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Sancionada no final de 2024, a lei de seguros promete movimentar o mercado segurador, que deve aproveitar o período da vacatio legis, de 1 ano, para se adaptar ao novo marco legal.
E serão inúmeros os desafios a serem enfrentados pelas seguradoras, sobretudo em razão de disposições intervencionistas e protecionistas do texto legal, que impõe às seguradoras, sem distinção entre pequenos consumidores e grandes segurados, uma série de ônus e obrigações que, se não observados, certamente impactarão sua operação.
A título exemplificativo, citamos o capítulo II da lei, que trata do Interesse, ao prever, em seu art. 6º, a necessidade de redução/devolução proporcional do prêmio na hipótese da extinção ou redução do chamado interesse legítimo, o que também se ressalva no capítulo seguinte (III), que trata do risco, na contramão da atual redação do art. 770 do CC. Na prática, isso pode gerar insegurança nos resultados de operações tanto massificadas como de grandes riscos, o que exigirá maiores esforços por ocasião da precificação dos prêmios e da subscrição de riscos diversos, assim como do desenvolvimento de carteiras e fomento de novos produtos.
Ainda no capítulo que trata do risco, ressalva-se, como já ocorre nos dias atuais, a necessidade de que riscos e interesses excluídos sejam descritos de forma clara e inequívoca. No entanto, a nova lei prevê que, no caso de qualquer divergência entre a garantia delimitada no contrato e a prevista no chamado “modelo de contrato” ou nas “notas técnicas e atuariais”, apresentados ao órgão fiscalizador competente, prevalecerá o texto mais favorável ao segurado, o que exigirá das seguradoras uma revisão detida e a compatibilização e reformulação dos clausulados, modelos e notas técnicas e atuariais atualmente depositadas no órgão fiscalizador.
Situações de perda de direitos frente ao agravamento do risco se tornarão ainda mais subjetivas, na medida em que, além da intencionalidade, deverá ser demonstrada a sua relevância, o que, segundo a lei, significa aquele “agravamento que conduza ao aumento significativo e continuado da probabilidade de realização do risco descrito no questionário de avaliação de risco referido no art. 44 ou da severidade dos efeitos de tal realização”.
Ademais, comunicada sobre situação de agravamento, a seguradora terá o prazo de 20 dias para cobrar a diferença do prêmio, sendo possível a resolução do contrato apenas no caso de risco tecnicamente impossível; mas, caso a seguradora opte pela resolução do contrato na referida hipótese, ainda ficará exposta ao risco pelo prazo de 30 dias, contado do recebimento da notificação pelo segurado a respeito da resolução do contrato.
Ainda quanto ao agravamento, também merece destaque a disposição da lei no sentido de que caso ele resulte no incremento do prêmio em montante superior a 10%, o segurado poderá recusar a modificação do contrato, que será resolvido em 15 dias, a partir da ciência da alteração do prêmio, gerando efeitos desde o momento em que o risco foi agravado.
Além disso, revela-se mandatória, também, a revisão dos questionários de risco, entre outros, na medida em que os segurados somente são obrigados a informar aquilo que for expressamente questionado pelas seguradoras. Por isso, para que possam valer as exceções e as defesas das seguradoras em razão das declarações prestadas para a formação do contrato, o documento de adesão ao seguro deverá ter seu conteúdo preenchido pessoalmente pelos segurados ou beneficiários, o que exigirá um melhor aparelhamento por parte das cias.
A resolução do contrato pelo não pagamento do prêmio só se fará possível mediante envio de notificação com tal advertência e a seguradora somente se “libera integralmente” da obrigação a partir de então, o que nos parece inclusive representar uma violação à exceção do contrato não cumprido, prevista no art. 476 do CC. Medidas de maior controle de situações de não pagamento, portanto, deverão ser implementadas pelas seguradoras.
A lei ainda prevê que, no caso de sinistro após a informação de agravamento, a seguradora somente poderá negar cobertura se comprovar o nexo causal entre a situação informada e o sinistro, o que exigirá, a depender da complexidade técnico-jurídica e do montante envolvido, a atuação de equipes jurídica e técnica de notória expertise desde o início das apurações.
Prazos e obrigações também são mais rígidos para as seguradoras no que diz respeito ao processo de regulação de sinistros, e em inúmeras outras passagens a lei impõem indiscriminadamente às seguradoras o ônus da prova, sendo mandatório, sobretudo em grandes riscos, o aprimoramento das práticas de subscrição e monitoramento do risco, o que reforça a necessidade de que toda a operação das seguradoras seja revista.
Enfim, o objetivo deste breve artigo não é o de esgotar as novidades, os desafios e assincronias da nova lei de seguros, mas o de alertar o mercado a respeito da necessidade premente de revisão de seus produtos e redesenho de toda a sua operação, com especial olhar para as áreas comerciais, de atuária, de produtos, de subscrição, sinistro, jurídico e de resseguro, e contar com a expertise de assessorias técnica e jurídica especializadas que, como fizeram até hoje, devem atuar de modo a fomentar a boa aplicação da lei, em benefício da sustentabilidade e do desenvolvimento do mercado segurador.
Tatiana Algodoal Rosa
Advogada – Schalch Sociedade de Advogados
Schalch Sociedade de Advogados
Luis Fernando Bueno Garcia
Advogado – Schalch Sociedade de Advogados