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Recentemente, foi divulgado o resultado do processo seletivo unificado para acesso aos programas de residência médica, organizado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Apelidado como “Enem da Residência Médica”, o Enare visa a democratizar o acesso às vagas disponíveis nas instituições participantes, para fins de especialização profissional.
Contudo, foram veiculadas notícias que denunciam uma série de irregularidades na etapa de análise curricular de candidatos, o que impacta diretamente na classificação final da seleção pública. De acordo com o edital, a análise curricular avalia o histórico acadêmico e as experiências profissionais de candidatos, com base em critérios definidos previamente. Assim, a pontuação é atribuída de forma objetiva, seguindo uma tabela predefinida no edital.
Apesar disso, há casos nos quais a banca organizadora, no momento em que analisa a autenticidade e adequação dos documentos apresentados pelo candidato, não atribui as pontuações pertinentes, conforme os critérios estabelecidos no edital. Com isso, afasta-se do escopo do exame unificado, consubstanciado em ampliar a qualificação da seleção, democratizar o acesso às vagas, permitir que os melhores candidatos tenham acesso às instituições de sua preferência, além de promover a transparência do processo seletivo. Frise-se que tais vantagens foram listadas expressamente pelo governo Federal, em site que divulga o referido Exame1.
Em termos jurídicos, não pode a Administração Pública inovar com critérios subjetivos de avaliação, tampouco realizar a modificação de regras após a inscrição do candidato no certame, sob pena de violar o próprio instrumento convocatório ao qual também está vinculada. E não é só: há manifesta violação à isonomia, o que interfere na escolha de melhores candidatos para as vagas disponibilizadas. Ainda, a conduta compromete a previsibilidade do processo seletivo.
As inconsistências descritas na etapa de análise curricular do Enare podem comprometer o projeto de vida de inúmeros médicos recém-formados. Para enfrentar as ilegalidades narradas, a alternativa de candidatos prejudicados, que não obtiveram êxito no recurso administrativo apresentado à banca organizadora, consiste na judicialização da questão. Curiosamente, entre os instrumentos jurídicos cabíveis, menciona-se o mandado de segurança, inserido entre as espécies de remédios constitucionais. Bem vistas as coisas, há aspectos que aproximam as duas profissões: o que realmente importa é curar a dor e sanar o vício, instâncias que médicos e advogados conhecem.
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1 https://www.gov.br/ebserh/pt-br/ensino-e-pesquisa/exame-nacional-de-residencia-enare
Carolina Soares Vahia de Abreu
Advogada. Sócia do escritório Galdi, Alonso e Vahia Advogados. Pós-graduada pela Escola Superior de Advocacia Pública da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro.
João Manoel Galdi
Bacharel em Direito pela UERJ, advogado especializado em Direito Público. Procurador do Estado. Mestrando em Direito Público UERJ.