Ainda a súmula 115 do STJ: O recurso especial em agravo de instrumento   Migalhas
Categories:

Ainda a súmula 115 do STJ: O recurso especial em agravo de instrumento – Migalhas

CompartilharComentarSiga-nos noGoogle News A A

A construção do CPC/15 demorou um pouco mais de 5 anos e ocorreu paralelamente à implementação do processo eletrônico no Judiciário brasileiro, ainda que a lei permissiva fosse de 2006 – lei 11.419.

A maioria dos Tribunais passou a implementar os sistemas eletrônicos na metade da década passada, começando a transformação do processo física para eletrônico e o CPC tentou prever essa interação, com diversos itens, como a seção dos atos eletrônicos, prazos considerando estes pontos e tudo mais.

Já na esfera recursal, alguns pontos foram considerados, como o fim do preparo sobre porte e remessa, pela desnecessidade desse custeio com a remessa meramente eletrônico, por exemplo, e o texto versará sobre um desses exemplos: O agravo de instrumento e a desnecessidade de cópias obrigatórias quando o processo for eletrônico.

O agravo de instrumento é o único recurso protocolado fora do processo, longe da decisão, com uma tramitação em paralelo diretamente no Tribunal de segundo grau. Se este recurso detém essa procedimentalidade diversa e sem o processo, o relator e o colegiado necessitam de subsídios para o julgamento, com a necessidade de consultar o processo e alguns documentos que possibilitam entender a discussão da impugnação da decisão interlocutória.

Num processo físico, essa análise somente é possível com cópias específicas do processo, as quais o recorrente deve juntar ao recurso, as chamadas cópias obrigatórias. De acordo com o art. 1.017, I do CPC, os documentos obrigatórios do agravo de instrumento são: “obrigatoriamente, com cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado.”

Se o processo for físico, estes documentos possibilitam que o Tribunal consiga entender a controvérsia recursal e julgar a decisão interlocutória impugnada, mas se o processo for eletrônico – em ambos os graus – há a necessidade da juntada destas cópias? A resposta é não, até pelo teor do art. 1.017, § 5º do CPC.

Com o processo sendo eletrônico, o relator – e os demais membros do colegiado – tem acesso aos dados do processo em primeiro grau para consulta, sem necessidade de instrução do agravo de instrumento com as cópias. Não há necessidade de juntar documentos que os julgadores têm acesso facilmente pelo próprio sistema, afinal, os julgadores são do mesmo Tribunal e o acesso deve possibilitar as consultas em primeiro grau.

Diante disso, a regra das cópias obrigatórias somente vale para o processo físico e com a escassez destes, a regra passou a ser a desnecessidade das cópias obrigatórias, com a juntada somente do agravo de instrumento, justamente pela disposição do art. 1.017, § 5º do CPC.

Continua, no entanto, a possibilidade de juntar outros documentos que ajudem na compreensão do caso, que não estão no processo em si, mas que guardam pertinência com a situação recursal.

O intuito dessa dispensa é a desnecessidade do recorrente de realimentar o sistema, ao interpor o agravo de instrumento, imaginando que o relator tenha acesso ao processo em primeiro grau, o que tornaria uma duplicidade inócua fazer o upload no sistema em segundo grau, sendo que está disponível em primeiro grau.

Não há dúvidas sobre esse ponto, mas o texto versa sobre um ponto posterior: A recorribilidade do acórdão do agravo de instrumento para os Tribunais Superiores.

Julgado o agravo de instrumento, apesar de inusual, é possível que o sucumbente interponha recurso especial ou extraordinário, levando a discussão interlocutória para os Tribunais Superiores. E, evidentemente, nesse ponto, há uma relação com a dispensa dos documentos obrigatórios dispostos nos incisos do art. 1.017 do CPC e estes recursos excepcionais.

Como os autos do agravo de instrumento será a base desse recurso excepcional que tramitará no Tribunal Superiores, como o relator deste terá acesso aos documentos dispensados no Tribunal de segundo grau? Se todos os sistemas processuais eletrônicos fossem interligados, a dispensa disposta no art. 1.017, § 5º do CPC continuaria para os Tribunais Superiores, mas a realidade deve ser analisada dentro do contexto da dispensa.

A dispensa ocorre não pela desnecessidade das cópias para a análise recursal, mas pelo acesso eletrônico existente no Tribunal de origem em ambos os graus, o que leva à conclusão de que os documentos dispensados não estarão à disposição do STJ ou STF e seus julgadores.

Dessa maneira, a indagação pertinente é se os Tribunais Superiores necessitam destes documentos para julgar a questão federal ou constitucional, sendo a resposta pela desnecessidade, uma vez que somente se analisa a questão jurídica em si, não os fatos. Mas, se o recorrente – ou até o recorrido – quiser juntar os documentos que entender que melhorariam a análise recursal, não há nenhum impedimento, tanto os do rol dos obrigatórios quanto outros que entender pertinentes para a controvérsia recursal.

No entanto, há um documento que se torna indispensável: As procurações das partes.

A indagação é simples: Como os Tribunais Superiores terão a ciência de que os advogados das partes estão nas procurações, sem o exame dos atos mandatários das partes?

