A ONU, o TCU e a COP 30   Migalhas
Categories:

A ONU, o TCU e a COP-30 – Migalhas

CompartilharComentarSiga-nos noGoogle News A A

A proximidade da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas – COP-30, que, pela primeira vez, será realizada no Brasil, mais especificamente em Belém do Pará, em novembro deste ano, projeta enormes desafios aos anfitriões deste evento de relevância global.

As COPs são reuniões anuais realizadas desde 1995 no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (United Nations Framework Convention on Climate Change ou UNFCCC), que têm como principal tarefa a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera, no contexto da interferência humana. São, portanto, o principal fórum internacional para negociações sobre mudanças climáticas, sob a bandeira das Nações Unidas.

Obviamente, os líderes políticos, representando os países (partes), assumem papel destacado no evento, pois têm legitimidade para discutir e negociar os acordos e compromissos que possibilitam desde o financiamento aos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos até os ajustes de metas globais para limitar o aumento da temperatura média no planeta.

Contudo, não se pode negar proeminência a outros atores. Assim, as empresas (nacionais ou multinacionais), a sociedade civil, os governos subnacionais, os Poderes Legislativo e Judiciário, o Ministério Público, os Tribunais de Contas e as demais instituições públicas e privadas precisam participar ativamente do processo, contribuindo com proposições, ações e soluções inovadoras para enfrentar a crise climática.

Para se ter ideia, as delegações de países membros e as equipes da ONU devem trazer à COP-30 7 mil pessoas, mas o número final de participantes e interessados pode ultrapassar os 40 mil. Logo, a maioria estará ligada aos movimentos sociais diversificados: Ambientalistas, estudantes, representantes de trabalhadores e do empresariado, cientistas e acadêmicos, além de povos indígenas, quilombolas, entre muitos outros.

Na recente COP-29, ocorrida em Baku, no Azerbaijão, foi um grande sucesso a Green Zone, espaço de diálogo colaborativo entre os diversificados grupos envolvidos no enfrentamento de questões climáticas. Mais que um “evento paralelo”, é um espaço necessário, obrigatório e respaldado pela organização da COP. Temos certeza de que na COP-30 não será diferente!

Cabe lembrar, ainda, que as COPs fazem parte dos instrumentos de efetivação da Agenda 2030 e dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, com ênfase no Objetivo 13: “Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos”, dentre as quais se destacam:

  • 13.2 Integrar medidas da mudança do clima nas políticas, estratégias e planejamentos nacionais;
  • 13.3 Melhorar a educação, aumentar a conscientização e a capacidade humana e institucional sobre mitigação, adaptação, redução de impacto e alerta precoce da mudança do clima.

Cabe referir também o Objetivo 16: “Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis” (grifo meu), especialmente o item 16.6: “Desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis”.

Fica claro que o Poder Público é chamado à centralidade na implementação dessas metas, uma vez que desempenha atribuição essencial e intransferível na formulação e execução de políticas que promovem a sustentabilidade e o equilíbrio climático. Em tal contexto, é inafastável que os órgãos de controle, como os Tribunais de Contas, auditem tais políticas, aferindo sua eficácia, adequação, probidade e transparência.

Foi neste contexto de compromissos e levando em conta a necessidade dessas múltiplas atuações, públicas e privadas, que a Assembleia Geral das Nações Unidas, no final de 2024, adotou, a partir de uma propositura apresentada pelo Brasil, a resolução 79/231, visando promover e fortalecer a eficiência, a responsabilidade, a eficácia e a transparência da administração pública por meio do fortalecimento das ISA – Instituições Superiores de Auditoria.

Os principais pontos da resolução quanto à atuação das ISAs, que, no caso brasileiro, têm no TCU sua representação mais significativa, sem excluir as demais Cortes de Contas dos entes subnacionais, foram:

  • Independência, pois “[…] só podem realizar suas tarefas objetivamente e eficazmente se forem independentes da entidade auditada e protegidas contra influências externas”;
  • Relevância geral, na medida em que são responsáveis pela “[…] promoção da eficiência, responsabilidade, eficácia e transparência da administração pública”; e
  • Relevância na questão das mudanças climáticas, colaborando com os governos ao fornecerem “[…] avaliações independentes e objetivas da ação nacional neste campo, promovendo a alocação eficiente de recursos, avaliando a eficácia da implementação de políticas e promovendo a transparência e a boa governança”.

Também ficou registrada na resolução da ONU a atuação determinante da INTOSAI, Organização Internacional das Instituições Superiores de Controle. Trata-se de uma organização autônoma e independente que objetiva promover o aprimoramento global da auditoria pública externa, presidida atualmente pelo ministro do TCU Bruno Dantas.

A INTOSAI é responsável por um projeto que merece acompanhamento, por relacionar-se ao tema aqui tratado: O ClimateScanner, uma ferramenta de avaliação que concentra informações das ações governamentais relacionadas à mudança do clima e possibilita uma avaliação global nas áreas de governança, políticas públicas e financiamento, com objetivos definidos:

a) Avaliar as informações obtidas em nível nacional e internacional; b) Consolidar dados produzidos pelas instituições superiores de controle participantes; c) Comunicar informações relevantes em linguagem de fácil compreensão; d) Dar suporte ao planejamento das ISCs e à tomada de decisões pelos governos nacionais.

Interessante que a resolução 79/231, de 19/12/24, dá ênfase a capacitações, treinamentos e assistência técnica, inclusive os promovidos pela INTOSAI, a fim de “[…] promover a boa governança em todos os níveis, garantindo eficiência, responsabilidade, eficácia e transparência por meio de instituições superiores de auditoria fortalecidas”. Essa abordagem integrada, colaborativa e cooperativa é fundamental para o enfrentamento dos complexos, profundos e graves problemas associados às mudanças climáticas.

O documento finaliza com alguns encorajamentos (encourages) aos Estados-membros da ONU em relação às suas ISAs, aqui aplicadas aos nossos Tribunais de Contas, especialmente ao TCU:

  • Que achados, conclusões e recomendações relacionadas ao clima nos relatórios das Cortes de Contas sejam efetivamente considerados pelos Estados-membros;
  • Que as Cortes de Contas sejam fortalecidas para auditar políticas, despesas e ações nacionais relacionadas ao clima;
  • Que as Cortes de Contas tenham reconhecida sua independência e recebam apoio para realizar capacitações, promovendo o aperfeiçoamento dos sistemas de contabilidade pública, alinhados aos ODS.

A respeito desta questão, escrevemos o artigo: “TCU e a crise climática: governança multinível e articulação social”, publicado no Migalhas, no qual destacamos que o TCU já identificou, em auditoria operacional constante do acórdão 2201/24 – TCU/plenário, como principais problemas para a efetiva governança climática brasileira: A falta de articulação entre os entes federativos e a sociedade organizada e a baixa transparência do denominado “gasto climático”.

A resolução 79/231 da Assembleia Geral da ONU é um novo marco histórico dessa atuação em prol da governança climática.

Giussepp Mendes

Giussepp Mendes

Advogado especialista em direito administrativo público.

Pinheiro & Mendes Advogados Pinheiro & Mendes Advogados

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *