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1. Introdução
A doação é um importante instrumento de antecipação da sucessão e de organização patrimonial, especialmente quando acompanhada de cláusulas restritivas, como usufruto, inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. Essas cláusulas permitem ao doador estabelecer limites ao uso e disposição do bem pelo donatário, protegendo o patrimônio de riscos futuros.
Entretanto, existem limites legais para essas restrições, de modo que sua aplicação não pode ser abusiva ou desproporcional. O presente artigo visa analisar os fundamentos jurídicos, os efeitos práticos e as implicações legais da doação com cláusula de usufruto e inalienabilidade, com base no Código Civil Brasileiro e na jurisprudência.
2. A doação e as cláusulas restritivas no Código Civil
A doação é regulada pelos arts. 538 a 564 do Código Civil e consiste na transferência gratuita de um bem ou direito. Como salientado no início, o doador pode impor restrições ao uso e alienação do bem pelo donatário, visando garantir sua destinação ou impedir sua dissipação.
A primeira delas a ser aqui abordada é o usufruto, trata-se de um direito real previsto nos arts. 1.390 a 1.411 do Código Civil, que permite ao doador reter a posse e o uso do bem doado, garantindo, por exemplo, sua moradia ou os rendimentos provenientes do imóvel.
Como exemplo prático, podemos citar aquele pai que doa a filha um imóvel, mas reserva o usufruto vitalício para utilizar o bem ou receber os frutos provenientes dele. Quando o pai falecer se consolidará a propriedade plena do imóvel para a filha.
A segunda cláusula restritiva a ser aqui tratada é a inalienabilidade prevista no art. 1.911 do Código Civil, determinando que o bem não pode ser vendido, doado ou transferido pelo donatário. Essa cláusula visa impedir que o beneficiário disponha do bem de maneira que possa comprometer seu patrimônio.
Essa imposição não pode ser perpétua, devendo sempre ser justificada quando de sua estipulação.
O STJ já decidiu que cláusulas restritivas não podem ser abusivas ou desproporcionais, sob pena de afrontarem o princípio da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da CF/88).
A Corte decidiu que uma cláusula de inalienabilidade perpétua não pode ser mantida indefinidamente se não houver justificativa plausível, pois violaria o direito de propriedade do donatário.
3. Possibilidade de revogação judicial das cláusulas
A cláusula de inalienabilidade pode ser revogada judicialmente se houver motivo justo. O próprio art. 1.911, parágrafo único, do Código Civil permite que o juiz autorize a venda do bem se a restrição prejudicar o donatário.
4. Conclusão
A doação com cláusula de usufruto e inalienabilidade é uma ferramenta valiosa para planejamento sucessório e proteção patrimonial. No entanto, sua imposição deve respeitar os limites legais, evitando restrições excessivas que possam comprometer a autonomia do donatário.
A jurisprudência tem reforçado que restrições absolutas ao direito de propriedade não são aceitáveis, especialmente quando prejudicam o donatário ou os herdeiros. Assim, ao elaborar um planejamento sucessório, é fundamental buscar assessoria jurídica especializada para garantir que as cláusulas sejam válidas e compatíveis com a legislação vigente.
Thiago Sandoval
Advogado especialista em Direito de Família, Sucessões e Imobiliário.