Inventário: Uma necessidade mesmo para o filho único   Migalhas
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Inventário: Uma necessidade mesmo para o filho único – Migalhas

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Introdução

É recorrente a indagação acerca da necessidade de instauração do procedimento de inventário nos casos em que há apenas um herdeiro, especialmente quando este já se encontra na posse dos bens deixados pelo de cujus.

Partindo dessa hipótese, seria possível evitar a burocracia inerente ao processo sucessório e simplesmente administrar o acervo hereditário sem formalizá-lo?

A resposta, à luz do ordenamento jurídico pátrio, é inequívoca: sim, o inventário é imprescindível, independentemente da quantidade de herdeiros ou da posse dos bens. A ausência de regularização pode ensejar consequências jurídicas e fiscais severas, comprometendo não apenas a gestão patrimonial, mas também a segurança jurídica do herdeiro.

Dívidas: a sua função no inventário

O equívoco conceitual mais comum reside na suposição de que o inventário tem como escopo exclusivo a partilha dos bens entre os sucessores.

No entanto, uma de suas finalidades primárias trata-se de um instrumento jurídico destinado a proceder à liquidação do patrimônio do falecido, quitando-se eventuais débitos e tributos incidentes antes da entrega dos bens remanescentes aos herdeiros.

O Código Civil de 2002, no art. 1.997, dispõe expressamente:

“A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube.”

Ou seja, a transmissão do patrimônio aos sucessores apenas ocorre após a regularização de eventuais passivos.

A inexistência de inventário inviabiliza essa quitação formal, podendo resultar na incidência de penalidades e encargos que oneram consideravelmente a sucessão.

Os riscos da não regularização da herança

Ainda que o herdeiro único esteja na posse dos bens, a ausência de inventário impede a formalização da titularidade perante órgãos públicos e registros competentes. Para ilustrar, imóveis cuja matrícula permanece em nome do falecido não podem ser vendidos, alienados ou oferecidos como garantia em operações financeiras, pois sua propriedade ainda não está juridicamente consolidada em favor do herdeiro.

Além disso, o não pagamento do ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação dentro do prazo estipulado pelas legislações estaduais gera multas, tornando o procedimento sucessório ainda mais dispendioso.

Outro aspecto relevante é a possibilidade de terceiros – como credores do de cujus ou do próprio herdeiro – requererem a abertura do inventário para satisfação de seus créditos, conforme prevê o CPC (arts. 615 e 616, inciso VI). Assim, a inércia do herdeiro não apenas não impede o inventário, como pode permitir que sua condução ocorra em condições menos favoráveis.

Sucessão acumulada: Um problema maior

A procrastinação na regularização do inventário pode, ainda, resultar em sucessão acumulada, situação em que o herdeiro falece sem ter formalizado a transmissão dos bens herdados.

Nesses casos, o patrimônio não regularizado ingressa em uma nova sucessão, tornando-se necessária a realização de múltiplos inventários simultâneos – o que prolonga e encarece sobremaneira o procedimento.

O risco desse cenário é evidente: sucessores remotos terão de lidar com um emaranhado jurídico e tributário, muitas vezes culminando na dilapidação do patrimônio em razão da incidência cumulativa de impostos, custas e honorários advocatícios.

Inventário extrajudicial: Celeridade e eficiência

Diante da necessidade inafastável do inventário, é fundamental destacar a possibilidade de realização do procedimento pela via extrajudicial, sempre que preenchidos os requisitos legais.

Regulamentado pela resolução 35/07 do CNJ, o inventário extrajudicial pode ser conduzido em cartório, com assistência obrigatória de advogado, desde que não haja litígio e todos os herdeiros sejam plenamente capazes.

Tal modalidade apresenta vantagens inquestionáveis, como a maior celeridade na conclusão do procedimento, a redução de custos, que algumas vezes é bem maior no inventário judicial e a minimização da burocracia envolvida.

Conclusão

O procedimento de inventário não é mera formalidade burocrática, mas exigência legal para a regularização da sucessão patrimonial. Mesmo nos casos em que há apenas um herdeiro, a formalização do inventário é imprescindível para assegurar a titularidade dos bens, evitar sanções fiscais e mitigar riscos jurídicos.

Portanto, recomenda-se que o herdeiro procure assessoria especializada para conduzir o procedimento da forma mais eficiente, garantindo a segurança jurídica da sucessão e a plena disponibilidade do patrimônio herdado.

Adara Gomes

Adara Gomes

Mestranda em Direito na Universidade Federal do Piauí – UFPI (2024). Graduada em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT. Advogada de Família e Sucessões. Sócia ASG Advocacia

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