Seria o CriptoJud uma regressão ou uma necessidade?   Migalhas
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Seria o CriptoJud uma regressão ou uma necessidade? – Migalhas

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Sistemas como SisbaJud, InfoJud e RenaJud foram criados para facilitar a solicitação de informações pelo Poder Judiciário. Com o avanço da sociedade, percebe-se a necessidade de desenvolvimento de sistemas que se permitam a satisfação do débito.

Devido aos investimentos no campo digital, questiona-se sobre como obter informações acerca dos criptoativos, como é no caso do Bitcoin, verbi gratia. Sendo assim, durante o 1º Congresso Nacional da Dívida Ativa, realizado em Brasília, fora anunciado pelo dr. Frederico Montedonio Rego o CriptoJud, que é um sistema em processo de criação destinado a bloquear ativos digitais de qualquer cidadão brasileiro em exchanges (corretoras de criptomoedas).

A IN 1888 institui e disciplina a obrigatoriedade de prestação de informações concernentes às operações realizadas com criptoativos à Secretaria Especial da Receita Federal, todavia, as exchanges atuam sem regulamentação específica. A referida instrução normativa apenas trata sobre a prestação de informações concernentes aos criptoativos. O objetivo do CriptoJud é obter informações imediatas para análise em juízo dos bens do sujeito, além de bloquear os criptoativos.

Na prática, o CriptoJud será similar ao Sisbajud, este que permite a realização de bloqueios financeiros em contas no Brasil. Ademais, será necessária uma ordem judicial para que seja feito o bloqueio da carteira de criptoativos da pessoa. Com esse novo sistema, também acontecerão mudanças relevantes para as exchanges, pois estas agem com liberdade no Brasil por não estarem sujeitas às Regras do Banco Central. Vejamos o posicionamento deste concernente às exchanges (Comunicado 31.379 de 16/11/17):

4. As empresas que negociam ou guardam as chamadas moedas virtuais em nome dos usuários, pessoas naturais ou jurídicas, não são reguladas, autorizadas ou supervisionadas pelo Banco Central do Brasil. Não há, no arcabouço legal e regulatório relacionado com o Sistema Financeiro Nacional, dispositivo específico sobre moedas virtuais. O Banco Central do Brasil, particularmente, não regula nem supervisiona operações com moedas virtuais.

Malgrado, defende-se que é necessária legislação para tratar dos criptoativos, visto que, caso a Receita Federal faça mudanças para o mercado cripto, estaria evadindo competência típica do Poder Legislativo. Recorda-se que instrução normativa da SRF – Secretaria da Receita Federal não se equipara e não é lei. Não se trata de ser contrário às instruções da SRF, e sim de exigir legislação a respeito do assunto para que esta possa fazer instruções que cumpram e respeitem às leis.

O bloqueio de criptoativos é uma medida radical devido à inexistência de regulamentação sobre o assunto. Caso ocorra o bloqueio dos ativos, a pessoa terá os seus investimentos prejudicados. Aliás, a preferência de ordem de penhora não pode ser desrespeitada (art. 835 do CPC). Vejamos um julgado do TJ/SP sobre o assunto:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. Indeferimento do pedido de expedição de ofício às corretoras de criptomoedas. Pretensão de reforma. CABIMENTO: O Banco Central não supervisiona as entidades custodiantes de criptomoeda e tokens e, por isso, esse bem não é abrangido pela pesquisa do Sisbajud. Possibilidade de expedição de ofício para localização de criptomoedas em nome da devedora. Decisão reformada. RECURSO PROVIDO.

(TJ/SP – Agravo de Instrumento / Duplicata – 2157368-72.2022.8.26.0000, Relator: DES. ISRAEL GÓES DOS ANJOS, Data de Julgamento: 19/9/22, Data de Publicação: 19/9/22) (grifos meus)

Como tem sido demonstrado no presente artigo, não existem meios para supervisão das corretoras de criptoativos devido à ausência de legislação sobre o assunto. O CriptoJud é uma solução para a pesquisa e bloqueio de ativos do devedor, todavia, ainda assim, é necessária uma lei que regule as referidas corretoras para que o sistema abordado tenha respaldo legal. Agora, mostra-se outra decisão do TJ/SP sobre o assunto:

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Ação indenizatória Pretendido o acesso ao sistema CCS-Bacen e expedição de ofícios à CVM – Comissão de Valores Mobiliários, à Bolsa de Valores e às corretoras de criptomoedas, com vistas à satisfação do crédito dos agravantes Medidas indeferidas pelo d. juízo a quo Manutenção – Consulta ao CCS-Bacen – Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional – Dados lançados no CCS-BACEN se destinam a reprimir a prática de crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores Implementação do sistema Sisbajud, em substituição ao sistema Bacenjud 2.0, a partir de 8/9/20, ou seja, posteriormente à pesquisa já realizada Possibilidade de nova pesquisa via sistema Sisbajud, em virtude da ampliação de seu alcance no bloqueio de valores, abarcando tanto numerário em conta corrente, como ativos mobiliários (ex vi, títulos de renda fixa e ações) Medida suficiente a afastar a pretendida expedição de ofícios à CVM e à Bolsa de Valores Indeferida a expedição de ofício às corretoras de criptomoeda Ausência de regulamentação no Brasil acerca da comercialização de moedas criptografadas – Moeda eletrônica é um modo de expressão de créditos denominados em reais, que não se confunde com as chamadas moedas virtuais, não são referenciadas em reais ou em outras moedas estabelecidas por governos soberanos Pedido de expedição de ofícios às “Fintechs” não conhecido, sob pena de supressão de instância – Decisão parcialmente reformada AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ/SP. Agravo de Instrumento 2173523-24.2020.8.26.0000 – 10ª Câmara de Direito Privado – rel. Elcio Trujillo – DJ 28/10/20) (meus grifos)

Enquanto não for feita uma legislação que permita o bloqueio e a penhora dos criptoativos do devedor em exchanges, os credores serão prejudicados. Não é possível inovação jurídica, visto que, o sistema de freios e contrapesos seria desrespeitado. Agora, vejamos uma decisão do TJ/DF:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. CRIPTOMOEDAS. ENVIO DE OFÍCIOS A CORRETORAS. ATUAÇÃO EXCEPCIONAL DO PODER JUDICIÁRIO. PEDIDO GENÉRICO. INDEFERIMENTO. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Incumbe ao credor, por atuação direta de sua parte, esgotar todos os meios possíveis para a localização de patrimônio em nome da parte devedora, porquanto a utilização de sistemas conveniados disponíveis ao juízo, assim como a expedição de ofícios e o uso de medidas indutivas e coercitivas atípicas para tal finalidade configuram medidas excepcionais, apenas admissíveis quando comprovado nos autos que foram exauridos os meios de busca ordinários a cargo do exequente, o que não se verifica na hipótese. 2. O pedido de envio de ofício para corretoras (Exchanges), visando à penhora de criptomoedas, sem que o exequente aponte, nos autos, indícios de que o executado, de fato, é titular de criptoativos, com indicação de quem é o responsável pela custódia desses bens, revela-se genérico, tornando inviável o deferimento da medida requerida por ausência de razoabilidade. 3. A informação acerca da inexistência de criptomoedas em nome dos executados, obtida por declaração de imposto de renda, via INFOJUD, corrobora a desnecessidade da medida requerida. 4. Decisão agravada mantida. Recurso não provido.     

(Acórdão 1438014, 07132043520228070000, relator(a): GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª turma Cível, data de julgamento: 13/7/22, publicado no DJE: 28/7/22. Pág.: Sem Página Cadastrada.) (grifos meus)

Percebe-se que se trata de uma decisão excelente a respeito da penhora de criptomoedas, entretanto, faz-se ressalvas porque é necessário evitar que medidas excepcionais se tornem a regra, pois dificilmente os sistemas de informações (SisbaJud, por exemplo) não são usados.

Em virtude do que foi mencionado, conclui-se que o CriptoJud será um ótimo sistema para satisfazer o débito dos credores, contanto que tenha respaldo legal, ou seja, que o Poder Legislativo crie lei que regulamente às exchanges e permita o bloqueio e a penhora dos criptoativos, e, consequentemente, O Banco Central e a Secretaria da Receita Federal tratem do assunto por meio de comunicados e instruções.

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Futurizese. Justiça Federal Brasileira cria Criptojud para bloqueio de criptomoedas em corretoras. Disponível em: https://futurizese.com.br/criptomoeda/justica-federal-brasileira-cria-criptojud-para-bloqueio-de-criptomoedas-em-corretoras/ Acesso em: 2 set. 2024.

Exame. Justiça do Brasil quer criar sistema capaz de bloquear ativos digitais em corretoras. Disponível em: https://exame.com/future-of-money/justica-do-brasil-quer-criar-sistema-capaz-de-bloquear-ativos-digitais-em-corretoras/ Acesso em: 2 set. 2024.

Migalhas. A penhora de criptomoedas em processos de execução. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/356443/a-penhora-de-criptomoedas-em-processos-de-execucao Acesso em: 2 set. 2024.

Lázaro Lima Souza

Lázaro Lima Souza

Graduado em Direito pelas FMU, advogado, pesquisador, escritor de artigos, palestrante e membro das Comissões Direito Civil e de Direito Tributário da OAB/SP

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