O Tema 1.184 e o papel das procuradorias   Migalhas
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O Tema 1.184 e o papel das procuradorias – Migalhas

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Como se sabe, os tributos são receitas derivadas nas quais o Estado exerce seu poder de império sobre o patrimônio do particular a fim de alavancar recursos financeiros, principalmente para o custeio de serviços públicos básicos.

A compulsoriedade, característica marcante dos tributos, determina que todos nós – salvo exceções previstas de forma expressa no texto da CF/88 e na lei – pagaremos tributos em algum momento de nossas vidas.

Aliás, o jargão popular, “neste País até depois de morto se paga impostos”, vem a calhar, pois nos remete à inevitável conclusão de que a arrecadação tributária, mormente em países emergentes como o Brasil, é mesmo a grande fonte de receita do Estado. Isso, inclusive, nos coloca no “seleto” grupo dos países com uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo.

Tanto é assim que em 2014 a CNM – Confederação Nacional de Municípios1 fez um importante levantamento a respeito e concluiu que:

“Entre os países latino-americanos, o Brasil tem a segunda maior carga tributária, está atrás apenas da Argentina. A informação é de relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado nesta segunda-feira, 20 de janeiro. Os impostos pagos pelos brasileiros equivalente ao ano a 36,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. A Argentina, primeiro lugar no ranking, cobra de tributos 37,3% do PIB local.

A carga tributária no Brasil tem crescido desde 2010. No entanto, segundo a Organização, a média brasileira está abaixo da registrada nos 34 países que compõem a OCDE: que é de 34,6%. A média da América Latina é de 20,7%. Neste continente, os países com a menor carga tributária são Guatemala, com 12,3%; República Dominicana, 13,5% e Venezuela, 13,7% do PIB. O estudo analisou 18 dos 21 países latino-americanos, com dados de 2012.

Quando os países analisados são os que fazem parte da OCDE, a maior carga tributária é a da Dinamarca: 48% do PIB.”

De lá pra cá não se pode dizer que a situação melhorou. A própria “Reforma Tributária” (EC 132/23), que num primeiro momento surgiu como um remédio para a redução da carga tributária no Brasil, em verdade, pode ser a trilha perfeita que levará o país a ter o maior imposto do mundo, o IVA/DUAL, algo entorno de 28%2.

Entretanto, se parece impossível frear o apetite arrecadatório do Estado, pelo menos a mudança de paradigma acerca da forma de cobrança de tributos deve sempre permear o debate. E essa mudança veio, apesar de imposta!

Não é novidade que a cobrança do crédito de natureza tributária e não tributária sempre esteve ligada à ideia de litígio, pois se de um lado o fisco necessita arrecadar, de outro o contribuinte resiste a pagar.

Assim, o legislador ordinário se viu obrigado a criar um mecanismo de cobrança mais célere e efetivo que aqueles oriundos da chamada execução extrajudicial comum do CPC.

Surge então a conhecidíssima lei 6.830, de 1980, que apesar de promulgada ainda sob a égide da Constituição anterior, foi mantida sob o manto da CF/88.

Trata-se de um diploma legal com 42 artigos que objetivou regular todo o procedimento de cobrança judicial do crédito tributário e não tributário, garantindo-se à Fazenda Pública diversas prerrogativas não extensíveis ao particular, o que coloca o fisco numa posição processual privilegiada.

Lembre-se que, diferentemente do que ocorre na execução comum, na execução fiscal o devedor é citado para, no prazo de 5 dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na certidão de dívida ativa, ou garantir a execução, só podendo embargá-la após prévia garantia do juízo, nos termos dos arts. 8°, caput, e 16, §1º, da LEF, o que evidencia a supremacia processual da Fazenda Pública segundo o rito da lei 6.830/1980.

Parecia a receita perfeita para o sucesso da cobrança judicial de créditos dessa natureza. Todavia, não foi o que ocorreu na prática, principalmente sob a ótica da economia, calcada no clássico binômio custo x benefício, isto é, deve-se fazer mais com o menor dispêndio de recursos possível.

Não por acaso, o CNJ3 realizou um estudo nos idos de 2011 a fim de demonstrar o baixo índice de retorno (custo x benefício) na cobrança do crédito tributário e não tributário adotado pela lei de execução fiscal.

Como se nota, na teoria, o procedimento previsto na lei de execução fiscal era um modelo à frente do seu tempo, mas, na prática, se revelava contraproducente, pouco efetivo e contrário à duração razoável do processo.

Porém, diante da indisponibilidade do interesse público e do temor da administração tributária em incorrer em indevida renúncia de receita, só restava ao fisco acionar o Poder Judiciário para cobrar qualquer valor, ressalvado o cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança (inciso II do §3º do art. 14 da LC 101/00). Sucede que o cenário se alterou em 2024, pois o STF, em homenagem aos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, proferiu o paradigmático RE 1355208 (Tema 1.184), que restou assim ementado:

“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. EXTINÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL DE BAIXO VALOR POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR: POSTERIOR AO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 591.033 (TEMA N. 109). INEXISTÊNCIA DE DESOBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS FEDERATIVO E DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. FUNDAMENTOS EXPOSTOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA TESE DO TEMA N. 109 DA REPERCUSSÃO GERAL: INAPLICABILIDADE PELA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA QUE POSSIBILITOU PROTESTO DAS CERTIDÕES DA DÍVIDA ATIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

1. Ao se extinguir a execução fiscal de pequeno valor com base em legislação de ente federado diverso do exequente, mas com fundamento em súmula do Tribunal catarinense e do Conselho da Magistratura de Santa Catarina e na alteração legislativa que possibilitou protesto de certidões da dívida ativa, respeitou-se o princípio da eficiência administrativa.

2. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem nortear as práticas administrativas e financeiras na busca do atendimento do interesse público. Gastos de recursos públicos vultosos para obtenção de cobranças de pequeno valor são desproporcionais e sem razão jurídica válida.

3. O acolhimento de outros meios de satisfação de créditos do ente público é previsto na legislação vigente, podendo a pessoa federada valer-se de meios administrativos para obter a satisfação do que lhe é devido.

4. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento com proposta da seguinte tese com repercussão geral: “É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor, pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio da eficiência administrativa” (g.n)(RE 1355208, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 19-12-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-04-2024 PUBLIC 02-04-2024)

Isso quer dizer que a Corte Suprema chancelou a tese de que, antes da Fazenda Pública se arvorar na via judicial para a cobrança do crédito de baixo valor, deve ela tentar outros meios alternativos, sob pena de extinção das execuções fiscais por falta de interesse de agir.

Não demorou muito para que tal decisão afetasse de forma direta e surpreendente as Fazendas Públicas, em especial os pequenos e médios municípios, cujos créditos tributários e não tributários são justamente os de pequeno valor, cada qual com as suas particularidades.

Mas, afinal, qual a relevância do Tema 1.184 para os municípios?

Da leitura atenta do texto da ementa acima reproduzida é possível concluir que o Poder Judiciário, atualmente, pode extinguir execuções fiscais de baixo valor.

Contudo, nem sempre foi assim. O Tema 109 do STF não admitia que lei estadual autorizadora da não inscrição em dívida ativa e do não ajuizamento de débitos de pequeno valor fosse aplicada a município, e, consequentemente, não poderia servir de base para a extinção das execuções fiscais promovidas pelo ente local, sob pena de vulneração à sua competência tributária.

Além disso, segundo o mencionado Tema, negar ao município a possibilidade de executar seus créditos de pequena monta sob o fundamento da falta de interesse econômico violaria o art. 5º, XXXV, da CF/88.

Lembra-se que, embora a doutrina majoritária reconheça uma distinção entre os Temas 109 e 1.184, fato é que desde 17/11/104, data do reconhecimento da repercussão geral, ou seja, há pelo menos 14 anos atrás, o Tema 109 prevaleceu e amparou as execuções fiscais de pequeno valor nos municípios.

Tal análise, contudo, é demasiadamente relativa e depende, sobretudo, do ponto de vista da questão, pois é sabido que uma execução fiscal aparentemente de acanhada monta para o município de Belo Horizonte pode não ser diminuta (na verdade não é) para um pequeno município nos rincões do Estado do Amazonas.

Acontece que na época em que o STF definiu o Tema 109, a Fazenda Pública só tinha ao seu alcance o ajuizamento da execução fiscal como meio de forçar o pagamento da dívida.

No entanto, em 2012, foi editada a lei Federal 12.767, que incluiu o parágrafo único no art. 1º da lei 9.492/1997, a fim de permitir, expressamente, o protesto das certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas5.

De fato, trata-se de uma das mais eficientes formas de solução extrajudicial de conflitos tributários, pois tal ato solene gera um abalo no crédito do devedor, forçando-o ao cumprimento da obrigação tributária sem que o fisco tenha que acionar a justiça.

