Mãos ao alto
Em artigo (“Contribuição” quer dizer “mãos ao alto”) publicado no último dia 31 no jornal Folha de S. Paulo, Jorge Bornhausen escreve sobre o uso e abuso do termo “contribuições”. O senador ensina que a Constituição determina que uma parte de todos os impostos recolhidos pela União seja dividida com os Estados e os municípios, o governo federal passou a criar (e aumentar a arrecadação) “contribuições”, que não são divididas com os Estados e Municípios.
Para o senador, tais “contribuições” têm tudo de imposto: parecem impostos, são coercitivas, universais, têm cara, corpo e espírito de impostos, mas, como são denominadas “contribuições”, não entram na partilha de que participam os municípios.
Leia abaixo a opinião do advogado Américo Masset Lacombe, doutor em Direito, Desembargador Federal aposentado e ex-presidente do TRF da 3ª Região.
O assalto aos Municípios
Américo Masset Lacombe*
O artigo , publicado na Folha de São Paulo, do senador Jorge Bornhausen, está perfeitamente correto no que tange à denúncia feita. No entanto, a solução para o problema é mais simples do que a preconizada. Basta que o Judiciário, fazendo uma interpretação sistemática da Constituição, que não retire o sentido do art. 145, transformando-se em letra morta, não considere as contribuições como uma espécie autônoma do gênero tributo, mas que a entenda como verdadeiros impostos ou taxas, dependendo de estar ou não a hipótese de incidência vinculada a uma atividade do Poder Público.
Com efeito, o artigo 145, da Constituição Federal afirma:
“Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I – impostos;
II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial , de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III – contribuição de melhoria, decorrentes de obras públicas”.
Aí estão as três espécies de tributos. As referências feitas em outros artigos aos empréstimos compulsórios e às diversas contribuições não lhes dá a natureza de novas espécies tributárias. Poderão ser impostos ou taxas. Isto já desenvolvido há muito por Alfredo Augusto Becker. Em meu último livro (Princípios Constitucionais Tributários, Malheiros, São Paulo, 2ª edição, 2000, pg. 28 e segts) expus, neste sentido, o meu entendimento, e não é num pequeno artigo como este a ocasião repeti-lo .
Mas vejamos o exemplo da CPMF para verificarmos a bandidagem fiscal a que o país está submetido. E submetido há tempos, diga-se de passagem, pois não é criação do atual governo. Num retrospecto histórico verificamos que a Lei Complementar nº 77/93, com base na Emenda Constitucional 3/93, instituiu o imposto provisório sobre a movimentação financeira ou a transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira. Se compararmos, no entanto o fato gerador do artigo IPMF (Lei Complementar 77) com a da CPMF (Lei nº 9.311/96), verificarmos que são iguais. Logo, a conclusão é óbvia: trata-se de um imposto.
O comportamento do Governo Federal, e o entendimento errôneo da maioria das decisões judiciais – existem é óbvio honrosas exceções – destituem de qualquer sentido o art. 145 da Constituição e o art. 4º do Código Tributário Nacional, que dispõe:
” Art. 4º. A natureza específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la :
I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei;
II – a destinação legal do produto da sua arrecadação.”
Está, portanto, na hora de a maioria do Judiciário adotar a correta interpretação para demonstrarem que não só em Berlim existem juízes.
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Por: Redação do Migalhas
Atualizado em: 1/8/2003 08:27