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A movimentação de ações em sociedades anônimas de capital fechado envolve uma dinâmica específica que equilibra interesses empresariais e a proteção de informações sensíveis. Nessas empresas, onde as ações não são negociadas publicamente em bolsa de valores, o sigilo nas transações é essencial para preservar a confidencialidade dos negócios e evitar a exposição de estratégias ou dados financeiros que poderiam comprometer a competitividade. O princípio de sigilo ganha ainda mais relevância no contexto jurídico brasileiro, sendo respaldado pela lei 6.404/76, conhecida como lei das sociedades por ações, que regula as obrigações e direitos dos acionistas, bem como os limites de divulgação de informações corporativas
A lei das sociedades por ações estabelece que as sociedades de capital fechado não estão obrigadas a seguir a mesma transparência exigida das empresas de capital aberto, como a divulgação pública de balanços e informações financeiras detalhadas. Isso não significa, entretanto, que essas empresas estejam isentas de responsabilidade quanto à proteção de informações sensíveis. O art. 116 da LSA, por exemplo, prevê que o acionista controlador deve agir com lealdade para com os demais acionistas e a empresa, evitando que informações internas sejam utilizadas de forma abusiva ou contrária aos interesses da companhia. Nesse sentido, o sigilo nas transações de ações desempenha um papel crucial na manutenção da confiança entre os acionistas e na integridade do mercado interno.
Do ponto de vista ético, a proteção do sigilo em sociedades de capital fechado não é apenas uma questão de compliance, mas também de preservação das relações entre os acionistas. A divulgação indevida de informações pode gerar conflitos internos, afetar a reputação da empresa e, em alguns casos, comprometer a continuidade das operações. É essencial que os envolvidos nas negociações, como administradores, acionistas e eventuais intermediários, compreendam a importância de adotar medidas rigorosas para proteger a confidencialidade das transações. Isso inclui a implementação de políticas internas, como acordos de confidencialidade e a limitação de acesso a dados estratégicos.
Os desafios legais relacionados ao sigilo na movimentação de ações são significativos, especialmente no contexto da globalização dos negócios e da crescente digitalização dos processos corporativos. A utilização de tecnologias avançadas para realizar transações eletrônicas oferece praticidade, mas também expõe as empresas a riscos de vazamentos e acessos não autorizados. Para mitigar esses riscos, as sociedades anônimas de capital fechado devem adotar práticas de segurança cibernética robustas e cumprir com as disposições da LGPD (lei 13.709/18). Essa legislação, embora amplamente associada ao tratamento de dados pessoais, também estabelece diretrizes que podem ser aplicadas para proteger informações empresariais sensíveis durante transações de ações.
Além disso, o sigilo na movimentação de ações está diretamente ligado ao princípio da governança corporativa, que incentiva a transparência nas relações internas enquanto protege informações estratégicas da exposição externa. Embora não seja obrigatório para as empresas de capital fechado seguirem os mesmos padrões das sociedades de capital aberto, adotar práticas robustas de governança, como auditorias internas e a criação de conselhos administrativos, pode fortalecer a proteção de dados e a confiança entre os acionistas. Isso é particularmente relevante em situações de compra ou venda de participações significativas, onde a divulgação prévia de informações poderia afetar o valor de mercado das ações ou dar vantagens indevidas a terceiros.
Um exemplo prático que ilustra a relevância do sigilo no contexto das sociedades de capital fechado é a negociação de ações em holdings familiares. Nessas empresas, a preservação da confidencialidade é vital para evitar que informações sobre a composição acionária ou a distribuição patrimonial sejam usadas de forma inadequada por concorrentes ou mesmo por membros da própria família. A inclusão de cláusulas específicas em acordos de acionistas, como cláusulas de confidencialidade e de preferência, é uma estratégia amplamente utilizada para reforçar o sigilo e evitar litígios futuros.
Ainda que o sigilo seja uma prioridade nas transações de ações, ele não deve ser confundido com a ocultação de informações obrigatórias. As sociedades de capital fechado devem respeitar as obrigações legais de registro e comunicação previstas em leis e regulamentos, como o arquivamento de alterações no quadro societário na Junta Comercial e a comunicação de transações relevantes aos órgãos fiscais competentes. A ausência de transparência em aspectos legais pode expor a empresa a penalidades e comprometer sua credibilidade no mercado
O desafio, portanto, é encontrar um equilíbrio entre a necessidade de confidencialidade nas transações e o cumprimento das obrigações legais e regulatórias. Para isso, é fundamental que as empresas invistam em assessoria jurídica e consultorias especializadas que possam orientar na elaboração de políticas e procedimentos internos adequados. Um exemplo de boa prática é a realização de due diligences periódicas, que avaliem não apenas a situação financeira da empresa, mas também o cumprimento das normas de proteção de dados e o alinhamento das práticas internas aos princípios éticos e legais.
Conclui-se que o princípio de sigilo na movimentação de ações em sociedades anônimas de capital fechado é uma ferramenta indispensável para proteger os interesses estratégicos e patrimoniais da empresa. Além de preservar a confidencialidade das transações, ele promove a confiança entre os acionistas, fortalece a governança corporativa e minimiza os riscos de conflitos e litígios. No entanto, para que o sigilo seja efetivo, é necessário que as empresas adotem práticas sólidas de compliance e segurança, aliadas a uma interpretação equilibrada das normas legais e éticas. Dessa forma, o sigilo se torna não apenas uma obrigação, mas um diferencial competitivo para as sociedades que buscam prosperar em um ambiente cada vez mais exigente e dinâmicas.
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1 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm
2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm
3 https://www.gov.br/mds/pt-br/acesso-a-informacao/privacidade-e-protecao-de-dados/ lgpd
4 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/129025/lei-das-sociedades-anonimas-de-197 6-lei-6404-76
5 https://www.sindratarpe.org.br/2022/03/23/lei-6404-76-entenda-as-principais-regulac oes-da-lei-das-s-a
6 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/129025/lei-das-sociedades-anonimas-de-197 6-lei-6404-76
Raul Kochhann Bergesch
Advogado especialista em resolver complexidades Societárias para empresas e empresários. Sócio-fundador do escritório Bergesch Advogados.