Mas, frisa-se, não só o protesto da CDA justifica o não ajuizamento da execução fiscal, pois há outros meios extrajudiciais à disposição do fisco para resolver a controvérsia, a exemplo da criação de câmaras de conciliação, a regulamentação da transação e do parcelamento, o REFIS, dentre outros.

Nesta linha de raciocínio, o STF entendeu que era chegada hora de revisar a jurisprudência firmada em 2010 no RE 591.033 (Tema 109). O pano de fundo da mencionada revisão está no fato de que o valor mínimo do débito para justificar a mobilização da Justiça deve ser razoável e proporcional.

E nada mais razoável e desproporcional que o acionamento do Poder Judiciário para a cobrança de um pequeno valor que poderia, em tese, ser adimplido por meios extrajudiciais de cobrança.

Fica claro, portanto, que, no que se refere ao crédito tributário e não tributário de baixo valor, o Poder Judiciário é a última porta a se bater.

Desta feita, o Tema 1.184 estabeleceu que previamente ao ajuizamento da execução fiscal, a Fazenda Pública deverá: a) tentar a conciliação ou adoção de solução administrativa; e b) fazer o protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida. Esses requisitos são cumulativos e obrigatórios, isto é, somente se essas providências não tiverem êxito é que deverá ser proposta a execução fiscal.

Pois bem. Após o julgamento do Tema 1.184, o CNJ editou a resolução 547 de 22/2/24 para regulamentar a aplicação desse precedente, exemplificando o que seria a “tentativa de conciliação”, que pode ser satisfeita mediante a existência de lei geral de parcelamento ou oferecimento de algum tipo de vantagem na via administrativa, bem como detalhando em que hipóteses poderia ser dispensada a apresentação do prévio protesto6.

Em alguns Estados, o Poder Judiciário, dispondo a respeito da aplicação do Tema 1.184 da repercussão geral e da resolução 547 do CNJ, optou por fixar um teto e extinguir em massa execuções fiscais de pequeno valor com alto potencial de insucesso, seja pela não localização do devedor, seja pela inexistência de bens penhoráveis.

Cite-se, por exemplo, o TJ/SP, que publicou o provimento CSM 2.738/24 dispondo sobre as execuções fiscais que tramitam em 1º e 2º graus, veja:

“(…)

CONSIDERANDO que, em fevereiro último, se encontravam na 1ª instância 3.819.113 execuções fiscais com valor menor do que R$ 10.000,00, sem movimentação há um ano e sem registro de A.R. positivo juntado,

(…)

Artigo 5º – As execuções fiscais que se enquadrem nas hipóteses do Tema 1.184 e da Resolução nº 547 poderão ser extintas por lote, conforme dispõem os artigos 295 e 314 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, e o recurso interposto será julgado por lista em 2º grau, vedada impugnação individualizada nos autos originais.” (g.n)

Cabe aqui uma reflexão: ressalvada o posicionamento pessoal do autor acerca do provimento CSM 2.738/24, o que demandaria um alargamento deste estudo, uma vez que a questão passaria por temas como separação de poderes, ativismo judicial, autonomia dos entes federados, dentre outros, e não é este o propósito do presente artigo, fato é que o Tema 1.184 impulsionou a advocacia pública, em especial a municipal, para um lugar ainda mais de destaque na gestão e na cobrança da dívida ativa.

Não seria nenhum exagero afirmar que a advocacia pública é a principal destinatária do Tema 1.184 da repercussão geral e da resolução 547 do CNJ, o que, aliás, traz enormes responsabilidades, pois cabe aos procuradores de carreira a árdua tarefa de qualificar e tornar eficiente a cobrança do crédito tributário e não tributário na esfera administrativa.

De toda forma, não há mais espaço tampouco tempo para evasivas ou mesmo explicações desconectadas da realidade, já que, como dito acima, o modelo idealizado pela lei Federal 6.830/1980 não mais se coaduna com as práticas modernas e eficazes de cobrança, o que evidencia a necessidade de ruptura com protótipos ultrapassados e obsoletos, abrindo portas para uma advocacia pública disruptiva, conciliadora e focada nos fins e não simplesmente nos meios.

Mas fica o alerta: se há necessidade de substituição do ambiente de cobrança, o mesmo não se pode dizer da devida e obrigatória ingerência da advocacia pública em todo o processo.

