Litigância predatória: Principais desafios e a resposta do Judiciário   Migalhas
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Litigância predatória: Principais desafios e a resposta do Judiciário – Migalhas

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Ações judiciais sem a fundamentação adequada, com pedidos genéricos ou mesmo sem pedidos, sem a documentação básica necessária e distribuídas aos milhares pelas comarcas brasileiras. Esses são alguns dos elementos que caracterizam um problema grave que vem prejudicando o Judiciário, a chamada litigância predatória. O uso do direito com ações desse tipo tem como principal objetivo a obtenção de vantagens indevidas e prejudica toda a sociedade.

Com mais de 80 milhões de processos em tramitação no país, segundo dados do relatório “Justiça em Números 2024”, do CNJ, não é difícil de imaginar o tamanho do impacto que essa prática indevida possui sobre os serviços prestados à população brasileira. O excessivo tempo de tramitação das ações judiciais, a insuficiência de recursos e de profissionais no setor para atender à crescente demanda encontram nessa situação um ponto agravante.

Isso porque a litigância predatória é capaz de aumentar expressivamente os custos dos tribunais, com ações iniciadas em massa e em pouquíssimo tempo, além da interposição de recursos inadequados e meramente protelatórios nos processos em andamento. Como consequência, observa-se também a redução da confiança da sociedade no sistema de justiça do país, visto todos os problemas que o acúmulo dessas ações acarreta.

Entretanto, há um grande desafio no combate a essa prática, que consiste na própria identificação das demandas que poderiam ser consideradas predatórias. Existem inúmeros casos na história em que o desrespeito aos direitos dos cidadãos acabou gerando milhares de ações judiciais. O direito do consumidor e o direito trabalhista são áreas em que tal situação ocorre com mais frequência, visto que, diante de uma inconformidade, milhares de pessoas podem ter seus direitos lesados simultaneamente.

Tanto é assim que, no direito, existe o instituto das chamadas demandas repetitivas, ou seja, ações judiciais derivadas de causas, fatos e fundamentos jurídicos comuns entre si. São as demandas de massa, com grande repercussão na sociedade, que podem vir a ser reunidas para serem julgadas pelos Tribunais Superiores, gerando precedentes que devem ser respeitados pelos demais órgãos julgadores.

Não obstante o fato de existirem empresas e advogados que, ainda hoje, ingressam com ações judiciais sem que os jurisdicionados sequer saibam exatamente do que está sendo tratado, é preciso que haja respeito e zelo por parte do Judiciário no que tange à apreciação das demandas e à garantia constitucional de se buscar por um direito, na forma do art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, que determina: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

Diante desse cenário, o Poder Judiciário tem adotado algumas medidas para identificar e mitigar essas práticas abusivas, como a aplicação de multas por litigância de má-fé, dentro dos parâmetros já estabelecidos pelo CPC, em seus arts. 79 a 81, nos quais são previstas penalidades entre 1% e 10% sobre o valor atualizado da causa ou mesmo de até dez vezes o valor do salário mínimo, quando o valor da causa for irrisório ou inestimável.

O uso de tecnologia tem sido outra medida implementada pelos tribunais para otimizar os trabalhos e combater os problemas do sistema de justiça no país, entre eles, a litigância predatória. A inteligência artificial e as ferramentas de jurimetria podem contribuir significativamente com a triagem e a identificação de demandas repetitivas com as características das ações abusivas. O CNJ oferece capacitações e materiais sobre o uso de inteligência artificial no Poder Judiciário brasileiro, contribuindo para a discussão e evolução do assunto entre os operadores do Direito.

Os desafios são muitos, uma vez que é preciso primeiramente identificar as ações predatórias e posteriormente punir seus responsáveis, para preservar e utilizar adequadamente os recursos públicos destinados ao sistema judicial. Todavia, é fundamental que essa tarefa seja cumprida sem prejuízo ao direito de acesso à justiça da população, representada pela grande maioria que busca pela tutela jurisdicional munida de boa-fé, com o objetivo único de ter direitos respeitados e efetivados.

Renata Nilsson

Renata Nilsson

CEO e sócia da PX Ativos Judiciais | Consultora especializada em fundos de investimentos (FIDCs) e plataformas focadas na aquisição de créditos judiciais incluindo trabalhistas, cíveis e precatórios.

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