
8. Por outro lado, quem, por manter em depósito, no exercício de atividade comercial, garrafas de bebida alcoólica sem o selo obrigatório, responde pelo crime descrito no art. 293, § 1º, III, “b”, do CP, mas, em seguida, paga o tributo que deveria ter sido recolhido – como ocorreu no caso aqui analisado – também deverá ter, por interpretação analógica, sua punibilidade extinta.
9. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para declarar extinta a punibilidade dos pacientes em relação ao delito previsto no art. 293, § 1º, III, “b”, do Código Penal.
(HC 414.879/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 24/05/2018, DJe 30/05/2018)
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. 2. CRIME TRIBUTÁRIO.
CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO. SÚMULA VINCULANTE 24/STF. JUSTA CAUSA. 3. DISCUSSÃO NA SEARA CÍVEL. IRRELEVÂNCIA. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS. 4. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL.
POSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO MESMO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. 5.RECURSO EM HABEAS CORPUS IMPROVIDO.
1. O trancamento da ação penal na via estreita do habeas corpus somente é possível, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito.
2. Somente há justa causa para a persecução penal pela prática do crime previsto no art. 1º da Lei n. 8.137/1990, com o advento do lançamento definitivo do crédito tributário. Nesse sentido, é o teor da Súmula Vinculante n. 24 do Supremo Tribunal Federal: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art.1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.
3. Ocorrido o lançamento definitivo do crédito tributário, eventual discussão na esfera cível não obsta o prosseguimento da ação penal que apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária, haja vista a independência das esferas cível e penal.
4. Não tendo havido o pagamento, não há se falar em extinção da punibilidade. Igualmente, mostra-se despicienda a suspensão da ação penal, porquanto, mesmo após o trânsito em julgado da condenação, é possível a extinção da punibilidade pelo efetivo pagamento do tributo.
5. Recurso em habeas corpus improvido.
(RHC 91.237/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2018, DJe 28/02/2018)
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL.
UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO SISTEMA RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.
1. A via eleita revela-se inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes.
2. O alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal.
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO.
PAGAMENTO DO TRIBUTO. CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ARTIGO 9º, § 2º, DA LEI 10.684/2003. COAÇÃO ILEGAL CARACTERIZADA. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
1. Com o advento da Lei 10.684/2003, no exercício da sua função constitucional e de acordo com a política criminal adotada, o legislador ordinário optou por retirar do ordenamento jurídico o marco temporal previsto para o adimplemento do débito tributário redundar na extinção da punibilidade do agente sonegador, nos termos do seu artigo 9º, § 2º, sendo vedado ao Poder Judiciário estabelecer tal limite.
2. Não há como se interpretar o referido dispositivo legal de outro modo, senão considerando que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, até mesmo após o advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de extinção da punibilidade do acusado.
3. Como o édito condenatório foi alcançado pelo trânsito em julgado sem qualquer mácula, os efeitos do reconhecimento da extinção da punibilidade por causa que é superveniente ao aludido marco devem ser equiparados aos da prescrição da pretensão executória.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para declarar extinta a punibilidade do paciente, com fundamento no artigo 9º, § 2º, da Lei 10.684/2003.
(HC 362.478/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2017, DJe 20/09/2017)
5. Conclusão
Diante do que se apresentou (legislação pátria e jurisprudências recentes do STF e do STJ) passamos a responder aos questionamentos formulados no início do presente artigo. Vejamos:
A) É correto o atual posicionamento do STF e do STJ sobre a questão da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo?
Em nossa opinião é correto o atual posicionamento do STF e do STJ no sentido de que “o pagamento do tributo, a qualquer tempo, até mesmo após o advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de extinção da punibilidade” (STJ – HC 362.478/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2017, DJe 20/09/2017), pois, se não fosse assim, o Estado estaria ingressando em esfera penal – penalizando pessoas – sendo que o objeto principal (recebimento do tributo) já estaria resolvido.
Das lições dos professores Pierpaolo Cruz Bottini e Heloisa Estellita em artigo publicado com o seguinte pensamento:
“O não pagamento de impostos é reprovável e merece atenção do Estado por suas consequências sociais e econômicas. No entanto, é preciso diferenciar a conduta daquele que reconhece e declara a dívida – caso em discussão – daquele que sonega com fraude ou omissão de informações. São situações distintas, de gravidade distinta, e devem ser tratadas de forma diferente. Na primeira é cabível a execução fiscal, que deve e merece ser aprimorada. Na segunda é legítima a atuação do Direito Penal.”
Ora, se o interesse maior do Estado fiscal é recebero tributo, e o recebe “a qualquer tempo”, em nossa opinião não há porque se penalizar na esfera criminal quem pagou o tributo – seja em que tempo for – pois a privação de bens e/ou da própria liberdade – esfera penal – deve ser a ultima ratio.
B) É correta a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo a qualquer tempo?
Em nossa opinião sim, é correta a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo a qualquer tempo.
E por quê?
Porque a legislação pátria dispõe nesse sentido (leis Federais 9.249, de 26.12.1995; 9.430, de 27.12.1996; 10.684, de 30.05.2003 e 12.382, de 25.02.2011 – princípio constitucional da legalidade – ainda mais em se tratando de sanções em matéria penal.)
Além disso, pelos posicionamentos mais modernos dos Tribunais Superiores de nossos país – STF e STJ – como indicado nos julgados acima, que são no seguinte sentido:
“(…) 3. Incide, no caso, o entendimento de que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, extingue a punibilidade do crime tributário. Precedente.
(STF – AP 450, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 18/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-028 DIVULG 10-02-2015 PUBLIC 11-02-2015)
“(…) 2. A novel legislação penal, que de qualquer modo beneficie o réu – lex mitior -, tem incidência retroativa para alcançar os processos em curso, à vista do disposto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, devendo o juiz, em face dos termos do artigo 61, caput, do Código de Processo Penal, aplicá-la em qualquer fase do processo e, se reconhecer extinta a punibilidade, há de declará-la e de deferir, ex officio, ordem de habeas corpus.
(STF – RE 575071 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-038 DIVULG 26-02-2013 PUBLIC 27-02-2013)
Além disso, mesmo que não fosse esse o entendimento do STF e do STJ, ousaríamos em manter nosso posicionamento em dizer queé correta a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo a qualquer tempo, pois, como já dito no item (A), se o interesse maior do Estado fiscal é receber o tributo, e o recebe “a qualquer tempo”, em nossa opinião não há porque se penalizar na esfera criminal quem pagou o tributo – seja em que tempo for – pois a privação de bens e/ou da própria liberdade – esfera penal – deve ser a ultima ratio.
_________
1 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm
2 BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.175, de 25 de outubro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm
3 Portal do STF – Supremo Tribunal Federal – www.stf.jus.br
4 Portal do STJ – Superior Tribunal de Justiça – www.stj.jus.br
Alexandre Pontieri
Advogado desde 2001 – com atuação em todas as instâncias do Poder Judiciário; desde 2006 atuando perante os Tribunais Superiores (STF, STJ, etc.) e no CNJ e CNMP.