Personalidade eletrônica: A criação de direitos para robôs com IA   Migalhas
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Personalidade eletrônica: A criação de direitos para robôs com IA – Migalhas

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A evolução da robótica e da IA – Inteligência Artificial tem redefinido os limites entre humanos e máquinas, gerando debates sobre a necessidade de reconhecer direitos e deveres para entidades não-humanas. Em 2017, o parlamento europeu propôs a criação de um status jurídico especial para robôs autônomos, denominado “pessoa eletrônica”, com o objetivo de regulamentar sua integração na sociedade e atribuir responsabilidades por seus atos. Essa proposta, no entanto, levanta questões complexas sobre a natureza da personalidade jurídica, os riscos de uma retórica antropomórfica e os desafios de adaptar o Direito Civil a uma realidade tecnológica em constante transformação.

Este artigo investiga a proposta de personalidade jurídica eletrônica para robôs com IA, analisando os riscos e problemas dessa iniciativa, bem como suas implicações para a ampliação da subjetividade jurídica. Ao explorar esse tema, pretende-se contribuir para o avanço do debate jurídico e oferecer insights práticos para operadores do Direito.

1. A proposta de personalidade eletrônica no parlamento europeu

A resolução do parlamento europeu sobre Direito Civil e Robótica sugere a criação de um status jurídico específico para robôs autônomos, baseado no modelo da sociedade limitada personificada. A ideia é que robôs com alto grau de autonomia sejam tratados como “pessoas eletrônicas”, com direitos e deveres específicos.

Essa proposta busca resolver questões práticas, como a responsabilização por danos causados por robôs autônomos e a regulamentação de sua integração em setores como saúde, transporte e indústria. No entanto, ela também levanta preocupações sobre a diluição da responsabilidade humana e a banalização do conceito de personalidade jurídica.

2. Riscos e problemas da personalidade eletrônica

A criação de uma personalidade jurídica eletrônica para robôs apresenta vários riscos e desafios:

  • Diluição da responsabilidade humana: Atribuir personalidade jurídica a robôs pode desviar a responsabilidade de desenvolvedores e operadores, dificultando a identificação de responsáveis por danos causados por sistemas autônomos;
  • Retórica antropomórfica: A personificação de robôs pode levar a uma visão distorcida de sua natureza, ignorando que são produtos de engenharia e programação, e não seres conscientes;
  • Impacto no conceito de pessoa jurídica: A ampliação da subjetividade jurídica para incluir robôs pode enfraquecer o significado tradicional de pessoa jurídica, que foi concebida para regular entidades coletivas, como empresas, e não máquinas.

3. Casos concretos e jurisprudência

Em 2021, um caso na Alemanha envolvendo um robô humanoide que causou danos materiais em um hospital destacou a necessidade de normas claras sobre responsabilidade civil. A falta de um marco regulatório específico para robôs autônomos complicou a identificação de responsáveis, reacendendo o debate sobre a criação de uma personalidade jurídica eletrônica.

No Brasil, o PL 2.338/23, que regulamenta o uso de IA, aborda indiretamente a questão da personalidade jurídica de robôs, mas não avança na criação de um status específico para essas entidades.

4. Soluções práticas e regulamentação

Para mitigar os riscos e maximizar os benefícios da personalidade jurídica eletrônica, é essencial desenvolver frameworks legais que promovam a transparência, a responsabilidade e a proteção dos direitos humanos. Como soluções práticas, propõe-se:

  • Responsabilização civil: Criar normas que definam claramente a responsabilidade de desenvolvedores, operadores e robôs autônomos por danos causados por suas ações;
  • Diretrizes éticas: Estabelecer diretrizes para o uso ético de robôs, garantindo que sejam tratados como ferramentas tecnológicas e não como seres conscientes;
  • Fiscalização e supervisão: Designar uma autoridade competente para fiscalizar o uso de robôs, com poderes para aplicar sanções em caso de violações.

Conclusão

A proposta de criação de uma personalidade jurídica eletrônica para robôs com IA representa uma fronteira ética e jurídica complexa. Embora essa iniciativa possa resolver questões práticas, como a responsabilização por danos causados por robôs autônomos, também apresenta riscos significativos, como a diluição da responsabilidade humana e a banalização do conceito de personalidade jurídica.

Como soluções práticas, sugere-se a criação de normas específicas para a responsabilização civil, a proteção de direitos e a fiscalização do uso de robôs. O futuro da regulamentação da personalidade jurídica eletrônica dependerá de nossa capacidade de equilibrar avanços tecnológicos com valores éticos e jurídicos consolidados.

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Jamille Porto Rodrigues

Jamille Porto Rodrigues

Advogada e Professora de Direito Digital, Inteligência Artificial e Novas tecnologias aplicada ao Direito e Marketing Jurídico.

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