Ora, não há falar em mudança de paradigma no processo de cobrança sem a necessária e imprescindível participação efetiva da advocacia pública.

Até porque, não restam dúvidas de que o Tema 1.184 da repercussão geral apenas deslocou a cobrança do ambiente judicial para o extrajudicial, ficando inalterada a competência dos procuradores de carreira de inscrever o crédito em dívida ativa e de promover a sua cobrança.

Tal afirmação está intimamente ligada ao fato de que incumbe aos procuradores o exercício do controle de legalidade dos créditos tributários e não tributários encaminhados para inscrição em dívida ativa ou que se achem em cobrança.

A título de exemplo, o art. 1º, do regimento interno da PGFN7, veja:

“Art. 1º À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, técnica e juridicamente subordinada ao Advogado Geral da União e administrativamente ao Ministro de Estado da Fazenda, compete:

I – apurar a liquidez e certeza dos créditos tributários ou de qualquer outra natureza e inscrevê-los na dívida ativa, para fins de cobrança, amigável ou judicial;

II – exercer o controle de legalidade dos créditos tributários ou de qualquer outra natureza, encaminhados para inscrição em dívida ativa, ou que se achem em cobrança, podendo reconhecer de ofício a prescrição e a decadência, dentre outras causas de extinção do crédito;

III – representar privativamente, judicial ou extrajudicialmente, a União, na execução de sua dívida ativa;”

Nesta mesma linha, a legislação da PGM/SP8. Confira-se:

“Art. 2º A Procuradoria-Geral do Município de São Paulo, órgão jurídico de caráter permanente, vinculado diretamente ao Prefeito, que desenvolve atividades típicas e exclusivas de Estado e que se insere nas funções essenciais à Justiça, nos termos do Capítulo IV, Seção II, da Constituição Federal, tem por competência o exercício de atividades de assessoramento jurídico do Poder Executivo, o processamento de feitos disciplinares e, privativamente, a consultoria jurídica e a representação judicial do Município, a inscrição e a cobrança judicial e extrajudicial da dívida ativa e o processamento de feitos relativos ao patrimônio imóvel municipal, além de outras atribuições compatíveis com a natureza de suas funções ou correlatas com a sua área de atuação.(Redação dada pela Lei nº 18.038/2023)

Parágrafo único. A Procuradoria-Geral do Município poderá celebrar contratos, convênios ou instrumentos congêneres com entidades públicas ou privadas para auxílio técnico operacional na cobrança extrajudicial da dívida ativa, conforme disposto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 18.038/2023)”

No particular, peço venia para transcrever abaixo trecho de importante artigo escrito em conjunto pela ilustre procuradora de Porto Alegre e ex-presidente da ANPM – Associação Nacional dos Procuradores Municipais, doutora Cristiane Nery, e pela multicitada procuradora do Estado do Rio de Janeiro, doutora Júlia Carneiro, acerca do tema9, senão vejamos:

“(…)

O primeiro ponto recai sobre a competência para inscrição de créditos tributários em dívida ativa e o prévio controle de legalidade.

Não é de hoje que a inscrição em dívida ativa é atribuída aos procuradores. Em 1988, essa competência exclusiva foi inserida expressamente na Constituição para a PGFN (art. 131, § 3º) 1, estendendo-se às procuradorias estaduais e do DF por força do art. 132 2, dispositivo que também é inteiramente aplicável às procuradorias municipais 3.

A competência atribuída às procuradorias para inscrição em dívida ativa tem sua razão de ser na essencial função de controle da legalidade. A CDA emitida após a inscrição do crédito tem força de título executivo, o que impõe que sua formação esteja legalmente adequada, mediante o ato jurídico de controle de legalidade. Em verdade, está-se diante de atividade de auto saneamento ou autocontrole administrativo que visa preservar, além da legalidade dos atos, o direito do contribuinte de ser cobrado por título constituído de acordo com o arcabouço normativo vigente 4.

Assim, ao promover a inscrição, é dever da procuradoria garantir a presença dos requisitos formais e substanciais de validade do crédito, como exige a LEF (art. 2º, § 3º), assegurando, por exemplo, a ausência de causa de suspensão de exigibilidade vigente ou de prescrição da pretensão executória.”

E se é verdade que compete às procuradorias a inscrição do crédito em dívida ativa para posterior cobrança extrajudicial ou judicial, nada mais óbvio e eficiente que aquela se concentrasse no órgão jurídico.

