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A 4ª turma do STJ decidiu que decisões proferidas no cumprimento individual de sentença em ações coletivas não possuem efeito erga omnes. O colegiado entendeu que o art. 103, III, do CDC aplica-se exclusivamente à sentença proferida na fase de conhecimento da ação coletiva, não podendo ser estendido à fase de execução individual.
O caso analisado originou-se de uma ação de cumprimento individual de sentença derivada de uma ação coletiva contra operadora de telefone. A ação coletiva garantia a restituição de ações da Telebras a consumidores participantes de um plano comunitário de telefonia. Um dos consumidores apresentou o cálculo das ações a que acreditava ter direito, sendo este cálculo contestado pela empresa.
O juízo de primeira instância acolheu a impugnação da empresa. Entretanto, o TJ/MS reformou a decisão, considerando a questão de ordem pública, dada a existência de múltiplos processos individuais, derivados da mesma ação coletiva, discutindo o mesmo tema. Visando evitar decisões conflitantes e em observância ao princípio da economia processual, o TJ/MS, de ofício, conferiu efeito erga omnes à sua decisão, fundamentando-a no art. 103, III, do CDC.
Decisão em cumprimento individual não alcança partes da sentença coletiva.(Imagem: Freepik)
O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do caso no STJ, afirmou que o dispositivo do CDC em questão restringe-se à sentença proferida na fase de conhecimento da ação coletiva. A interpretação extensiva realizada pelo TJ/MS, segundo o ministro, “restringe o direito individual conferido ao devedor e ao credor de se manifestarem acerca das obrigações e dos créditos envolvendo cada relação concreta e específica”.
O relator explicou que o cumprimento individual de sentença é a etapa em que o credor busca satisfazer seu direito individual, conforme estabelecido na sentença coletiva, que possui natureza genérica.
O ministro ponderou que questões semelhantes, discutidas simultaneamente em diversos cumprimentos de sentença, autônomos entre si, podem ser decididas de maneiras distintas, a depender das provas apresentadas e da situação específica de cada credor.
“Não se pode pretender transplantar para todos os processos individuais de execução da sentença coletiva a deliberação inicialmente proferida em um deles, sem que cada parte possa sobre ela se manifestar e ter suas objeções consideradas pelo Poder Judiciário”, afirmou o relator.
Ele destacou, ainda, que a lei define as situações em que se admite a vinculação de decisões judiciais, e o caso em questão não se enquadra em nenhuma delas.
O ministro ressaltou que, mesmo que a condenação em ação coletiva defina os direitos e obrigações, ela não possui a liquidez necessária para o cumprimento espontâneo, sendo necessária a apuração, em liquidação, dos beneficiários (cui debeatur) e da extensão da reparação (quantum debeatur). Somente nesse momento, segundo o ministro, ocorre a individualização da parcela da condenação.
“A necessidade de liquidação de sentença impõe que sejam observados o contraditório e o direito à ampla defesa, o que representa, por si só, óbice à aplicação do efeito erga omnes a decisão proferida em cumprimento de sentença envolvendo um determinado credor. A concretização do direito, com delimitação da obrigação, será efetivada em cada procedimento executório”, concluiu o ministro.
- Processo: REsp 1.762.278
Leia aqui o acórdão.