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Nos últimos anos, a demanda por atendimento domiciliar, conhecido como home care, cresceu significativamente no Brasil.
Esse modelo de assistência permite que pacientes recebam tratamento em casa, proporcionando maior conforto e qualidade de vida.
No entanto, muitas famílias enfrentam dificuldades quando o plano de saúde se recusa a cobrir esse tipo de atendimento.
1. O que é home care e quando ele deve ser coberto pelo plano de saúde?
O home care é um serviço médico prestado no domicílio do paciente, incluindo atendimentos de enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, administração de medicamentos e suporte multidisciplinar.
Inicialmente, quando se fala em home care, é importante diferenciar internação domiciliar e assistência domiciliar:
- Internação domiciliar: É quando o paciente precisa de cuidados contínuos equivalentes aos prestados em ambiente hospitalar, com equipe de enfermagem 24 horas, administração de medicamentos complexos e suporte médico permanente. Esse serviço deve ser coberto pelos planos de saúde quando a internação hospitalar já é garantida pelo contrato.
- Assistência domiciliar: Engloba serviços menos intensivos, como visitas esporádicas de profissionais de saúde e suporte terapêutico, não sendo equiparada à internação hospitalar e, por isso, pode não estar incluída nos contratos.
A cobertura desse serviço por parte dos planos de saúde depende do contrato firmado e da recomendação médica.
A RN 465/21 da ANS estabelece que os planos de saúde devem cobrir internação domiciliar quando essa modalidade for indicada pelo médico responsável pelo paciente, desde que haja cobertura para a internação hospitalar no contrato do beneficiário.
O art. 13 da RN 465/21 da ANS determina que, caso a operadora ofereça a internação domiciliar em substituição à hospitalar, deve obedecer às exigências previstas nos normativos vigentes da Anvisa e nas alíneas “c”, “d”, “e” e “g” do inciso II do art. 12 da lei 9.656/1998.
O Parágrafo único desse artigo reforça que, nos casos em que a atenção domiciliar não substitui a internação hospitalar, deve haver previsão contratual ou negociação entre as partes.
A RDC 11/06 da Anvisa também define regras para os serviços de atenção domiciliar, garantindo que o atendimento domiciliar cumpra critérios de segurança e qualidade no cuidado ao paciente.
- Art. 3º: Define “Atenção Domiciliar” como um termo genérico que envolve ações de promoção à saúde, prevenção, tratamento de doenças e reabilitação desenvolvidas em domicílio.
- Art. 4º: Estabelece que os serviços de atenção domiciliar devem garantir a continuidade da assistência, conforme as necessidades do paciente.
Embora essa RDC não obrigue os planos de saúde a cobrirem o home care, estabelece padrões de qualidade para os serviços domiciliares.
Lei 9.656/1998 regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde disciplina que, em seu art. 12, inciso II, nos planos de segmentação hospitalar, é obrigatória a cobertura de internação hospitalar, sem limite de prazo, em unidade de terapia intensiva ou similar, quando necessária. Embora não mencione diretamente a internação domiciliar, a jurisprudência tem interpretado que, havendo indicação médica, a internação domiciliar pode ser uma extensão da internação hospitalar, devendo ser coberta pelo plano.
O CDC (lei 8.078/1990) assegura direitos básicos aos consumidores disciplina:
- Art. 6º, inciso I: Garante a proteção da vida, saúde e segurança contra riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços.
- Art. 6º, inciso IV: Assegura a proteção contra práticas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços.
O parecer técnico 05/GCITS/GGRAS/DIPRO/2024 da ANS esclarece que se a operadora oferecer a internação domiciliar em substituição a internação hospitalar, com ou sem previsão contratual, dever obedecer às exigências previstas nos normativos vigentes da Anvisa, bem como garantir todas as coberturas previstas para internação hospitalar só que em casa.
Diante do exposto, embora não haja uma determinação legal específica que obrigue os planos de saúde a cobrirem o home care, a combinação das normas acima e a interpretação jurisprudencial indicam que, havendo indicação médica e necessidade de continuidade do tratamento, a cobertura deve ser garantida.
2. A recusa do plano de saúde é legal?
Muitos planos de saúde alegam que o home care não está previsto no contrato ou que se trata de um serviço extra-hospitalar, utilizando esses argumentos para negar a cobertura.
No entanto, a lei dos planos de saúde (lei 9.656/98) e o CDC protegem o beneficiário contra negativas abusivas.
Além disso, a jurisprudência tem se consolidado no sentido de que, se a internação hospitalar é coberta pelo plano, o tratamento domiciliar deve ser garantido quando houver recomendação médica e viabilidade clínica.
3. Jurisprudência atualizada
O STJ já decidiu que, quando há indicação médica, o plano de saúde deve arcar com o tratamento, principalmente se o contrato prevê internação hospitalar. Isso ocorre porque a substituição da internação tradicional pelo home care não pode ser utilizada como justificativa para negativa de cobertura.
Decisões recentes reforçam o direito dos beneficiários à cobertura do home care:
- STJ – REsp 1.733.013/SP: O Tribunal reafirmou que, havendo indicação médica e previsão contratual para internação hospitalar, o plano de saúde deve custear o home care como substituto adequado.
- TJ/SP – apelação cível 101XXXX-94.2022.8.26.0100: Determinou que a negativa de home care foi abusiva, uma vez que o contrato cobria internação e o relatório médico indicava a necessidade de internação domiciliar.
- TJ/PR – agravo de instrumento 003XXXX-92.2023.8.16.0000: Concedeu liminar obrigando a operadora a custear a internação domiciliar de paciente em estado grave.
4. O que fazer diante da recusa do plano de saúde?
Se o seu plano de saúde negou a cobertura do home care, siga os seguintes passos:
5. Dúvidas frequentes quando se fala em home care e plano de saúde
- O plano de saúde é obrigado a cobrir um cuidador domiciliar?
Não há obrigatoriedade de cobertura de cuidador, sendo esse um membro da família ou alguém contratado por ela.
- Quais doenças são cobertas pelo home care?
Não é a doença em si que assegura a cobertura de home care, mas a necessidade de cuidado do paciente, sua dependência quanto a terceiros somado à indicação médica. Geralmente, doenças crônicas, neurológicas, degenerativas, pós-AVC, câncer e condições que exigem internação prolongada são elegíveis para home care, conforme indicação médica.
- É necessária pontuação via tabela NEAD para conseguir o home care?
A tabela NEAD é um instrumento utilizado para avaliar a necessidade de internação domiciliar. Dependendo da pontuação, a cobertura pode ser garantida.
- O plano de saúde pode exigir que o paciente tente outros tratamentos antes de conceder o home care?
Algumas operadoras impõem essa exigência, mas se houver indicação médica clara para home care imediato, a negativa pode ser contestada judicialmente.
- Os planos de saúde cobrem equipamentos médicos para o home care?
Sim, se o contrato incluir cobertura para internação hospitalar e os equipamentos forem necessários ao tratamento, como oxigênio, cama hospitalar e ventiladores mecânicos.
Conclusão
A recusa de cobertura de home care pelos planos de saúde pode ser considerada prática abusiva, especialmente quando há indicação médica para o tratamento.
A legislação e os tribunais têm assegurado o direito dos pacientes a esse tipo de assistência, garantindo dignidade e continuidade dos cuidados médicos.
A defesa dos seus direitos pode garantir o atendimento adequado e evitar complicações na sua saúde ou de seus familiares.
Aline Vasconcelos
Advogada especialista em Saúde Suplementar, com atuação há 15 anos em assessorias de empresas e na defesa de beneficiários em questões relacionadas a planos de saúde.