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Os Núcleos de Justiça 4.0 representam um passo decisivo na modernização do Judiciário brasileiro. Criados para atender demandas de alta complexidade e relevância social, como aquelas relacionadas à saúde suplementar, eles aliam tecnologia, especialização e eficiência. No entanto, a resistência de algumas partes à remessa de processos para esses núcleos especializados levanta uma questão importante: por que hesitar diante de um modelo que oferece decisões mais técnicas, uniformes e ágeis?
Ao tratar de temas como o direito à saúde suplementar, as decisões judiciais devem estar ancoradas em fundamentos técnicos, diretrizes regulatórias e evidências científicas. Nesse contexto, os Núcleos de Justiça 4.0 oferecem um ambiente especializado, capaz de analisar questões complexas com maior precisão. Essa estrutura não apenas beneficia o Judiciário, reduzindo litígios repetitivos e inconsistências, mas também fortalece o setor regulado, promovendo maior previsibilidade e segurança jurídica.
Para as operadoras de saúde, a centralização em núcleos especializados é especialmente vantajosa. As decisões alinhadas às diretrizes da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar e do CNJ ajudam a criar um ambiente mais estável e regulado. Isso evita interpretações divergentes que podem impactar o planejamento e a sustentabilidade do setor, além de mitigar riscos de judicialização predatória ou oportunista.
Por outro lado, a resistência à remessa dos processos para os Núcleos de Justiça 4.0 pode ter motivações diversas.
Um ponto central é que a regulamentação desses núcleos confere a parte autora a prerrogativa de optar pela tramitação no núcleo no momento da distribuição do processo, conforme estabelecido pela resolução 385/21 do CNJ.
Essa possibilidade, contudo, pode passar despercebida no momento do protocolo eletrônico da petição inicial. Quando a indicação expressa não é feita, cabe ao juízo de origem, como regra, respeitar a ausência de manifestação ou, em situações específicas, determinar a remessa do processo ao núcleo, considerando a natureza especializada da matéria.
A falta de clareza ou a negligência em relação a essa dinâmica tem gerado conflitos de competência entre juízos de origem e os Núcleos de Justiça 4.0, como observado em decisões recentes. Essas situações revelam a importância de uma atuação diligente por parte da defesa, que deve monitorar ativamente a tramitação processual. Caso o processo não tenha sido direcionado ao núcleo especializado, é essencial que o réu ou interessado requeira ao juízo de origem a remessa dos autos, fundamentando a necessidade de análise técnica alinhada às diretrizes regulatórias. Alternativamente, o juízo pode intimar o autor a justificar sua não opção pela tramitação no núcleo, assegurando que a escolha tenha sido consciente e fundamentada.
Por outro lado, em alguns casos, há uma busca por litigar em juízos menos especializados, onde a imprevisibilidade ou a ausência de expertise técnica pode favorecer abordagens emocionais ou estratégias dilatórias. Essas práticas comprometem a construção de uma jurisprudência técnica e bem fundamentada, gerando insegurança jurídica tanto para as operadoras quanto para os beneficiários.
De toda forma, é papel do Judiciário esclarecer que a tramitação nos núcleos especializados não elimina o direito das partes de buscar o acesso à Justiça, mas garante que as decisões sejam tomadas em um ambiente capacitado para lidar com questões específicas de saúde suplementar. A resistência a essa tramitação, em muitos casos, apenas perpetua a fragmentação e a imprevisibilidade no sistema judicial, colocando em risco o objetivo maior: decisões justas, técnicas e embasadas.
Além disso, o argumento de que a tramitação nos núcleos pode comprometer o acesso à Justiça por questões logísticas ou tecnológicas deve ser analisado com cautela. O modelo 100% digital dos Núcleos de Justiça 4.0 foi concebido para superar barreiras físicas e promover inclusão. Quando bem estruturados, eles oferecem ferramentas acessíveis e garantem o acompanhamento do processo com a mesma eficiência de juízos ordinários, somado à expertise técnica.
A resistência à tramitação nos núcleos especializados não apenas merece críticas, mas demanda uma reflexão profunda. Evitar a análise por juízos capacitados significa abrir mão de oportunidades para fortalecer a jurisprudência e aprimorar o diálogo entre o Judiciário e os setores regulados. Nesse contexto, é essencial que o Judiciário avance na consolidação dos Núcleos de Justiça 4.0 como ferramentas indispensáveis de modernização e alinhamento técnico.
Consolidar os Núcleos de Justiça 4.0 representa um avanço significativo rumo a um Judiciário mais moderno, confiável e preparado para atender às necessidades da sociedade com eficiência e equidade. É um passo decisivo para assegurar que o sistema de Justiça cumpra plenamente sua função de promover direitos, resolver conflitos e fortalecer a confiança nas instituições. Afinal, um Judiciário capaz de se adaptar às transformações de um mundo em constante evolução é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e equilibrada.
Anny Ágata Trindade de Araújo
Advogada – Bhering Cabral Advogados
Bhering Cabral Advogados Associados
Daniela Damasceno Couto
Advogada do Bhering Cabral Advogados.
Bhering Cabral Advogados Associados
Fernanda Pontes
Advogada – Bhering Cabral Advogados
Bhering Cabral Advogados Associados
Yuri Domingues
Advogado – Bhering Cabral Advogados