O dependente químico ou alcoólatra e a demissão por justa causa   Migalhas
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O dependente químico ou alcoólatra e a demissão por justa causa – Migalhas

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Embora visto socialmente como vício, desde 1967, a OMS – Organização Mundial da Saúde considera o alcoolismo uma doença e recomenda que as autoridades entendam o assunto como questão de saúde pública.

Assim, desde então, a embriaguez equiparou-se à doença química, considerada doença crônica, que gera compulsão, retira a capacidade de discernimento do dependente, e que atinge o indivíduo em diversos níveis e aspectos: físico; mental; emocional ou espiritual.

Contudo, em que pese a alínea “f” do art. 482 da CLT trazer a previsão da rescisão do contrato de trabalho por justo motivo pela embriaguez habitual ou em serviço, deve-se atentar com o fato de que a CLT é de 1943, época em que não se falava de dependência química como uma doença psiquiátrica.

Embriaguez – “Síndrome da Dependência do Álcool” – é a condição de estado em que o indivíduo fez ingestão de quantidade significativa de álcool ou substância psicoativa, aqui entendidas no amplo sentido, podendo ser desde bebidas alcoólicas a entorpecentes, a ponto de sofrer intoxicação ou alteração em seu comportamento que afeta principalmente a esfera psíquica, chegando a afetar suas atividades laborais.

Diante disso, a fim de dirimir eventuais problemas com colaboradores, se faz necessário diferenciar a conduta do trabalhador que faz uso recreativo do álcool ou outras substâncias psicoativas, daquele empregado acometido por dependência química, que deve ser encaminhado para tratamento e, se necessário, afastado de suas atividades como qualquer outro empregado portador de doença incapacitante, pois o vício deve ser tratado como tal.

Frisa-se que a embriaguez habitual é considerada doença, enquanto a embriaguez em serviço é diferente, pois se trata de um único ato em horário de trabalho, durante a execução do serviço do empregado que volta embriagado do intervalo para refeição e descanso, por exemplo. Esta conduta é passível de ensejar a rescisão motivada do contrato de trabalho, pois caracterizada pela violação dos deveres gerais do contrato, atitude que pode ser considerada insubordinada e passível de punição.

Nestas situações, caso o empregado se apresente embriagado, o empregador deve tentar abordar a situação de forma cuidadosa, advertindo-o sobre o comportamento inadequado e a gravidade da situação, preferencialmente de forma discreta e respeitosa. O empregador deverá ainda chamar o empregado para uma conversa e perguntar diretamente se ele está embriagado, sendo necessária a observação por parte da equipe de segurança ou recursos humanos, ou até mesmo através de um exame médico.

Dependendo do comportamento do empregado e da gravidade da situação, o empregador pode optar por não demiti-lo por justa causa e aplicar uma advertência ou uma suspensão, dependendo do histórico do trabalhador e das normas internas da empresa.

É necessário lembrar que a empresa não deve utilizar a demissão sem justa causa do colaborador por conta da dependência química, pois apesar dos reflexos que esta patologia pode trazer ao comprometimento do empregado, como atrasos, falta de atenção, queda na produtividade, dentre outros, é imperioso o diagnóstico e o afastamento previdenciário do mesmo.

Assim, por mais difícil que seja administrar um colaborador que sofra de dependência química, o que se espera da empresa, é uma postura de colaboração, com ações de prevenção buscando um ambiente de trabalho sadio inclusivo e nunca discriminatório.

Diante disso, compreende-se que se fossemos seguir a interpretação literal da legislação, seria plenamente justificável a demissão do empregado por justa causa. No entanto, ao rescindir o contrato de trabalho do colaborador, mesmo que sem justa causa, motivado pelo consumo de bebidas alcoólicas ou de outras substâncias entorpecentes, o colaborador poderá ingressar com ação judicial visando a reintegração ao trabalho por demissão discriminatória, além de pleitear indenização por danos morais, e caso necessário, ainda solicitar afastamento para tratar de sua saúde perante o INSS.

Ressalta-se que, visando respeitar o Princípio da Dignidade Humana, a fim de erradicar qualquer ato discriminatório ou indício deste, mesmo em situações em que os fatos ocorreram de forma esporádica, os Tribunais Regionais do Trabalho têm declarado nula a quebra contratual, determinando a reintegração do trabalhador ao emprego, ou seja, mesmo que a rescisão contratual ocorra sem justa causa, na demissão de um dependente químico ou de álcool haverá a presunção de dispensa discriminatória.

Assim, havendo desconfiança da empresa, antes que ocorra qualquer incidente que torne inviável a manutenção do contrato de trabalho, esta deve encaminhar o trabalhador ao setor de medicina e segurança do trabalho ou, em sua falta, ao próprio INSS ou ao SUS, lembrando sempre de resguardar o sigilo quanto às informações.

Alonso Santos Alvares

Alonso Santos Alvares

O advogado é sócio da Alvares Advogados, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial, Civil, Trabalhista e Tributário.

Bruna Paula dos Santos

Bruna Paula dos Santos

Advogada especializada em Direito do Trabalho e integrante do núcleo trabalhista da Alvares Advogados, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial, Civil, Trabalhista e Tributário.

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