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Com certeza a melhor prova, a prova suficiente para condenar ou absolver é aquela que o juízo singular ou colegiado das instâncias ordinárias diz que é.
Não importa quantas provas são trabalhadas e demonstradas pelas partes nas alegações finais ou mesmo nas razões de apelação. O juízo singular ou colegiado pode livremente escolher a prova ou provas que entender suficiente para fundamentar sua decisão.
Certo ou errado quem delimita e interpreta as provas a serem consideradas para a decisão a ser tomada é sempre o juízo singular ou colegiado das instâncias inferiores.
Por isso, o STJ sempre considera as provas delimitadas explicitamente nas decisões ordinárias como parâmetro para conhecimento dos recursos especiais.
Vem daí que o reexame da prova é permitido nos recursos especiais desde que essa prova tenha sido utilizada e valorada nas decisões ordinárias. Vale dizer, é possível e admissível pedir a revaloração da prova para o STJ, mas é inadmissível pedir para o STJ que exclua a prova escolhida e utilizada pelas instâncias ordinárias e escolha uma outra não utilizada, mas considerada melhor e suficiente pela parte recorrente.
Então, a grande jogada para vencer o óbice da súmula 7 do STJ parece ser justamente identificar as provas utilizadas e valoradas nas decisões ordinárias. Mas não é só! É preciso delimitar também a interpretação jurídica dada a essas provas pelos juízos ordinários de maneira a confrontar e comparar essas interpretações com as regras de direito probatório, bem como com o entendimento (atual) dado pelo STJ sobre a norma Federal considerada violada.
Pintado o quadro dessa maneira parece bem simples a resolução desse problema. Mas por que, na prática, essa súmula 7 obsta o seguimento da grande maioria dos recursos especiais no STJ?
Para entender um pouco o assustador poder dessa súmula é preciso primeiro ter em mente que os Tribunais de Justiça têm o objetivo principal de dificultar ao máximo o seguimento dos recursos constitucionais seja contribuindo para a redução do ingresso dos processos nos Tribunais Superiores seja para a preservação do princípio do livre convencimento motivado dos juízos ordinários.
Apesar disso, a explicação que mais vem ao caso sobre a aplicação constante da súmula 7 consiste justamente na abordagem do princípio da dialeticidade recursal.
A dialeticidade recursal está sempre, veladamente, ali no bojo da questão. Ou as questões jurídicas, e as provas a elas ligadas, não são sempre delimitadas desde as alegações finais ou são, mas o juízo singular ou colegiado as ignora.
Muitas vezes a culpa, infelizmente, é do recorrente porque não agrupou devidamente as provas à questão jurídica na escolha da tese jurídica defendida. Nesse ponto, é costume confundir-se a dialeticidade com o prequestionamento. De qualquer forma, quando se percebe a distração bem lá na frente da fase recursal, já não se pode mais levantar a questão jurídica.
Em outras ocasiões, não raras, frise-se bem, é o contrário que ocorre. Com efeito, os juízos, em nome do princípio do livre convencimento motivado, não enfrentam todas as teses jurídicas apresentadas, e as provas a elas vinculadas, ou mesmo quando analisam a tese jurídica apresentada não consideram todas as provas vinculadas à questão jurídica trabalhada.
Observa-se com isso que a dialeticidade recursal parece ser aplicada apenas para os recorrentes para impugnar as decisões. Se assim é, como o recorrente deve respeitar o princípio da dialética recursal se os juízos ordinários omitem nas decisões as provas e suas respectivas teses jurídicas levantadas nos arrazoados que precedem o futuro recurso especial?
Não são raros os casos em que os embargos de declaração tentam chamar a atenção dos julgadores para a omissão de suas teses e provas pertinentes ao caso, mas o juízo colegiado simplesmente as ignora.
Essa tática é objeto de forte suspeita de malícia do Judiciário para dificultar o seguimento dos recursos constitucionais justamente por impedir o uso da dialética recursal porque se o juízo colegiado não se manifestou sobre o objeto da impugnação não haverá o que impugnar pelo recorrente no recurso especial. E não havendo a dialeticidade recursal não há como demonstrar explicitamente no REsp que a valoração do juízo colegiado sobre a prova considerada é equivocada.
Ao perceber as complicações da constante incidência da súmula 7 do STJ em função das nuances da exigência do uso da dialética recursal, o legislador tentou resolver esse problema ao estatuir no CPC/15 a regra do art. 1.0251. Esta regra visa, de certa forma, limitar o alcance da persuasão racional dos juízos colegiados ao mesmo tempo em que permite o emprego da dialética recursal pelo recorrente na interposição futura do recurso especial.
Desta forma, afasta-se possíveis abusos dos Tribunais de Justiça ao delimitarem a extensão da fundamentação das decisões. É verdade que a palavra final ficará a cargo do STJ sobre a existência ou não das omissões, mas é uma forma inteligente que o legislador encontrou para compatibilizar os princípios da persuasão racional e da dialética recursal.
Portanto, a persuasão racional e a dialética recursal são fundamentais para a incidência ou não da súmula 7 do STJ. Tudo que é importante para a defesa dos interesses das partes deve ser lançada explicitamente de maneira abrangente e aprofundada desde as alegações finais e repetidas até as instâncias superiores. O elemento surpresa é inadmissível em qualquer procedimento em cujo sistema vige a ampla defesa, o devido processo legal e o contraditório, sob pena de não conhecimento das insurgências recursais constitucionais.
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1 Art. 1.025. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.
Antonio Oliveira Filho
Advogado Criminalista. Bacharel em direito pela UFMG. Há 20 anos exercendo a advocacia criminal. Defesa criminal em todos procedimentos comuns e especiais, com destaque para o Tribunal do Júri.