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O desemprego tecnológico é, basicamente, a perda de empregos causada pela mudança tecnológica. Essa já é uma preocupação antiga, e se intensificou ainda mais com a ascensão da IA.
De acordo com dados de um relatório divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a IA vai afetar 40% dos empregos mundialmente. Essa transformação não se limita à substituição de tarefas rotineiras, mas impacta também a maneira como o trabalho é estruturado.
Modelos tradicionais, como a escala 6×1, estão sendo questionados, e já existe uma PEC em tramitação, propondo o fim dessa escala. Considerando que a IA permite maior flexibilidade e eficiência, é possível afirmar que essa tecnologia é uma aliada ideal neste processo.
A escala 6X1 é um modelo de trabalho previsto na CLT, na qual determina que o profissional trabalhe por 6 dias e tenha apenas um dia de folga, tudo dentro das 44 horas semanais.
Porém, na prática, esse tipo de escala de trabalho é extremamente desgastante e desumana, pois não permite que o trabalhador tenha o mínimo de qualidade de vida. E é inconcebível que ainda seja um modelo existente e amplamente defendido em 2024.
Com máquinas assumindo funções repetitivas, surge a oportunidade de redistribuir as jornadas, priorizando a qualidade de vida dos trabalhadores e um melhor equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
O que propõe a PEC?
A proposta tem como objetivo reduzir a jornada de trabalho de 44 para 36 horas semanais. Ela mantém o limite de 8 horas diárias, e altera o inciso XIII do art. 7º da CF/88. No documento, propõe-se a seguinte redação: “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis horas semanais, com jornada de trabalho de quatro dias por semana, facultada a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.”
Por que essa escala ainda é problemática em 2024?
O modelo de escala 6×1, amplamente utilizado em setores como comércio e serviços, apresenta diversas problemáticas que impactam diretamente a classe média. Esse regime de trabalho, com jornadas extensas e um único dia de descanso semanal, restringe o tempo disponível para lazer, educação e consumo.
Como resultado, o mercado consumidor sofre uma redução significativa, o que afeta diretamente as vendas e, consequentemente, a receita das empresas. Essa dinâmica gera um ciclo vicioso: com menos consumo, as empresas lucram menos, o que pode levar a cortes de pessoal e estagnação econômica.
A implementação acelerada da inteligência artificial tende a intensificar esse cenário. Ao automatizar processos e substituir funções humanas, a IA pode reduzir ainda mais a demanda por mão de obra, pressionando o poder de compra da classe média.
Além disso, no Brasil, onde grande parte da arrecadação de impostos é concentrada sobre a folha de pagamento, a diminuição de empregos formais afeta diretamente a receita tributária. Com menos impostos arrecadados, o Estado enfrenta dificuldades em manter investimentos em áreas essenciais como saúde, educação e infraestrutura, ampliando as desigualdades sociais.
Ao redor do mundo, muitos já estão se dando conta da necessidade de um equilíbrio. Um exemplo disso é que, na Alemanha, 41 empresas fizeram um experimento e, durante 6 meses, aderiram ao 4×3. O projeto foi coordenado pela Universidade de Münster, no oeste da Alemanha, e pelo programa internacional “4 Day-Week Global”.
Os resultados do estudo apontaram que este modelo de trabalho aumentou significativamente a saúde física e mental dos empregadores. Além disso, eles sofreram menos estresse, e conseguiram fazer mais exercícios e dormir pelo menos 38 minutos a mais toda semana.
Após este teste, 39% das empresas participantes resolveram aderir à escala 4×3, enquanto 34% optaram por continuar testando.
No início do ano algumas empresas no Brasil também testaram a escala 4×3, projeto também coordenado pela 4 Day-week (Brasil), em parceria com a Reconnect Happiness at Work.
Os testes começaram no início deste ano e, em maio, já foram divulgados alguns resultados: Foram percebidas melhorias com relação à energia dos profissionais no trabalho (82,4%), execução de projetos (61,5%), criatividade e inovação (58,5%) e redução do estresse (62,7%).