É justamente por isso que a dispensa dos documentos do art. 1.017, § 5º do CPC alcança os Tribunais de segundo grau em sua totalidade e, no tocante aos Tribunais Superiores, a dispensa continua, exceto sobre as procurações, as quais devem ser juntadas na interposição recursal – a do recorrente e a do recorrido.

Poderia até se entender que se o Tribunal de origem aceitou as representações, aqueles patronos seriam os detentores da representação, mas pode ser que mais advogados estejam habilitados, não somente os que assinaram as peças de segundo grau – agravo de instrumento e contrarrazões, o que importa na necessidade de ter os atos para o controle da representação, seja do presente, para as peças no Tribunal Superior, seja para o futuro, em eventuais substabelecimentos ou intervenções de advogados que já tinham poderes, mas não constavam nas peças anteriores.

É a melhor interpretação, adequando a vontade do art. 1.017, § 5º do CPC à realidade e o seu intuito, sem poder entender pela dispensa total quando há essa necessidade de controle da capacidade postulatória e representação.

O próprio STJ, pela 3ª Turma, já julgou desse modo no AgInt nos EDcl no AREsp 1.704.0461, com a dispensa das procurações somente para o Tribunal de origem sem estender aos recursos excepcionais e os recursos posteriores – como o agravo em recurso excepcional.

Todavia, se o recorrente não juntar a procuração, este deve ser intimado para a juntada em 5 dias, para a devida correção do vício, sem a possibilidade de inadmissibilidade direta, uma vez que o art. 932, parágrafo único, bem como o art. 1.029, § 3º, ambos do CPC, preconizam a necessidade da intimação do recorrente.

A inadmissibilidade somente deve ocorrer caso o recorrente não seja diligente no prazo de 5 dias, sem a juntada da cadeia de procurações do processo, sendo que o julgado acima no seu item 1 versa sobre isso na parcela em que descreve que “na hipótese em que a parte recorrente, instada a regularizar a representação processual, não a promove no prazo que para tanto lhe foi assinado. Incidência do enunciado 115 da súmula do STJ.”

O erro da decisão acima – e da reiteração pelo STJ desse entendimento – está em continuar a versar que a não correção do vício ensejaria a incidência da súmula 115 do STJ, considerando o recurso como inexistente.

Se o STJ acerta na necessidade da concessão do prazo de 5 dias, seja pelo presidente ou vice-presidente do Tribunal de origem, seja quando o recurso chega no STJ, erra sobre a inadmissibilidade ser pela súmula, sendo que esta não dialoga com correção, por ser uma construção equivocada de insanabilidade do vício da falta de procuração e a opção pela inexistência do recurso sem a juntada desta.

Como enfrentado em texto anterior, “se o recurso especial for interposto sem procuração, deve ser intimada a parte contrária para regularização em 5 dias e, posteriormente a este prazo, sem fazê-lo, o recurso deve ser não conhecido, mas sem considerar como inexistente, somente como um vício impeditivo da continuidade do procedimento recursal. Um ponto no plano da validade, não da existência.”2

Desse modo, é pertinente juntar a procuração de ambas as partes quando interpor recurso especial ou extraordinário em agravo de instrumento, se antecipando a este entendimento do STJ e com a construção clara de que não existe um acesso universal dos ministros a todos os sistemas eletrônicos, o que importa numa interpretação correta do sentido do art. 1.017, § 5º do CPC à hipótese em concreto, mantendo a sua incidência como regra e excepcionalizando neste caso.

_________

1 (AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO DO SUBSCRITOR DO AGRAVO E DO APELO ESPECIAL. INTIMAÇÃO PARA REGULARIZAÇÃO. FALHA NÃO SUPRIDA OPORTU NAMENTE. SÚMULA 115/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Interposto recurso por advogado sem procuração dos autos, dele não se pode conhecer, consoante o art. 76, § 2º, I, c/c o art. 932, parágrafo único, do CPC/2015, na hipótese em que a parte recorrente, instada a regularizar a representação processual, não a promove no prazo que para tanto lhe foi assinado. Incidência do enunciado n. 115 da Súmula do STJ. 2. A dispensa da juntada de procuração em processos eletrônicos, prevista no art. 1.017, § 5º, do CPC/2015, não se estende ao recurso especial ou ao agravo contra a sua inadmissibilidade, porquanto a aplicação do referido dispositivo é específica da classe processual “agravo de instrumento”. (.) STJ – AgInt nos EDcl no AREsp 1704046, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, J: 01/03/2021, 3ª. Turma, DJe: 03/03/2021).

2 LEMOS, Vinicius Silva. O equívoco da continuidade da súmula 115 do STJ: AgRg no AREsp 2.730.926 https://www.migalhas.com.br/depeso/425621/equivoco-da-continuidade-da-sumula-115-do-stj-agrg-no-aresp-2-730-926

Vinicius Silva Lemos

Vinicius Silva Lemos

Pós-Doutor em Processo Civil pela UERJ. Doutor em Processo Civil pela UNICAP. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF. Professor Adjunto UFAC. Conselheiro Federal pela OAB Rondônia. Advogado.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *