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No âmbito do Direito brasileiro, a efetivação da sistemática de apropriação e compensação de créditos tributários frequentemente gera dúvidas aos contribuintes, especialmente no que tange o ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, por ser esse imposto um dos mais complexos do sistema tributário nacional. A possibilidade de compensação do ICMS associado ao frete, em contextos onde se produzem “co-produtos” como parte do processo produtivo principal, oferece desafios adicionais, tendo em vista o desenho da cadeia produtiva anterior ao surgimento do crédito. Nesse contexto, recentes decisões do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, relativas à compensação de créditos de PIS e de COFINS sobre o transporte de gesso, ampliaram a discussão sobre a apropriação e a compensação de créditos tributários de ICMS associados à co-produtos, em especial aqueles relacionados ao transporte de mercadorias e insumos.
No âmbito produtivo, co-produtos são subprodutos que surgem como um resultado paralelo e acessório da produção de um bem principal. Embora não sejam o foco primário da atividade produtiva, sua presença é fundamental para a realização eficiente do processo produtivo principal. Em um contexto tributário, a correta avaliação dos co-produtos pode afetar diretamente a forma como os créditos fiscais são apropriados. O reconhecimento da importância dos co-produtos no processo produtivo é crucial para garantir a conformidade tributária e a maximização dos benefícios fiscais.
A análise preliminar quanto ao creditamento de operações com co-produtos ocorreu no julgamento dos processos 10845.900919/2012-69 e 19515.721557/2012-58 pelo CARF, em que foi garantida a apropriação de créditos de PIS e COFINS sobre o transporte de gesso (co-produto) advindo da produção de ácido fosfórico (produto principal). Em suma, no caso da produção de ácido fosfórico, o processo produtivo começa com a reação do minério de fosfato com ácido sulfúrico. Este processo químico resulta em ácido fosfórico e gesso como subprodutos. O gesso, também conhecido como sulfato de cálcio, é gerado em grandes quantidades e sua gestão é uma parte essencial do processo produtivo.
Assim, a importância do gesso como co-produto não pode ser subestimada. A acumulação desse material no local de produção pode levar a problemas operacionais significativos, inclusive a paralisação da produção de ácido fosfórico, produto principal. Portanto, a remoção e o manejo adequados do gesso são indispensáveis para garantir a continuidade da produção principal.
Assim, ao autorizar a compensação de créditos de PIS e COFINS sobre o transporte de gesso, o CARF estabeleceu um precedente relevante, sugerindo que a compensação do ICMS deve seguir o mesmo princípio. Isso porque o ICMS possibilita o aproveitamento de créditos relacionados ao transporte de mercadorias e insumos, mas a aplicação desses créditos pode ser complexa quando envolve co-produtos. Essa decisão reflete a possibilidade de compensar a carga tributária relacionada ao frete de co-produtos, desde que estes sejam gerados como parte essencial do processo produtivo.
O entendimento original do tribunal administrativo evidencia que o frete utilizado para transportar co-produtos, por serem resultantes inevitáveis da produção principal, pode ser compensado tributariamente. A decisão destaca um pressuposto importante: quando o frete é indispensável para o manejo do co-produto, que é vital ao processo produtivo, o ICMS correspondente ao transporte deve ser passível de compensação. Assim, se o co-produto é gerado de maneira inerente ao processo produtivo e o frete torna-se necessário para sua movimentação, é possível afirmar que o ICMS incidente sobre esse transporte também pode ser aproveitado.
Assim, como o gesso é um subproduto inevitável e necessário na produção de ácido fosfórico, sua gestão deve ser tratada como parte integral do processo produtivo. Consequentemente, a compensação de ICMS sobre o gesso torna-se essencial, uma vez que sua remoção e tratamento adequado são cruciais para a eficiência operacional da planta. Considerar o gesso um co-produto relevante garante a eficácia do processo, bem como é fundamental para a conformidade tributária e para a obtenção dos benefícios fiscais pertinentes.
Portanto, conclui-se que o entendimento do CARF representa uma mudança de paradigmas, ampliando a aplicação das normas tributárias em favor do contribuinte e criando precedentes aplicáveis a casos semelhantes. Ao permitir a compensação de créditos de PIS e de COFINS sobre o transporte de gesso, o CARF foi de encontro com a fundamentação jurídica de que é cabível, também, a apropriação e a compensação de créditos tributários de ICMS associados à co-produtos, em especial aqueles relacionados ao transporte de mercadorias e insumos.
Giovana Sousa Ferreira
OAB/DF 68.479 Bacharel em Direito pelo UniCeub Especialização em Direito Administrativo pela FGV MBA em Gestão Tributária pela USP Ex-Conselheira Fiscal da International Association of Artificial Intelligence (I2AI) – Biênio 2023/2024 Membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF
Gabriel Sacramento Ramos
OAB/DF 73481 Bacharel em Direito pelo UniCeub Especialização em Direito Público pelo IMP Cursando MBA em Gestão Tributária na USP
Gustavo Borges de Melo
OAB/DF 53.239 Bacharel em Direito pela UDF Especialização em Direito Civil e Processo Civil Cursando MBA em Gestão Tributária na USP
Menndel Assunção Oliver Macedo
OAB/DF 36.366 / OAP 62.999P Bacharel em Direito pelo UniCeub Especialização em Direito, Estado e Constituição pelo SuiJuris MBA na Massachusetts Institute of Business (MIB) Especialização em Contabilidade Tributária no IBET Diretor Jurídico da Câmara Brasil-Ásia (CBA) Cientista Tributário da Federação Nacional das Operações Portuárias (FENOP)