A partir desses resultados, é possível perceber que é perfeitamente possível adotar, definitivamente, a escala 4×3 no país, sem que isso acarrete prejuízos. Afinal, já que
espera-se boas entregas dos funcionários, isso só será possível se eles tiverem o mínimo de qualidade de vida e produtividade.
Quais as vantagens da derrubada da 6X1?
Além do claro aumento da produtividade, o fim da escala 6×1 representa um avanço significativo nas condições de trabalho no Brasil, promovendo o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Com jornadas mais flexíveis e mais dias de descanso, os trabalhadores têm mais tempo para consumir bens e serviços, o que impulsiona diretamente o mercado consumidor.
Esse aumento no poder de compra, especialmente da classe média, fortalece o ciclo econômico, gerando mais demanda e estimulando o crescimento de diversos setores, desde o comércio até a indústria.
A expansão do mercado consumidor também reforça a sustentabilidade das empresas, que passam a contar com um público mais ativo e diversificado. Além disso, a ampliação do consumo favorece a arrecadação de impostos sobre bens e serviços, aliviando a dependência sobre a folha de pagamento e permitindo uma distribuição mais equilibrada da carga tributária.
Além disso, é importante ressaltar que a folha de pagamento das empresas está prevista para aumentar cerca de 15% com essas mudanças, o que exige uma revisão urgente na forma de cobrança de impostos, especialmente na parte patronal do INSS.
Uma reformulação nesse modelo poderia contribuir para um ambiente de negócios mais favorável, onde o crescimento econômico e a criação de postos de trabalho sejam acompanhados por uma tributação mais justa e eficiente. Esse ajuste beneficiaria o setor produtivo, gerando maior segurança e benefícios aos trabalhadores, fortalecendo o sistema previdenciário de forma sustentável.
Empresas que adotam práticas mais flexíveis e conciliadoras tendem a observar aumento na motivação e no engajamento de seus colaboradores, o que reflete em uma maior eficiência e menor rotatividade de pessoal.
Sob o ponto de vista social, trabalhadores mais descansados e satisfeitos também consomem e participam mais ativamente da vida comunitária, impulsionando a economia local. Ou seja, o Trabalhador após a jornada vira consumidor. Quanto mais gente empregada, mais as empresas vão vender.
Como a IA pode auxiliar nesse processo?
O fim da escala 6×1 ganha ainda mais relevância em tempos de Inteligência Artificial, quando a automação e a digitalização prometem revolucionar o mercado de trabalho. Com a IA integrada a equipamentos, softwares e processos produtivos, a tendência é uma significativa redução tanto na carga horária quanto na quantidade de postos de trabalho tradicionais.
Nesse contexto, não basta migrar para o regime 5×2; faz-se necessário pensar em modelos ainda mais flexíveis, como o 4×3, para garantir que os benefícios da automação sejam distribuídos de forma justa. Reduzir as jornadas não apenas combate o desemprego tecnológico, mas também assegura uma transição mais equitativa para uma nova realidade laboral.
A introdução massiva da IA no ambiente de trabalho não deve ser encarada como uma ameaça, mas como uma aliada poderosa. Ao automatizar tarefas repetitivas e aumentar a eficiência, a tecnologia libera os trabalhadores para atividades mais criativas e estratégicas, além de proporcionar mais tempo para suas vidas pessoais.
Isso fortalece a ideia de que o emprego não precisa mais ser o centro absoluto da vida, permitindo que as pessoas cultivem relacionamentos, invistam em seu bem-estar e desenvolvam habilidades em outras áreas. Em última análise, a IA possibilita que os trabalhadores vivam de maneira mais equilibrada e plena, rompendo de vez com modelos ultrapassados e exaustivos de trabalho.
Eduardo Koetz
Eduardo Koetz é advogado, sócio-fundador da Koetz Advocacia e CEO do software jurídico ADVBOX . Especialista em tecnologia e gestão, ele também se destaca como palestrante em eventos jurídicos.