O IVA dual e a definição do conceito de serviço por lei complementar   Migalhas
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O IVA dual e a definição do conceito de serviço por lei complementar – Migalhas

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Com a promulgação da EC 132, os dispositivos que estavam em discussão no Congresso Nacional tornaram-se definitivos e, assim, já é possível analisar o alcance e o impacto de algumas das mudanças aprovadas.

Um desses dispositivos é o artigo 156-A, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que prevê que a lei complementar poderá estabelecer o conceito de operações com serviços, incluindo o seu conteúdo e alcance, admitida essa definição para qualquer operação que não seja classificada como operação com bens materiais, imateriais ou direitos.

Portanto, no presente texto, analisaremos a importância e a função da regra que prevê a possibilidade de a lei complementar definir o conceito de serviço como mecanismo para implementação do IVA dual nos termos propostos.

O IVA dual, idealizado pela PEC 45, tem como características principais base ampla e neutralidade tributária, esta que é alcançada pela não cumulatividade dos tributos. Portanto, a regra é que todas as atividades econômicas remuneradas sejam tributadas, permitindo o aproveitamento de créditos do IVA e tributando-se apenas o valor agregado.

No entanto, não é novidade que o mundo está em constante atualização e que a legislação deve acompanhar a evolução das relações jurídicas praticadas pela sociedade.

Assim, muito embora os conceitos de “bens”, “direitos” e “serviços”, nos termos em que hoje são conhecidos, sejam suficientes para alcançar a tributação de todas as atividades econômicas, é possível que, em alguns anos, essa realidade mude.

Foi justamente em razão da possibilidade de evolução das atividades econômicas desenvolvidas atualmente e da experiência vivida no Brasil nas últimas décadas que o legislador constitucional derivado incluiu, no artigo 156-A, da Constituição Federal, o parágrafo 8º, que prevê a faculdade de o legislador complementar estabelecer o conceito de “operações com serviços”, incluídos o seu conteúdo e alcance, “admitida essa definição para qualquer operação que não seja classificada como operação com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos”.

Como se vê, não há qualquer previsão autorizando a lei complementar a estabelecer os conceitos de “bens materiais”, “bens imateriais” ou “direitos”. Há, apenas, o conceito de “serviço”, exclusivamente para que essa definição alcance toda e qualquer operação que não se enquadre no conceito de “bens” e “direitos”.

A redação do artigo 156-A, parágrafo 8º, da Constituição Federal é clara no sentido de que a lei complementar “poderá” – e não “deverá” – estabelecer o conceito de operações com serviços. Em outras palavras, esse é um mecanismo que está previsto na Constituição Federal, à disposição do legislador complementar para, se e quando necessário for, estabelecer o conceito de “operações com serviços” e alcançar eventuais novas atividades econômicas que não se enquadrem nos conceitos de “bens”, “direitos” e “serviços” como conhecidos nos dias de hoje.

Inclusive, este recurso já foi utilizado em outras ocasiões. A título exemplificativo, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 233/08, de autoria do ex-deputado federal Sandro Mabel, que também buscou a implementação de um IVA Federal que incidiria sobre operações com bens e serviços, previa expressamente que o artigo 153, parágrafo 7º, da Constituição Federal definiria “prestação de serviço” como “toda e qualquer operação que não constitua circulação ou transmissão de bens”1.

Em outras palavras, o texto da PEC 233/08 previu mecanismo parecido que poderia ser utilizado pelo legislador infraconstitucional para classificar como serviço toda e qualquer operação que não fosse considerada circulação ou transmissão de bens, garantindo a base ampla do IVA Federal.

Outro exemplo disso é a previsão do próprio artigo 156, inciso III, da Constituição Federal, que criou o ISS e prevê que o imposto municipal deverá incidir sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência do ICMS, “definidos em lei complementar”. Mais uma vez, a Constituição Federal deu ao legislador complementar a faculdade de definir o conceito de serviço para fins exclusivos da incidência do ISS.

Tanto é assim que este mecanismo foi utilizado pelo próprio Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamentos históricos sobre a interpretação do conceito de “serviço”. Ao julgar o RE 651.703 e reconhecer a incidência do ISS sobre serviços de planos de saúde, o STF entendeu que o imposto municipal não estaria vinculado a obrigações de fazer, mas, sim, a uma interpretação mais ampla, respaldada na economia e que daria ao ISS competência para tributar pelo imposto municipal as operações não alcançadas pelo ICMS.

De forma semelhante, ao julgar os REs 547.245 e 592.905 e reconhecer a incidência do ISS sobre operações de leasing e leaseback, o STF afastou a aplicação do entendimento de que o ISS seria aplicável apenas a obrigações de fazer, para reconhecer a tributação pelo imposto de atividades que não se enquadram em outras espécies tributárias.

Assim, o legislador constitucional derivado buscou criar mecanismo semelhante ao que já vemos na prática nos dias de hoje para que o conceito de “serviço” alcance a tributação de novas atividades que eventualmente venham a surgir e que não se enquadrem na definição atual de bens materiais, imateriais, inclusive direitos ou serviços.

Portanto, entendemos que a Emenda Constitucional 132 buscou introduzir comando com o objetivo de garantir a implementação do IVA dual nos termos em que idealizado pelo legislador constitucional derivado, ou seja, de um tributo de bases amplas, que visa a alcançar as mais importantes atividades econômicas realizadas pela sociedade, ainda que, no futuro, essas atividades possam se desenvolver ou se transformar, não mais se enquadrando à perfeição nos conceitos jurídicos que temos hoje para “bens”, “direitos” e “serviços”.

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1 Texto da PEC nº 233/2018 disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=540729&filename=PEC%20233/2008.

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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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Luiz Roberto Peroba Barbosa

Luiz Roberto Peroba Barbosa

Advogado e sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.

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Marco Aurelio Louzinha Betoni

Associado da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.

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