Em última análise, preservar-se-ia o princípio da segregação de funções na seara tributária, já que o agente responsável pelo lançamento não poderá ser aquele que efetuará o controle de legalidade e a cobrança.

No ponto, as supramencionadas Procuradoras são cirúrgicas, veja:

“(…)

Sendo ato de controle de legalidade, sem dúvida cabe ao órgão jurídico incumbido de tal competência. E aqui é salutar que se observe a segmentação ou segregação de funções: o órgão competente pelo lançamento tributário não deve ser o mesmo a realizar o controle de legalidade do próprio ato.

Esse segundo olhar realizado pelo órgão jurídico, distante do olhar da autoridade lançadora, objetiva resguardar os contribuintes contra cobranças indevidas. Na década de 80, Geraldo Ataliba e Cleber Giardino já destacavam, ao exaltarem a importância do controle de legalidade pelas procuradorias, que “os órgãos jurídicos encarregados da inscrição da dívida não desenvolvem mera tarefa burocrática ou mecânica, mas, sim, relevantes funções técnico-jurídicas” 6. Trata-se de passo imprescindível para a validade da cobrança e observância ao devido processo legal.”

Não é outro o entendimento do col. TCU a respeito, eis que:

“1.7.1. … consiste na separação de funções de autorização, aprovação, execução, controle e contabilização das operações, evitando o acúmulo de funções por parte de um mesmo servidor.” (Acórdão nº 5.615/2008-TCU-2ª Câmara)

“1.6 … permitir que um mesmo servidor execute todas as etapas da despesa, isto é as funções de autorização, aprovação de operações, execução, controle e contabilização.” (Acórdão nº 3.031/2008-TCU-1ª Câmara)

Nada obstante, é de suma importância exortar o trabalho desempenhado pela lançadoria e seus servidores (secretários de fazenda, auditores fiscais, fiscais de tributos etc.), qual seja, aquele que ocorre antes da inscrição do crédito em dívida ativa para posterior cobrança pela procuradoria.

É preciso que o gestor qualifique e valorize ainda mais esses servidores, garantindo-lhes estrutura de trabalho, de carreira, e de remuneração, pois lidam diariamente com a principal fonte de receita dos municípios, os tributos.

Deve se ter em mente que somente a soma dos esforços entre todos aqueles que atuam na cobrança da dívida ativa, em especial Secretarias de Fazenda e Procuradorias, é que levará a uma arrecadação eficiente, que por sua vez beneficiará toda a coletividade.

Nem de longe deve se cogitar de uma cobrança administrativa sem uma forte integração entre Secretarias de Fazenda e Procuradorias, sob pena de desarranjo institucional e queda de arrecadação.

Contudo, é extremamente importante que os Poderes constituídos garantam que a advocacia pública assuma esse papel de destaque na cobrança administrativa do crédito público, contribuindo de forma legítima na busca incansável pela justiça fiscal.

____________

1https://cnm.org.br/comunicacao/noticias/brasil-tem-a-segunda-maior-carga-tribut%C3%A1ria-da-am%C3%A9rica-latina – 19/02/2025.

2 https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/o-caminho-que-vai-levar-o-brasil-a-ter-o-maior-imposto-do-mundo/ – Pesquisado em 19/02/2024.

3 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/02/e42aabc7cb876c670096042fe52af676.pdf

4 STF. Plenário. RE 591033, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 17/11/2010 (Repercussão Geral – Tema 109)

5 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Poder Judiciário pode extinguir execução fiscal cujo valor seja baixo, quando verificar a falta de interesse de agir, caracterizada pelo não exaurimento de medidas extrajudiciais e administrativas mais eficientes e menos onerosas capazes de viabilizar a cobrança da dívida. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 21/02/2025

6 https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5455

7 https://www.gov.br/pgfn/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/competencia/base-juridica-da-estrutura-organizacional-e-competencias-da-pgfn/ripgfn-regimento-interno-da-pgfn – Pesquisado em 20/02/2025.

8 https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-10182-de-30-de-outubro-de-1986/consolidado – Pesquisado em 20/02/2025.

9 https://anpm.com.br/voz-do-associado/divida-ativa-controle-de-legalidade-e-reforma-tributaria – Pesquisado em 06/03/2025.

Thiago Resende Lima Castro e Barbosa

Thiago Resende Lima Castro e Barbosa

Formado em Direito pela Faculdade Milton Campos, 2010. Especialista em Direito Empresarial pelo IEC/PUC Minas, 2014. Advogado e Procurador Municipal.

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