A cobrança pelo uso dos recursos hídricos
Sérgio Guerra*
Malgrado a expectativa do empresariado acerca da cobrança pelo uso dos recursos hídricos, cumpre assinalar que já é realidade no Estado do Rio de Janeiro a normatização dos critérios para tal cobrança. Em 17 de dezembro do ano passado, foi publicada no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro a Lei nº 4.247, de 16 de dezembro de 2003, dispondo que os objetivos perseguidos com essa cobrança envolvem o reconhecimento da água como bem econômico e como recurso limitado que desempenha importante papel no processo de desenvolvimento econômico e social.
A lei fala ainda em proporcionar aos usuários indicações de seu real valor e dos custos crescentes para sua obtenção; incentivo à racionalização do uso da água; incentivo à localização e distribuição espacial de atividades produtivas no território estadual; fomento dos processos produtivos tecnologicamente menos poluidores; obtenção de recursos financeiros necessários ao financiamento de estudos e aplicação em programas, projetos, planos, ações, obras, aquisições, serviços e intervenções na gestão dos recursos hídricos, proporcionando a implementação da política estadual de recursos hídricos.
É importante destacar que, nos termos do artigo 22 da Lei nº 4.247/2003, os critérios e valores estabelecidos nos artigos 19 e 20 desse mesmo ato normativo são de caráter provisório, até que se efetive a implantação dos comitês de bacia e respectivos planos de bacia hidrográfica nos termos do artigo 12 da Lei estadual nº 3.239, de 2 de agosto de 1999. Isso porque, nos termos da política nacional de recursos hídricos, aprovada pela Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que instituiu o sistema de outorga e cobrança pela utilização das águas, adotou-se a bacia hidrográfica como unidade de planejamento para a implantação da política de recursos hídricos.
Grosso modo, os recursos gerados das cobranças pelo uso da água serão aplicados efetivamente nas bacias hidrográficas, que não são identificadas em áreas pertencentes a municípios, Estados ou União, mas, sim, são determinadas a partir do curso da água, influenciada pela declividade das montanhas, dos montes e colinas, cabendo ressaltar que, ao Estado, cabe a dominialidade das águas superficiais ou subterrâneas fluentes, emergentes e em depósito, a teor do que dispõe o artigo 26, parágrafo I da Constituição Federal de 1988.
Cada bacia hidrográfica terá um comitê, que gerenciará desde os rios, seus afluentes, lagos e lagoas que tenham interesses comuns. Esse comitê é organizado sob a forma colegiada, envolvendo o poder público, usuários e entidades civis, atuando como uma espécie de parlamento das águas, posto que é o fórum de decisão no âmbito de cada bacia hidrográfica.
A outorga de direito de uso de recursos hídricos ao nível estadual é de competência, no Estado do Rio de Janeiro, da Superintendência Estadual de Rio e Lagoas (Serla). Essa outorga confere o direito de uso dos recursos hídricos (e não a propriedade), sendo que o prazo máximo de validade é de 35 anos, podendo ser renovado. A outorga pode ser suspensa caso não haja cumprimento dos seus termos e condições; pela não-utilização dos recursos hídricos por três anos consecutivos; em caso de calamidade pública; para prevenir ou reverter grave degradação ambiental; pela necessidade de se atender a usos prioritários de interesse coletivo; e, finalmente, pela necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade de um corpo d’água.
O órgão competente para definir o valor e os critérios de cobrança pelo uso dos recursos hídricos do Estado do Rio de Janeiro é o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERHI), a partir da proposição dos comitês de bacia hidrográfica. A cobrança será executada pelas agências de água, que são entidades executivas, com personalidade jurídica própria, autonomia financeira e administrativa, instituídas e controladas por um ou mais comitês de bacia hidrográfica.
É assinalável que de acordo com a política nacional de recursos hídricos, estarão sujeitas à outorga e cobrança pelo uso da água as atividades que contemplem a derivação ou captação de águas superficiais e subterrâneas, a diluição, transporte ou disposição final de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o aproveitamento dos potenciais hidrelétricos e todos os outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água, ou seja, rios, represas etc.
Independem de outorga pelo poder público, conforme a ser definido pela Serla, o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, ou o de caráter individual, para atender às necessidades básicas da vida, distribuídos no meio rural ou urbano, e as derivações, captações, lançamentos e acumulações da água em volumes considerados insignificantes.
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* Advogado do escritório Siqueira Castro – Advogados
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Atualizado em: 4/2/2004 10:19