O estopim da era digital   Migalhas
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O estopim da era digital – Migalhas

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1 Introdução

 A era analógica deu lugar à era digital, mudando de forma drástica a maneira como víamos o mundo. Essa modificação radical se dá ao modo de como passamos a ver as imagens e seu poder na sociedade. Uma ilustração é capaz de traumatizar, alegrar, entristecer e mudar a perspectiva de uma pessoa sobretudo em sua vida, podendo se transformar em um momento o qual ela nunca esqueceria.

2 O poder da imagem

Millôr Fernandes, escritor e artista plástico brasileiro, questiona sobre o impacto visual que temos, comenta que, se a imagem hoje vale mais que mil palavras, devemos provar isso com uma. Essa citação pode sim ser comprovada, visto que diversas ilustrações contém uma unicidade impressionante, assim como quadros e músicas, a foto pode e é interpretada de acordo com a singularidade do observador, suas experiencias de vida, sua história e cotidiano. O artista fazia com que sua escrita e seu desenho se completassem de forma intrínseca, de modo que seu conteúdo criasse um universo personalizado, se completando com um aspecto tosco, colorido e humorístico; sendo assim, explicitando que sua própria obra era uma imagem que valia mais que mil palavras, já que cada pessoa tem uma percepção diferente, visto sua particularidade, referente a mesma obra e escrita. 

Mesmo a Constituição Federal da República (CRFB), o Código Civil (CC) e o Código Penal (CP) tentando regularizar o uso dessa imagem, tristemente, vemos que a tecnologia e os crimes digitais estão crescendo e abrangendo tantos detalhes ainda não previstos em lei. É possível reparar o quão banalizado esse assunto ainda é visto que o bom senso ainda não prevalece na mente de muitos que realmente creem que a internet e os meios eletrônicos são “terras sem lei”, que imaginam que ao cometer um ‘crime’ (na verdade não é crime na mente deles, é apenas uma exposição de opinião) não serão punidos, pois veem que muitos fazem isso e saem impunes. Infelizmente é muito comum ver crimes de homofobia, racismo, xenofobia, intolerância religiosa, golpes de perfis falsos, aplicativos maliciosos, assédio, pedofilia, zoofilia, sexualização infantil e sorteios ilegítimos. Conforme o Art. 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, todos são iguais perante a lei, ficando, dessa forma, a dúvida, será mesmo que todos os crimes digitais são tratados da mesma forma? 

Rogério Paulo Castanho Alves, advogado português, nos dá uma ideia de um bom motivo para essa falta de noção, o sistema judicial ser extremamente retrógrado, a demora para a abertura e solução de um processo, a delicadeza ao tratar de provas digitais e como são facilmente manipuláveis. Ainda existem dúvidas referentes a como tratar tais documentos, questionando se o conteúdo existente em um smartphone, fotos em redes sociais e arquivos de áudio podem ser de fato usadas em um processo legal, dado ao fato de que é dificultosa a forma de provar que tal imagem é de fato um diálogo entre os envolvidos, em virtude de existirem aplicativos facilmente encontrados em plataformas gratuitas que modificam ou criam do zero uma captura de tela, sofrendo, dessa forma, diversas críticas por ser uma prova documental sujeita a vulnerabilidade.

Com a rapidez das mídias, considerando a possibilidade de enviar uma imagem para o outro lado do mundo em poucos segundos, o crime cibernético se amplia com uma agilidade absurda, tornando-se, dessa forma, mais difícil de encontrar aquele que acendeu o pavio do caos formado. É fascinante em ouvir a fala da filósofa Lúcia Helena Galvão faz sentido quando tratamos dessa era digital, pois é visível que a pessoa se enche de coragem quando está atras de uma tela, ou segundo a fala da professora, “quando o inglês não está vendo”. 

Como já citado acima, muitas pessoas acreditam fielmente que a internet é uma “terra de ninguém” ou “terra sem leis”, pensando, dessa forma, que ao cometerem um crime não vão ser descobertas, contudo, mesmo com a dificuldade de encontrar quem propagou tal atitude, não deixa de ser possível. Muitas vezes é observado que uma pessoa se transforma completamente quando imagina que ninguém a está observando, deixando transparecer seu egoísmo, irracionalidade e a forma como sente, aparentemente, prazer ao ofender outras pessoas. É visível que uma grande massa social acredita que pode dar sua opinião em toda notícia ou publicação visualizada, pensam que, de fato, as crenças dos mesmos são de suma importância para aquele que publicou a informação ou foto; só que, caso seja uma opinião ofensiva aquele que profere não tem o direito de de fato o fazer, sendo algo completamente diferente de liberdade de expressão.

O Art. 5° da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) deixa claro na seção IV, V e IX que nos é assegurado o direito de manifestação de pensamento, da resposta e expressão intelectual, contudo, o Art. 3° na seção IV coloca que os representantes de Estado têm a obrigação de promover o bem estar de todos os cidadãos, citando diversas leis referentes ao preconceito de raça, cor, discriminação social e de gênero. Limitando, dessa forma, uma boa quantidade de “opiniões”, tendo em vista que muitas delas deixaram de ser meras críticas e passaram a ser crimes a algum tempo. 

Certamente é necessário amadurecer muito como ser humano e sociedade, aprender a de fato respeitar devidamente a individualidade e a unicidade do outro, mesmo que suas convicções não sejam as mesmas e aquilo é algo ultrajante conforme seus preceitos morais, valores religiosos e visões conservadoras de certo e errado. É de extrema importância que paremos de acreditar que o mundo gira em torno das nossas convicções e que todos precisam a seguir, cada pessoa, não sendo compreensível o porquê de a CRFB assegurar que cada um tenha sua particularidade e que a sociedade digital não respeite essa norma básica.

É visto muitas pessoas “militando” nas redes sociais sobre o certo e o errado, contudo, agindo de forma completamente diferente em relação a aquilo que pregam na rua. Uma quantidade assustadora de usuários busca diariamente mostrar o quanto seu intelecto é mais desenvolvido por se mostrarem digitalmente serem pessoas melhores, mais empáticas e solidárias, todavia, frequentemente mostram sua verdadeira face sendo conivente ao divulgar marcas que cometem crimes como os citados, ao serem filmadas na rua destratando outras pessoas e em situações adversas, onde creem fielmente que a melhor forma de se resolver um problema é esnobar, diminuir e humilhar os outros.

Sendo assim, é necessário que essa nova era que estamos adentrando seja levada com a mesma seriedade que as outras áreas já experimentadas, esse sentimento momentâneo de uma liberdade de expressão irrestrita pode fazer com que muitas pessoas ajam como se fossem impuníveis, espalhando fake news, disseminando ódio, opiniões opressoras e influenciando descaradamente aqueles que consomem o conteúdo. Causando assim, um impacto social muito grande, já que pessoas são diariamente enganadas, traumatizadas e usadas.

Eduarda Kestring

Eduarda Kestring

Graduanda em Direito pela Faculdade Uniguaçu Faesi, em São Miguel do Iguaçu, Paraná.

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