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As ações coletivas chegaram ao nosso país com uma promessa: facilitar o acesso à justiça e proteger os direitos fundamentais. No entanto, o que poderia ser uma grande solução se transformou, na prática, em um labirinto de processos lentos e cheios de obstáculos, especialmente quando chega o momento de garantir que o que foi decidido seja realmente cumprido. E no meio disso, surgem desafios em cada fase, deixando muitas pessoas se perguntando: por que as ações coletivas não funcionam como deveriam?
No Brasil, elas ganharam força com a criação da lei da ação civil pública (1985) e do CDC (1990), que forneceram suporte legal para defender direitos importantes. No entanto, apesar das boas intenções dessas leis, na prática elas ainda enfrentam grandes desafios, tanto na estrutura do sistema judicial quanto nas questões culturais e operacionais que cercam os processos.
Um dos principais problemas é a legitimidade processual. Apenas entidades específicas, como o Ministério Público e algumas associações, podem propor ações coletivas. Embora esse modelo seja positivo, ele limita a participação de outros grupos que também poderiam representar os interesses das pessoas afetadas. Além disso, o sistema judicial ainda debate quem pode ou não representar determinados grupos, criando insegurança e prejudicando a agilidade da Justiça.
Na fase de conhecimento, onde as provas são apresentadas e os direitos reconhecidos, surgem novos obstáculos. Grandes empresas, por exemplo, usam estratégias processuais para atrasar o andamento dos casos, como recorrer excessivamente ou tentar anular as decisões. Para os advogados, reunir os documentos necessários e alinhar a estratégia para um grupo tão diverso é um grande desafio. Mas o maior problema ocorre na fase de execução, quando é a hora de pagar os beneficiários. Localizar as pessoas que têm direito ao que foi decidido, reunir a documentação e lidar com essa burocracia exige tempo e recursos. A falta de um banco de dados unificado sobre quem tem direito ao pagamento torna o processo ainda mais lento e ineficaz.
Na prática, advogados enfrentam dificuldades operacionais e tecnológicas, pois muitos sistemas judiciais não estão preparados para lidar com a complexidade das ações coletivas. A falta de automação nas etapas essenciais aumenta ainda mais a morosidade. Para os beneficiários, a situação é ainda mais difícil. Muitos não sabem que têm direito a valores de uma ação coletiva ou não conseguem apresentar a documentação no prazo. Essa desconexão entre o sistema judicial e as pessoas que realmente precisam ser beneficiadas precisa ser resolvida.
Em resumo, para que as ações coletivas realmente cumpram seu papel, é preciso mais do que boas intenções: é necessário transformar o sistema. Investir em tecnologias automatizadas e integradas pode agilizar a localização e comunicação com os beneficiários, tornando tudo mais eficiente. Além disso, campanhas de conscientização são essenciais para garantir que todos saibam seus direitos e possam exigi-los. A simplificação dos processos, especialmente na fase de execução, é crucial para eliminar a burocracia que atrasa a resolução dos casos. Somente com essas mudanças será possível superar os obstáculos e garantir que os direitos coletivos sejam, de fato, protegidos e atendam às pessoas que mais dependem deles.
Renata Nilsson
CEO e sócia da PX Ativos Judiciais | Consultora especializada em fundos de investimentos (FIDCs) e plataformas focadas na aquisição de créditos judiciais incluindo trabalhistas, cíveis e precatórios.