Partilha de imóvel financiado no divórcio   Migalhas
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A partilha de bens é um dos aspectos mais complexos e delicados de um divórcio, especialmente quando envolve um imóvel financiado. Vamos esclarecer como funciona a divisão de um imóvel que ainda está sendo pago, utilizando exemplos numéricos e analogias para facilitar a compreensão.

Quando um casal decide se divorciar, todos os bens adquiridos durante o casamento devem ser divididos conforme o regime de bens escolhido. No caso de um imóvel financiado, a situação se torna mais complexa, pois o bem ainda não está totalmente quitado. A partilha deve considerar tanto o valor já pago quanto o saldo devedor.

Antes de entrar nos detalhes da partilha, é importante entender os diferentes regimes de bens e como eles influenciam a divisão:

  • Comunhão parcial de bens: Todos os bens adquiridos durante o casamento são divididos igualmente, exceto os bens adquiridos antes do casamento ou por herança/doação.
  • Comunhão universal de bens: Todos os bens, adquiridos antes e durante o casamento, são divididos igualmente.
  • Separação total de bens: Cada cônjuge mantém a propriedade exclusiva dos bens adquiridos antes e durante o casamento.

Exemplo prático de partilha de imóvel financiado

Vamos considerar um exemplo prático para ilustrar como funciona a partilha de um imóvel financiado.

Situação:

  • Imóvel adquirido durante o casamento por R$ 500.000,00.
  • Valor total financiado: R$ 400.000,00.
  • Valor pago até o momento do divórcio: R$ 200.000,00.
  • Saldo devedor: R$ 200.000,00.

Comunhão parcial de bens:

  • Valor pago: O valor já pago (R$ 200.000,00) é dividido igualmente entre os cônjuges. Cada um tem direito a R$ 100.000,00, ou seja, a 20% do imóvel.
  • Saldo devedor: O saldo devedor (R$ 200.000,00) também deve ser considerado. Se um dos cônjuges decidir ficar com o imóvel, ele assume a responsabilidade pelo saldo devedor, mas deve compensar o outro cônjuge pela metade do valor já pago.
  • Exemplo de compensação:

    • Cônjuge A decide ficar com o imóvel.
    • Cônjuge A assume o saldo devedor de R$ 200.000,00.
    • Cônjuge A deve pagar ao Cônjuge B o equivalente a 20% do valor de mercado do imóvel. Suponhamos que o imóvel tenha sido valorizado e no momento divórcio valha R$ 700.000,00. Portanto, O cônjuge A terá que pagar ao cônjuge B 20% de R$ 700.000,00, ou seja, R$ 140.000,00.

    Vamos usar uma analogia para tornar o conceito mais claro. Imagine que o imóvel é uma pizza de 8 fatias, e o financiamento é o custo dessa pizza.

    • Valor Total da Pizza: R$ 500.000,00 (8 fatias).
    • Valor Financiado: R$ 400.000,00 (6,4 fatias).
    • Valor Pago: R$ 200.000,00 (3,2 fatias).
    • Saldo Devedor: R$ 200.000,00 (3,2 fatias).

    No momento do divórcio, o casal já pagou 3,2 fatias da pizza. Cada cônjuge tem direito a 1,6 fatias (R$ 100.000,00). Se um dos cônjuges quiser ficar com a pizza inteira, ele deve pagar ao outro cônjuge o valor correspondente a 1,6 fatias (considerando o valor de mercado do imóvel)) e assumir o pagamento das 3,2 fatias restantes (que é o saldo devedor).

    Hipóteses nas quais o valor pago de entrada não deve ser partilhado

    Existem situações específicas em que o valor pago de entrada no financiamento do imóvel não deve ser partilhado. Essas hipóteses geralmente envolvem a origem dos recursos utilizados para o pagamento da entrada. Vamos explorar algumas dessas situações:

    1. Bens adquiridos antes do casamento:

    • Se o valor da entrada foi pago com recursos provenientes de bens adquiridos antes do casamento, esse valor não deve ser partilhado. Por exemplo, se um dos cônjuges vendeu um imóvel que possuía antes do casamento e utilizou o dinheiro para pagar a entrada do novo imóvel, esse valor é considerado bem particular e não entrará na divisão.

    2. Herança ou doação:

    • Se o valor da entrada foi pago com recursos recebidos por herança ou doação, esse valor também não deve ser partilhado. Por exemplo, se um dos cônjuges recebeu uma herança de R$ 100.000,00 e utilizou esse dinheiro para pagar a entrada do imóvel, esse valor é considerado bem particular e não entra na partilha.

    3. Regime de separação total de bens:

    • No regime de separação total de bens, cada cônjuge mantém a propriedade exclusiva dos bens adquiridos antes e durante o casamento. Portanto, se o valor da entrada foi pago por um dos cônjuges com recursos próprios, esse valor não deve ser partilhado.

    Exemplo prático com valor de entrada não partilhado

    Vamos considerar um exemplo prático para ilustrar essa situação.

    Situação:

    • Imóvel adquirido durante o casamento por R$ 500.000,00.
    • Valor total financiado: R$ 400.000,00.
    • Valor pago de entrada: R$ 100.000,00 (proveniente de herança de um dos cônjuges).
    • Valor pago até o momento do divórcio: R$ 200.000,00.
    • Saldo devedor: R$ 200.000,00.

    Comunhão parcial de bens:

  • Valor pago de entrada: O valor de R$ 100.000,00, que corresponde a 20% do imóvel, pago com recursos de herança, não deve ser partilhado.
  • Valor pago durante o casamento:O valor de R$ 100.000,00 pago durante o casamento é dividido igualmente entre os cônjuges. Cada um tem direito a R$ 50.000,00 (10% do imóvel).
  • Saldo devedor: O saldo devedor de R$ 200.000,00 deve ser considerado. Se um dos cônjuges decidir ficar com o imóvel, ele assume a responsabilidade pelo saldo devedor, mas deve compensar o outro cônjuge pela metade do valor pago durante o casamento.
  • Exemplo de compensação:

    • Cônjuge A decide ficar com o imóvel.
    • Cônjuge A assume o saldo devedor de R$ 200.000,00.
    • Cônjuge A deve pagar ao Cônjuge B o equivalente a 10% do que vale o imóvel no momento do divórcio.

    E se não houver acordo na hora de dividir os bens no divórcio?

    Nesse caso, cabe ao juiz, considerando as situações que mencionamos acima, quanto cada um dos cônjuges tem de porcentagem no divórcio. Uma vez definida essa porcentagem, caso insistam em não chegarem a um acordo, o imóvel deverá ser vendido, para que cada um possa receber o valor em dinheiro que corresponda à sua parte no imóvel, após descontadas todas as despesas (judiciais e extrajudiciais) que envolvem essa operação de venda.

    Considerações finais

    A partilha de um imóvel financiado no divórcio pode ser complexa, mas com a orientação adequada, é possível chegar a um acordo justo para ambas as partes. 

    Luis Gustavo Narciso Guimarães

    Luis Gustavo Narciso Guimarães

    Graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo em 2003; Pós-Graduado em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul; Especialista em Ações de Família

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