Impacto do marco legal dos jogos eletrônicos na legislação brasileira   Migalhas
Categories:

Impacto do marco legal dos jogos eletrônicos na legislação brasileira – Migalhas

CompartilharComentarSiga-nos noGoogle News A A

A promulgação da lei 14.852/24, conhecida como marco legal dos jogos eletrônicos, marca um importante avanço regulatório no setor de games no Brasil. Reconhecendo o país como líder na América Latina e um dos dez maiores mercados globais, a legislação estabelece bases para fomentar a inovação, incentivar o empreendedorismo e proteger os direitos de consumidores e desenvolvedores.

1. Contexto e objetivos da lei

A lei 14.852/24 regula toda a cadeia produtiva dos jogos eletrônicos, abrangendo fabricação, importação, comercialização, desenvolvimento e uso comercial. Além disso, busca promover um ambiente de negócios favorável, fortalecendo:

  • Os direitos da criança e do adolescente;
  • O direito do consumidor;
  • A proteção de dados pessoais;
  • A inclusão de pessoas com deficiência.

Com base no art. 3º, a lei garante a liberdade para fabricar, importar e comercializar jogos eletrônicos, respeitando os princípios constitucionais da livre iniciativa e as normas do art. 173 da CF/88.

2. Classificação etária e microtransações

O texto também determina que o Estado realize a classificação etária indicativa sem exigir autorização prévia para a exploração comercial dos jogos.

Um ponto relevante é a consideração dos riscos associados às microtransações. Essas transações, como compras de itens dentro do jogo, são comuns, mas podem gerar desafios financeiros, especialmente para menores de idade.

2.1 Exemplo prático

Imagine que Pedro, uma criança de 11 anos, aproveita que sua mãe está dormindo para usar seu cartão de crédito e comprar itens exclusivos dentro de um jogo eletrônico, totalizando R$ 25 mil. Neste caso, o jogo não garantiu o consentimento do responsável, conforme previsto no art. 17 da lei 14.852/24. 

A consequência disso é tornar o negócio jurídico nulo, com base no art. 166, I, do CC, além de caracterizar falha na prestação do serviço, segundo o art. 14 do CDC.

Assim, é possível requerer a restituição integral do valor.

3. Diferenciação entre jogos eletrônicos e jogos de apostas

De acordo com o parágrafo único do art. 5º, jogos eletrônicos, como Super Mario World (1990), não podem ser confundidos com jogos de apostas. 

Estes últimos envolvem prêmios em ativos reais ou virtuais e resultados aleatórios ou de prognóstico, estando sujeitos à legislação específica sobre apostas.

4. Fomento ao empreendedorismo e reconhecimento cultural

Outro aspecto central da lei é o incentivo à indústria de jogos como um segmento cultural, permitindo que projetos se beneficiem de mecanismos como a lei rouanet (lei 8.313/91) e a lei do audiovisual (lei 8.685/93).

Além disso, empresas desenvolvedoras podem aderir ao regime do simples nacional e acessar incentivos fiscais para fomentar a inovação.

Conforme o art. 8º, empresas com receita anual de até R$ 16 milhões podem se enquadrar na modalidade de tratamento especial, promovendo o crescimento de pequenos e médios desenvolvedores no setor.

5. Educação e formação de profissionais

A lei também promove a formação de recursos humanos especializados, incentivando a criação de cursos técnicos e superiores voltados para jogos eletrônicos.

Políticas públicas também poderão financiar plataformas de jogos educativos e repositórios gratuitos para instituições de ensino e pesquisa.

6. Proteção de crianças e adolescentes

O art. 15 estabelece que jogos acessíveis a crianças e adolescentes devem priorizar seu superior interesse, garantindo medidas de proteção contra riscos, como discriminação e exploração.

A lei também exige acessibilidade para crianças com deficiência, conforme o Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/15).

Considerações finais

A lei 14.852/24, publicada no Diário Oficial em 6/5/24, representa um marco histórico para a indústria brasileira de jogos eletrônicos. Ao regulamentar desde as microtransações até os incentivos fiscais, a legislação estabelece as bases para um mercado mais ético, inclusivo e competitivo, posicionando o Brasil como referência global no setor.

__________

1 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 22 jan. 2025.

2 BRASIL. Lei nº 14.852, de 6 de maio de 2024. Dispõe sobre o Marco Legal dos Jogos Eletrônicos. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 22 jan. 2025.

3 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Lei 14.852/2024: Marco Legal dos Jogos Eletrônicos (ou Marco Legal dos Games). Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: https://www.buscadordizerodireito.com.br/novidades_legislativas/detalhes/69421f032498c97020180038fddb8e24. Acesso em: 22/01/2025

4 BBC NEWS BRASIL. As armadilhas dos games para fazer crianças gastarem dinheiro sem parar. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/clw9xep49zgo. Acesso em: 22 jan. 2025.

5 DIABLO IMMORTAL. Caso sobre microtransações. Disponível em: https://tinyurl.com/ja4dcy47. Acesso em: 22 jan. 2025.

Camila Betanin

Camila Betanin

Advogada | Professora | Especialista em Direito Digital, Direito Empresarial & Inovação e Direito Contratual| Sócia-Fundadora do Betanin & Leal – Advocacia e Consultoria.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *