Greenwashing na interação das prerrogativas   Migalhas
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Greenwashing na interação das prerrogativas – Migalhas

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1. Introdução

A relação entre os diversos atores do sistema jurídico brasileiro deve ser pautada pelo princípio da paridade de armas e pelo respeito mútuo, conforme estabelecido pela lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e pelo Código de Ética da OAB. No entanto, observam-se casos em que estas premissas são desrespeitadas, especialmente em causas ambientais, onde o zelo pela proteção do meio ambiente pode, inadvertidamente ou não, servir de pretexto para violações procedimentais e desrespeito às garantias fundamentais.

2. Fundamentação teórica

2.1. Base legal das prerrogativas da advocacia

A fundamentação legal para a paridade entre os atores jurídicos encontra amplo respaldo no ordenamento jurídico brasileiro. O art. 6º da lei 8.906/94 estabelece expressamente a inexistência de hierarquia ou subordinação entre advogados, magistrados e membros do MP, princípio fundamental para o equilíbrio do sistema jurídico. Complementarmente, o art. 7º da mesma lei assegura o livre exercício da profissão em todo o território nacional, garantindo a autonomia profissional do advogado.

O art. 44, § 1º da lei 8.906/94 reforça esta independência ao confirmar a ausência de vínculo hierárquico da OAB com órgãos públicos. No âmbito ético-profissional, o art. 44 do Código de Ética da OAB garante ao advogado o direito de requisitar tratamento isonômico ao dispensado aos membros do MP e da magistratura, enquanto o art. 45 estabelece diretrizes para o uso de linguagem polida e termos adequados, visando evitar a configuração de calúnia e preservar a dignidade da profissão.

2.2. O conceito de greenwashing institucional

O greenwashing institucional, no contexto jurídico, manifesta-se quando órgãos públicos utilizam a proteção ambiental como justificativa para ações que, na prática, podem violar direitos e garantias fundamentais. Este fenômeno representa uma distorção da função institucional de proteção ao meio ambiente.

3. Metodologia

Este estudo utiliza metodologia qualitativa, baseada em análise documental do processo 0008526-43.2024.2.00.0000, da 13ª vara Federal de Maceió-AL. A pesquisa examina os atos processuais, documentos e procedimentos adotados pelos diferentes atores envolvidos, com foco nas possíveis violações de prerrogativas e garantias processuais.

4. Análise do caso

4.1. Contexto processual

O caso em análise envolve uma Ação Civil Pública relacionada a questões ambientais, tendo como uma cidadã de 63 anos, cozinheira, não titular do estabelecimento objeto da ação (trailer), demonstrando possível erro na identificação do polo passivo da demanda.

4.2. Irregularidades processuais identificadas

4.2.1. Violações ao devido processo legal

O processo apresenta uma série de violações significativas ao devido processo legal. Inicialmente, observa-se o proferimento de sentença sem o devido reconhecimento da defesa apresentada, comprometendo o princípio do contraditório. Soma-se a isto a não anexação de carta precatória contendo elementos essenciais de defesa, prejudicando a completude dos autos processuais. As incorreções fundamentais na identificação do objeto e localização do litígio demonstram falhas graves na instrução processual. Os procedimentos de intimação também apresentaram irregularidades, incluindo a utilização inadequada de contato telefônico de terceiro (sobrinho da ré), o que compromete a validade dos atos processuais. Adicionalmente, surgiram “possíveis” (quer dizer possibilidade, abstração, não é calúnia) questionamentos pertinentes sobre a autenticidade de assinaturas em ata de audiência, suscitando dúvidas sobre a legitimidade dos atos praticados.

4.2.2. Erros materiais graves

Na análise dos autos, identificaram-se erros materiais significativos que comprometem a própria essência da ação. A incorreção na localização geográfica do estabelecimento objeto da ação, somada às informações equivocadas fornecidas pelo Ibama quanto à localização do trailer, demonstram falhas graves na instrução processual. Mais grave ainda é a constatação da ausência de competência Federal para o caso, considerando a localização real do estabelecimento, o que põe em xeque a própria validade da ação.

4.3. Retaliação à atuação da defesa

O processo revela um preocupante padrão de retaliação à atuação da defesa. Esta situação manifesta-se através da instauração de ação penal contra o advogado por suposta calúnia, evidenciando possível uso inadequado do aparato judicial. A restrição no acesso a certidões criminais na Justiça Federal de Alagoas configura outro elemento deste padrão de retaliação. O não arbitramento de honorários em caso de evidente má-fé processual, somado às tentativas de intimidação do profissional da advocacia, compõem um quadro de cerceamento do exercício profissional.

4.4. Impactos sociais

Os impactos sociais do caso são particularmente graves considerando o perfil da ré: uma pessoa idosa de 63 anos, de baixa renda e não titular do estabelecimento objeto da ação. Esta situação é agravada pela violação das prerrogativas profissionais da advocacia, que compromete não apenas o direito de defesa da ré, mas também o próprio funcionamento do sistema de Justiça.

5. Discussão

O caso analisado revela um padrão preocupante de condutas que caracterizam o greenwashing institucional, onde a proteção ambiental serve de pretexto para ações que violam direitos fundamentais e prerrogativas profissionais. A situação é agravada pela vulnerabilidade social da ré e pela aparente tentativa de intimidação da defesa.

5.1. Consequências jurídicas

As irregularidades identificadas no processo acarretam consequências jurídicas significativas em múltiplas esferas. No âmbito civil, emerge a possibilidade de responsabilização dos agentes envolvidos pelos danos causados. Na esfera administrativa, as condutas observadas podem ensejar sanções específicas aos servidores e autoridades envolvidas. A necessidade de indenização por danos morais e materiais apresenta-se como consequência natural das violações identificadas. Por fim, o arbitramento de honorários por litigância de má-fé surge como medida necessária para recomposição da ordem jurídica violada.

6. Considerações

O estudo evidencia como o greenwashing institucional pode manifestar-se no âmbito jurídico, comprometendo princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito. O caso analisado demonstra a necessidade de maior vigilância sobre a atuação dos órgãos públicos, mesmo quando aparentemente motivada pela proteção ambiental. A situação demanda atenção dos órgãos de controle e da comunidade jurídica, pois representa não apenas violação às prerrogativas da advocacia, mas também aos direitos fundamentais de cidadãos em situação de vulnerabilidade.____________________

1 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

2 BRASIL. Lei 8.906, de 4 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a OAB. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 jul. 1994.

3 BRASIL. Lei 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 jul. 1985.

4 OAB. Código de Ética e Disciplina da OAB. Brasília: OAB, 2015.

Guilherme Fonseca Faro

Guilherme Fonseca Faro

Advogado, escritor e empreendedor. Membro dos Advogados de Direita e fundador do Movimento Nordeste Conservador. Especializado em Direito Público. Advogado do PL22 de São José da Coroa Grande – PE

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