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Para quem não conhece – o que é bem improvável -, o atleta Neymar da Silva Santos Júnior é um futebolista brasileiro que atua como atacante. Fato é que ele é um verdadeiro ídolo de uma nação e principalmente de uma geração de jovens como eu que o acompanharam desde sua revelação.
Em razão de sua expressiva relevância no cenário do futebol mundial, em todas as janelas de transferência somos bombardeados com especulações sobre suas próximas decisões de carreira, embora o advogado desportivo Marcos Motta – que cuida de parte da carreira do atleta – já tenha mencionado em algumas entrevistas que os passos até sua aposentadoria já estão devidamente traçados e planejados.
De toda forma, nos últimos dias, nos deparamos com uma rescisão antecipada do contrato que o jogador tinha com o clube árabe Al-Hilal Saudi Football Club, que até o momento desse artigo ocupava a primeira posição da liga saudita. Com vigência até meados de 2025 – inclusive assessorado pelo supracitado advogado desportivo -, quando terminaria a temporada, o atleta entendeu por rescindir o vínculo, já com rumores de um acerto com o clube que o revelou, o Santos Futebol Clube.
Diante disso, toda a atmosfera que envolve o futebol entrou em um verdadeiro frenesi, tamanha a expressão que a saída de um clube causou, mas também pela possibilidade de um retorno ao futebol brasileiro. Assim, a presente escrita visa analisar os impactos mercadológicos causados pela operação envolvendo o jogador em comento.
Que o modo de consumo do esporte vem em constante mutação, é de conhecimento de todos. A prática deixou de ser somente 11×11 em campo, mas sim um produto altamente rentável e (no Brasil) pouco explorado. Envolve conceitos como o Sportainment, Customer Experience, Matchday, expansão de marcas, entre outros.
Assim, atualmente, clubes necessitam de uma verdadeira visão empresarial acerca da prática do desporto, mais especificamente do futebol. Ou seja, não é possível pensar mais somente em clube, mas sim marcas. É ultrapassado pensar somente em uma partida de futebol, mas sim um produto que está sendo vendido a não só torcedores, mas a clientes. Clubes não podem mais pensar tão somente em retorno desportivo, mas ter uma visão mercadológica a qual visa o lucro, logo, contrária ao modelo associativo sem fins lucrativos – existente até então em diversos clubes -.
Por esse e outros motivos – visto que se trata de uma operação complexa – as SAFs – Sociedades Anônimas do Futebol vêm em constante crescimento. Contudo, embora totalmente interligados, tal ponto não vem a ser o objeto desse artigo.
Sob o prisma da relevância da operação envolvendo o Neymar, temos um conceito trazido no livro “A produção do Clube”, de Irlan Simões, mas que é propagado por Cesar Bolaño, que consiste na dupla função da indústria cultural, quais sejam a publicidade e propaganda.
Nessa toada, temos pontos como economia de dados – que mede a interação entre os torcedores com os clubes e atletas -, que gera, a partir de então, uma necessidade de uma representatividade dentro de um clube de futebol. Assim, cito um estudo publicado em 2020 pela Football Money League que evidenciou que dos 20 clubes com maiores receitas na temporada de 18/19, somente 5 tinham mais seguidores nas redes sociais do que o seu jogador mais seguido, justamente citando como exemplo o comparativo entre o Paris Saint-Germain Football Club e o Neymar.
Tal fato pode parecer irrelevante, mas trazendo o conceito de “supporter”, também retirado da obra de Irlan Simões, embora haja uma pequena divergência entre nossas definições desse termo, é evidente que o torcedor deixou de ser somente aquele apoiador de estádios (ou arenas, outro conceito trazido pelo consumo contemporâneo do futebol) e crítico em manifestações. Hoje, existe um conceito de cliente e, por conseguinte, um papel produtivo desse torcedor. Aqui, abre-se uma gama de possibilidades quanto aos fins econômicos e comerciais desse ativo dos clubes, tais como emissão de fut-debêntures, fan-tokens, o conhecido plano de sócio torcedor e até mesmo IPO, nos casos das SAFs. Esse cenário tem um alto poder de difusão tendo em vista o interesse do torcedor em participação e representatividade, logo, visando retirar uma hegemonia de sócios.
Voltando especificamente à operação envolvendo o Neymar, passo a salientar alguns efeitos gerados em poucas horas, oriundos da rescisão com o Al Hilal e possível retorno ao Santos – digo possível pois até o momento desse artigo não houve a oficialização do novo vínculo -. Assim, no mesmo dia do anúncio da saída do clube em que o Neymar se encontrava, tivemos o Al Hilal perdendo 300 mil seguidores nas redes sociais; o Santos angariando 10 mil novos sócios, além de 200 mil seguidores nas redes; o perfil do Brasileirão realizando 2 posts sobre o atleta e sendo eles os mais curtidos; além do interesse de marcas do mundo todo quanto ao patrocínio durante essa passagem.
Ressaltemos, novamente, o papel produtivo dos torcedores, visto que os planos de sócio torcedor que foram adquiridos nas últimas horas, foram os mais caros do programa, tendo em vista a prioridade na compra de ingressos e a preocupação com a baixa capacidade do estádio do Santos, a Vila Belmiro (13 mil).
Dessa forma, resta indubitável que o Santos, caso se concretize a negociação, estará com uma verdadeira potência inestimável de geração de recursos, sendo curioso como um clube ainda associativo, mesmo com essas mudanças no mercado do futebol, explorará esses produtos mencionados.
Por fim, considero uma chance real do Brasil engatar na exploração do futebol como um produto, clubes como marcar, e torcedores como clientes, sem deixar, por óbvio, apagar o sentimento, paixão e irracionalidade de parte do público que consome essa prática, afinal de contas, isso que faz sermos o país do futebol.
A ver o desenrolar dessa história.
Diego Cohen
Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes – Centro (2024). Colaborador na Comissão de Direito Desportivo – OAB Barra/RJ. Analista Jurídico – Bradesco AUTO/RE.